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Empresas oferecem drive-thru de teste de covid-19; médico recomenda cautela

Getty Images
Imagem: Getty Images

Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

24/04/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Laboratórios particulares oferecem serviço de testes rápidos e teste molecular em esquema drive-thru
  • Valores podem variar entre R$ 250 e R$ 350, de acordo com o laboratório e o tipo de teste
  • Ao UOL, infectologista diz ser necessário ter cautela no uso dos testes
  • Segundo ele, orientação médica para interpretação dos resultados é fundamental

Laboratórios particulares estão oferecendo um serviço de teste para a covid-19 em formato drive-thru, quando não é necessário descer do carro para a coleta de amostras para a testagem. Os valores podem variar de R$ 250 a R$ 350, dependendo da empresa e do tipo de teste.

Para Evaldo Stanislau, infectologista que atua no Hospital das Clínicas de São Paulo e membro da diretoria da Sociedade Paulista de Infectologia, é preciso ter cautela no uso desses testes. Em entrevista ao UOL, o médico ressaltou a importância da orientação médica para a testagem. Segundo ele, os resultados podem ser mal interpretados pela população, o que pode trazer mais problemas do que soluções.

Há dois principais tipos de teste sendo ofertados. O primeiro, chamado de RT-PCR, faz a busca de material genético do novo coronavírus nas células do paciente a partir do material coletado via swab nasal. O resultado é disponibilizado em 48 horas, e todos os laboratórios exigem pedido médico para a sua realização — são eles os laboratórios Fleury e Cura, em São Paulo, e Sabin, que disponibiliza esse serviço nas cidades de Brasília, Salvador e Manaus.

O segundo tipo, que busca a presença de anticorpos contra o vírus a partir de amostras de sangue do paciente, faz parte dos chamados testes rápidos — o resultado é disponibilizado em até uma hora. O laboratório Cura, que oferece esse tipo de exame na capital paulista, não exige pedido médico para realizá-lo.

Médico demonstra preocupação com falsos negativos e falsos positivos

Stanislau vê com preocupação a realização de exames sem pedido médico. Isso porque, segundo ele, a interpretação dos resultados não deve ser encarada como algo simples.

O infectologista explica que, muitas vezes, os testes rápidos podem apresentar resultados chamados de falsos negativos e falsos positivos, pois a confiabilidade dos kits encontrados no mercado tem variado muito.

O problema pior é o falso negativo, quando a pessoa faz o teste de anticorpo e ele vem negativo, seja porque os testes são muito ruins ou porque foram coletados no período que a gente chama de janela imunológica."
Evaldo Stanislau, membro da diretoria da Sociedade Paulista de Infectologia

Segundo ele, esse período imunológico — tempo que o organismo leva, após uma infecção, para produzir anticorpos que possam ser detectados em exames de sangue — pode ser de até 14 dias para o novo coronavírus. Ou seja, se uma pessoa infectada há menos de 14 dias fizer o teste nesse período, pode ter como resultado um falso negativo para a covid-19.

O falso negativo, diz Stanislau, também pode acontecer nos testes da metodologia RT-PCR, caso o exame seja feito antes do terceiro ou depois do sétimo dia de apresentação dos sintomas. "Se não tiver um médico orientando, a pessoa pode achar que não tem ou não teve a doença, quando na verdade é um erro de interpretação", adverte.

Ele avalia, no entanto, que desde que os laboratórios atuem de forma alinhada com a vigilância sanitária, usando critérios médicos para a realização dos testes e reportando todos os casos ao Ministério da Saúde, esses exames podem funcionar como um "reforço" à rede de diagnósticos.

"Vejo isso como uma possível solução para o problema de escassez de testes na rede pública, desde que o laboratório atue dentro dessas circunstâncias", afirma.

Laboratório diz estar ciente de limitações

O Cura, laboratório que oferece os testes rápidos em São Paulo, diz ter feito uma aquisição inicial de 2 mil testes e promete a compra de mais 10 mil.

Os exames de testes rápidos foram liberados pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) com a validação ficando a cargo dos laboratórios, devido ao momento emergencial da pandemia do novo coronavírus. Isto é: os testes não são irregulares, mas não avalia-se o desempenho de cada um deles.

Eliseu Waldman, infectologista da USP (Universidade de São Paulo), avalia que a ação da Anvisa foi positiva para que mais testes sejam disponibilizados. Ele pondera, no entanto, que os laboratórios particulares que oferecerem esses exames devem atuar com "transparência", informando aos clientes o desempenho dos testes quanto à sua especificidade (capacidade de avaliar os verdadeiros negativos) e sensibilidade (capacidade de avaliar os verdadeiros positivos).

Ao UOL, Charlles Castro, médico responsável técnico do laboratório Cura, relata que a compra foi feita de fornecedores qualificados, a maioria deles brasileiros.

"Através desses fornecedores, que são fornecedores validados e disponibilizam testes que foram aprovados pela Anvisa dentro da pandemia da covid-19, esses testes serão disponibilizados no esquema drive-thru", diz.

Castro afirma ainda que o laboratório está "ciente" das "limitações" dos testes rápidos. "Essas limitações basicamente dizem respeito ao fato de que o processo de registro da Anvisa, por conta do cenário de pandemia que vivemos, foi expeditado [acelerado]", afirma.

"Então, o processo de validação, que normalmente a Anvisa faz para cada um desses testes, não foi feito nessa fase de registro. Obviamente, todos os laboratórios precisam fazer a validação interna desse teste", acrescenta o médico.

A fim de evitar resultados falsos negativos, a orientação do laboratório, segundo Castro, é que o teste rápido seja coletado preferencialmente depois de 7 a 10 dias de apresentação dos sintomas da covid-19.

Ele afirmou ainda que os testes rápidos podem funcionar de forma complementar ao teste molecular (RT-PCR) e que podem ter maior efetividade para "inquéritos epidemiológicos", isto é, para mapear aqueles que já tiveram a covid-19. Até o momento, no entanto, não se sabe ao certo se uma pessoa que pegou a doença fica imunizada a ela.