Nizan Guanaes, direto da quarentena: Seu teste de coronavírus deu positivo
Aquilo caiu como uma bomba. Naquele dia, o Brasil tinha bem poucos casos do vírus, eu era um deles.
Eu não estava sentindo nada diferente comigo, e continuo não sentindo. Ou seja, eu sou o tipo mais perigoso. Eu só descobri porque enchi o saco para testar. Porque sou paranoico. E não ouvi um monte de conselhos: não precisa; com fé em Deus, isso não é nada; está com a cara ótima; não tem nada.
Esses conselhos são um perigo. É óbvio que é preciso privilegiar casos de risco para os testes, mas quando fiz ainda havia a possibilidade de testar assintomáticos. E ao testar e entrar na quarentena, parei de expor as pessoas a risco. É tanto ângulo para pensar...
Mas tem um que é vital e indiscutível: se você não exerce serviço essencial, não saia de casa.
Aliás, a pergunta mais ingênua é "de onde você pegou?" Impossível responder. As possibilidades já não são simples como no início. Agora o perigo está em todo lugar. Fique em casa - uma frase que é cruel também do ponto de vista econômico, e eu sou empresário. Mas temos que colocar a saúde acima de tudo.
Desde já, peço desculpas por qualquer erro que possa haver nesse texto. Não sou cientista, nem médico-ministro da Saúde.
Eu estou infectado. E podia estar debaixo da cama. Estou aqui dividindo a minha experiência com vocês.
Esses textos serão sobre milhões de reflexões que me vêm quando eu limpo a maçaneta, a pia, o vaso, quando lavo a mão 300 vezes.
Não toca no rosto, não esfrega o olho, não coça o nariz. É muito assunto na prova. Mas quando você tem um vírus, você tem que pensar no outro.
Eu odeio a expressão "tamo junto". Porque ela é muitas vezes usada para quando as pessoas querem não participar do problema do outro.
Você acha que o dalai lama fala "tamo junto"? Ele está junto.
Estamos num perrengue terrível, meu amigo ou amiga. E só sairemos dele juntos.
Estamos na quarentena. Estamos na Quaresma
Tempo de reflexão. O que fazer? Eu tenho pensado tanto que decidi dividir esse turbilhão de coisas que passa na minha cabeça nesta hora. A humanidade só muda mesmo com o medo do medo.
Dá medo ver o jornal, a TV, os sites: o cara da minha idade que morreu...
Uma coisa é ler do lado de fora. Outra é quando você está infectado. Até agora, não senti nada. Tenho amigos que têm sofrido bastante.
Quanto a Itália está sofrendo? E nas favelas, como vai ser com o vírus (porque eu sou um privilegiado em quarentena)? E por que ainda não tem tanto no continente africano?
Esse texto não tem respostas. Ele tem perguntas. Coisas que eu pergunto a mim mesmo.
Como eu peguei? Para quem eu passei? O que eu devia ter feito diferente? Será que eu escrevo os textos? Ou fico calado?
Yuval Harari, de "Sapiens", diz que a saída é a informação. Eu sou um comunicador. Comunicar é meu dom, o meu papel no mundo. E daqui, direto da minha quarentena, estou cumprindo o meu papel escrevendo aqui no UOL. Daqui, direto da minha insônia, da minha fragilidade, do meu medo, dividirei com vocês minha quarentena e minha Quaresma.
Até amanhã.
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