Topo

Natal seguro é possível se vacinarmos todos até outubro, diz ex-secretário

Ana Carla Bermúdez e Lais Politi

Colaboração para o UOL

15/07/2021 12h07Atualizada em 15/07/2021 12h19

Para o epidemiologista Wanderson de Oliveira, ex-secretário de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde, o Brasil pode ter um Natal "seguro" ainda este ano, incluindo a retomada da economia e dos encontros familiares, se a campanha de vacinação contra a covid-19 alcançar toda a população até o final de outubro.

"Para termos um Natal seguro, temos que cobrar do governo que vacine todas as pessoas até final de outubro. Para isso, temos que ampliar a cobertura para [a aplicação de] 11 milhões de doses por semana", disse Oliveira ao participar hoje do UOL Entrevista, conduzido pelo jornalista Diego Sarza e pelos colunistas Josias de Souza e Lúcia Helena.

Até o momento, 32.118.717 brasileiros receberam a segunda dose ou a dose única da Janssen, o equivalente a 15,17% da população nacional. O levantamento é do consórcio de veículos de imprensa, do qual o UOL faz parte, com base nos dados fornecidos pelas secretarias estaduais de saúde.

Com relação às vacinas que necessitam de duas doses, o total de vacinados com a primeira dose é de 86.332.655, o correspondente a 40,77% da população do país. Neste caso, no entanto, a aplicação de apenas uma dose da vacina não garante proteção contra o vírus.

Temos que fazer 11 milhões de doses de vacinas todas as semanas. Se nós fizermos isso, teremos capacidade de aproveitar as compras de fim de ano, os comerciantes vão poder recuperar parte das perdas que tiveram. E a gente vai poder fazer o mais importante, que é encontrar com nossos familiares e amigos e ter um Natal com muito mais confraternização.
Wanderson de Oliveira

'Não é hora de relaxar medidas'

Para Oliveira, apesar de os indicadores da pandemia no Brasil apresentarem neste momento uma leve tendência de queda, ainda não é o momento de se descartar medidas como o distanciamento, o uso de máscara e de álcool em gel.

"O que vimos agora foi uma redução porque estávamos em patamares muito elevados", afirmou o ex-secretário. Segundo ele, apesar dessa queda, o país ainda tem números muito altos. O Brasil registrou, ontem, 1.574 mortes por covid-19 em um período de 24 horas, chegando a um total de 537.498 óbitos desde o início da pandemia.

"Não estamos no momento de relaxar as medidas, não é adequado. Estamos no inverno, que é o período mais propício [para a propagação do vírus]", declarou, ponderando que, nesta época, a recrudescência do vírus pode ser "muito veloz".

Para o ex-secretário, a retomada de algumas atividades coletivas, em especial em países do hemisfério norte, pode passar à população brasileira uma falsa sensação de segurança.

"O adequado deveria ser olhar para os nossos pares. Como está a Argentina, Chile, África do Sul, Austrália, Nova Zelândia. Porque esses países estão abaixo da [linha do] Equador. É fato que uma epidemia como essa não apresenta padrões sazonais claros, mas há uma influência importante do clima e da temperatura na transmissão de doenças respiratórias, e esse vírus não foge desse padrão", disse.

Kit covid e 'conflito de interesses'

O ex-secretário e um dos principais auxiliares do Ministério da Saúde durante o comando de Luiz Henrique Mandetta também afirmou que o ministério reconheceu tardiamente a ineficácia de medicamentos do chamado "kit covid", como a cloroquina e a hidroxicloroquina, no tratamento da covid-19. O posicionamento consta de documentos enviados pela pasta à CPI da Covid.

"É inexplicável o ministério não ter tomado essa decisão antes", disse Oliveira. "A quantidade de evidências e de produção científica justificava por si a alteração dessa orientação. Eu espero que o Conselho Federal de Medicina faça a mesma alteração", afirmou o ex-secretário.

Na avaliação de Oliveira, a defesa desses medicamentos por parte de setores do governo, em especial pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e seus apoiadores, ajudou a elevar ainda mais o número de mortos pela covid-19 no Brasil.

"Elevou o número de mortos, influenciou epidemiologicamente na transmissão", disse ele. O ex-secretário afirmou ainda ser preciso levar em consideração os "conflitos de interesse de muitos que defenderam o uso dessa medida e que possivelmente incorreram em falhas graves, inclusive os médicos que prescreveram [os remédios]".

"Na resolução do CFM está muito claro que para prescrever a cloroquina deveria se descartar outras viroses", disse. Segundo ele, no entanto, "a maioria dos profissionais não fez isso".

"O ministério deveria dar mais transparência para aquilo que ele fez. Isso deveria ser publicizado, [dizer que] realmente o kit não funciona, estamos tirando todas as indicações. Isso não aconteceu, está todo mundo livre", afirmou.