Nota sobre vacina facultativa é crime contra a saúde pública, diz médica
Em entrevista ao UOL News hoje, a médica infectologista Luana Araújo criticou nota técnica em que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos se opõe ao passaporte vacinal e à obrigatoriedade da vacinação contra covid-19 para crianças.
"Essa pasta tem muito trabalho para fazer [em vez de] perder tempo com algo que não é da sua alçada. E o pior: é praticamente um crime contra a saúde pública", disse Luana. "É chocante e ultrajante ver dinheiro público sendo gasto para deixar as pessoas doentes."
A pasta comandada pela ministra Damares Alves produziu nota técnica em que se opõe à obrigatoriedade de vacinação de crianças contra a covid-19.
No documento, a pasta declara ainda que receberá denúncias de pessoas que se sentem "discriminadas" por não tomarem vacina, por meio do no Disque 100.
Esse canal é um instrumento do governo federal para recebimento de denúncias de violência contra mulheres, crianças e adolescentes, idosos, população LGBTQIA+ e outros grupos minoritários.
Na avaliação de Luana, esse tipo de medida não visa a sanar a crise saúde coletiva provocada pela pandemia.
"Tirando a parte vexatória do assunto, isso é incitante. Há um público-alvo para esse tipo de ação... Um grupo específico. A gente não fala de saúde pública quando fala nesse tipo de discussão", analisa a médica.
Damares endossa documento
A nota técnica foi concluída em 19 de janeiro. Endossado por Damares, o texto é assinado por três secretários e um diretor da pasta comandada pela ministra.
- Eduardo Freire, secretário nacional de Proteção Global substituto;
- Fernanda Monteiro, secretária nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente substituta;
- Marcelo Dias, secretário nacional da Família substituto,
- Jailton do Nascimento, diretor de Promoção e Educação em Direitos Humanos.
O que diz a nota
Segundo a nota técnica, a pasta de Damares concluiu que "medidas imperativas de vacinação como condição para acesso a direitos humanos e fundamentais podem ferir dispositivos constitucionais e diretrizes internacionais".
Além disso, na visão dos auxiliares da ministra, essas medidas podem contrariar princípios bioéticos, ferir a dignidade humana e "acabar por produzir discriminação e segregação social, inclusive em âmbito familiar".
A apresentação de uma prova de vacinação contra a covid-19 para circulação por espaços públicos e privados é uma medida sanitária adotada em diferentes países. Passou a ser usual em estabelecimentos privados e em repartições públicas no Brasil.
"O ministério entende que a exigência de apresentação de certificado de vacina pode acarretar em violação de direitos humanos e fundamentais", cita o documento.
Vacina infantil
O governo de Jair Bolsonaro (PL) se opõe à medida de passaporte vacinal, assim como apresenta resistência à vacinação de crianças de 5 a 11 anos, o que retardou a imunização infantil.
No documento, o ministério afirma que a vacina pediátrica autorizada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), apesar de fazer parte do Plano Nacional de Operacionalização da vacinação contra a covid-19, não deve ser obrigatória.
A pasta condiciona a obrigatoriedade à inclusão da ação vacinal no Programa Nacional de Imunização ou no calendário básico de vacinação da criança. Conforme a nota, pais ou responsáveis devem ter autonomia sobre a decisão de levar ou não os tutelados para serem vacinados.
O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) determina que a vacinação das crianças nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias deve ser obrigatória. A Anvisa liberou a vacinação dessa faixa etária no Brasil.
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