Especialistas defendem testagem em massa, mas alertam para falso negativo
Do UOL, em São Paulo
06/05/2020 16h37
Especialistas ouvidos pela comissão externa da Câmara dos Deputados que acompanha ações de combate ao coronavírus foram unânimes em defender a testagem em massa da população. Em reunião realizada hoje por videoconferência, eles alertaram, porém, sobre a possibilidade de falso negativo dos chamados testes rápidos.
Os testes moleculares (ou RT-PCR), feitos a partir da coleta de mucosa do nariz e da garganta, possibilitam a detecção do vírus já nos primeiros dias da doença. Já os testes rápidos (ou sorológicos), feitos a partir da coleta de sangue, detectam anticorpos —ou seja, se a pessoa já teve contato com o vírus—, mas apenas cerca de dez dias após o contato.
Marco Krieger, vice-presidente de Produção e Inovação da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), informou que a capacidade de produção de testes moleculares pela fundação foi ampliada de 58 mil, em março, para 1,2 milhão de testes em abril. Para maio, a expectativa é a produção de 2,4 milhões de testes moleculares.
Porém, superada a dificuldade de ampliar a capacidade de produção —com a possibilidade de realizar 10 mil testes por dia no Brasil—, ele afirmou que há outros gargalos.
Em primeiro lugar, segundo Krieger, é preciso formular estratégia para a testagem da população, apontando grupos prioritários. Em segundo lugar, é necessário desenvolver sistemas de coleta e logística para que as amostras cheguem às centrais da Fiocruz de análise dos testes. No Rio de Janeiro, por exemplo, há cinco unidades de análise.
O processamento dessas amostras, tanto em laboratórios públicos quanto privados, também é um problema, como apontado pelo coordenador de Vigilância em Saúde da Fiocruz, Rivaldo Venâncio da Cunha. O processo, segundo ele, é muito delicado, com risco de infecção dos trabalhadores, o que exige a contratação de mão de obra especializada, além de espaço físico.
Outra questão, segundo Cunha, é a exigência legal de que a amostra venha acompanhada do CPF do paciente. Ele alertou que a maior parte da população não tem carteira de motorista com CPF, e não acessa o número quando está passando mal. "Corremos o risco de criar gargalo adicional", opinou.
Marco Krieger estima que, resolvidos todos os problemas apontados, 40 mil testes poderiam ser realizados por dia.
Testes rápidos
Wilson Shcolnik, presidente da Associação Brasileira de Medicina Diagnóstica (Abramed), destacou que cerca de 15 laboratórios privados também já realizam testes moleculares. Ele estima que de 20 a 25 mil exames estejam sendo feitos por dia nesses laboratórios.
Entretanto, Shcolnik chamou atenção para o problema do compartilhamento de informações com as secretarias de Saúde. Segundo ele, os laboratórios entraram em contato com o DataSUS para enviar dados às redes de saúde, mas o processo não está finalizado, o que deixa muitos dos dados dos laboratórios privados de fora das estatísticas oficiais.
O presidente da Abramed foi um dos que chamaram a atenção para os possíveis problemas dos testes rápidos. Os falsos negativos, apontou, podem levar pessoas a voltar a circular normalmente, podendo infectar outras.
Supervisor médico do Laboratório de Biologia Molecular da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, Alessandro Pasqualotto salientou que colher o sangue muito cedo é o problema no caso desses testes. Ele considera a coleta segura apenas depois de duas semanas,
Rivaldo Venâncio, da Fiocruz, acredita que falta uma orientação adequada sobre o melhor dia para uso do teste a partir do início dos sintomas. "A partir do 10 dia, por exemplo, a possibilidade de detecção de anticorpos será muito maior", avaliou.
O que pensam os parlamentares
Relatora da comissão externa, a deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC) ressaltou a importância de descentralização das unidades de análise dos testes e sugeriu o aproveitamento da capacidade de universidades e hemocentros para isso.
Já a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) acredita que a testagem deve ser prioritária em áreas de alta concentração demográfica, como favelas e áreas periféricas das cidades, onde, segundo ela, "oito pessoas dividem o mesmo cômodo".
Jorge Solla (PT-BA), por sua vez, alertou que os profissionais de enfermagem não estão sendo testados no Brasil e que mais trabalhadores da área já morreram no País do que na Espanha e na Itália juntas, somando 73 ao todo.
*Com Agência Câmara de Notícias