Comunidade LGTB do Magreb exige descriminalização da homossexualidade
Madri, 29 Jun 2017 (AFP) - A Primavera Árabe abriu uma janela para a comunidade LGTB do norte da África, mas seis anos depois continua lutando por algo tão básico quanto a descriminalização da homossexualidade, denunciaram vários ativistas em Madri, durante a WorldPride.
Na Tunísia, a frágil democracia instaurada após a revolução de 2010-2011 permitiu que a situação dos homossexuais seja debatida publicamente.
No entanto, a homossexualidade é punida com três anos de prisão, em virtude do artigo 230 do Código Penal. Paradoxalmente, este mesmo país legalizou o aborto em 1973, antes da França, por exemplo.
Marrocos e Argélia, dois países onde o poder resistiu aos embates da Primavera Árabe, também punem a homossexualidade com penas de prisão, assim como a Líbia. E na Mauritânia está prevista inclusive a pena de morte, embora esta não seja aplicada.
Em um encontro de mais de 180 ativistas realizado de segunda-feira a quarta-feira em Madri, o tunisiano Hafedh Trifi lembrou que a "prioridade" é a revogação desse artigo e do teste anal, uma prática "desumana" e "degradante", à que se recorre para comprovar que um detido teve relações homossexuais.
A comunidade LGTB propôs a revogação desse artigo durante as eleições legislativas de 2014, mas esbarrou com o "silêncio de todos os partidos", lamenta Trifi.
No partido islamita Ennahda, que conta com a maior bancada do Parlamento e faz parte do governo de coalizão, há dirigentes que "dizem que é uma doença que deve ser tratada, ou que inclusive deve-se matar, prender ou exilar os homossexuais", acrescenta Trifi.
Os obstáculos não vêm apenas do lado religioso. Em outubro de 2015, o presidente tunisiano, o laico Beji Caid Essebsi, afirmou a um canal de televisão egípcio que a revogação do artigo 230 "não acontecerá. Me recuso a fazer isso".
Na vizinha Argélia, segundo o imame Ludovic-Mohamed Zahed, nascido ali há 40 anos e abertamente homossexual, "existe a impressão de que não é possível sequer debater estes problemas".
Segundo ele, o país está nas mãos de uma "oligarquia militar-econômica", que teme a diversidade.
"Se as pessoas vivem em um clima de diversidade e de debate, (a elite) perderá o poder, e sabe disso muito bem. (...) É fácil controlar uma população uniforme", denuncia este imame instalado na França desde os anos 1990.
No Egito, a queda de Hosni Mubarak em 2011 também não se traduziu em uma maior abertura. Apesar da lei do país não castigar expressamente a homossexualidade, tanto com ele como com o atual presidente, Abdel Fatah al Sisi, são habituais as condenações a penas de prisão contra homens homossexuais por "libertinagem".
Em um painel sobre a comunidade LGTB no mundo islâmico na Universidade Autônoma de Madri, o ativista e educador social Daniel Ahmed Said advertiu, porém, contra toda visão "essencialista" da homofobia nos países muçulmanos.
Said recordou que no norte da África e no Oriente Médio, a colonização francesa e britânica a partir do século XIX se traduziu na "importação de uma moral rígida no que diz respeito à sexualidade".
Hafedh Trifi apontou, nesse sentido, que na Tunísia as leis contra a homossexualidade chegaram com o protetorado francês, instalado em 1881.
- O caso turco -Especialmente complexo é o caso da Turquia, onde o laicismo é um dos pilares da República moderna fundada em 1923.
A primeira marcha do orgulho gay em Istambul foi realizada em 2003. No entanto, desde 2015 as autoridades da cidade a proibiram, alegando motivos de segurança.
Na verdade, explica à AFP Sedef Çakmak, ativista e vereadora do distrito de Besiktas, a proibição esconde motivações políticas e religiosas.
"A Turquia é um país laico, por isso não podiam escrever abertamente que a proibição (de 2015) era pelo Ramadã. No entanto, ao telefone nos disseram que a proibição se devia ao Ramadã", o mês do jejum ritual dos muçulmanos.
Em 2014, acrescenta Çakmak, a marcha do orgulho gay de Istambul reuniu cerca de 80.000 pessoas. A partir daí, o governo "viu que o movimento LGTB era um ator político no país, e começou a vê-lo como uma ameaça".
Atualmente, a Turquia vive sob o estado de emergência instaurado após o golpe de Estado frustrado de julho de 2016 contra o governo do presidente Recep Tayyip Erdogan.
A homossexualidade não é punida. Por outro lado, "não há leis que proíbam a discriminação baseada na orientação ou na identidade sexual", aponta Çakmak, de 35 anos.
"Com isto, o que o Estado está querendo dizer é que não se preocupa nem um pouco com o que aconteça com a comunidade LGTB", conclui.
Na Tunísia, a frágil democracia instaurada após a revolução de 2010-2011 permitiu que a situação dos homossexuais seja debatida publicamente.
No entanto, a homossexualidade é punida com três anos de prisão, em virtude do artigo 230 do Código Penal. Paradoxalmente, este mesmo país legalizou o aborto em 1973, antes da França, por exemplo.
Marrocos e Argélia, dois países onde o poder resistiu aos embates da Primavera Árabe, também punem a homossexualidade com penas de prisão, assim como a Líbia. E na Mauritânia está prevista inclusive a pena de morte, embora esta não seja aplicada.
Em um encontro de mais de 180 ativistas realizado de segunda-feira a quarta-feira em Madri, o tunisiano Hafedh Trifi lembrou que a "prioridade" é a revogação desse artigo e do teste anal, uma prática "desumana" e "degradante", à que se recorre para comprovar que um detido teve relações homossexuais.
A comunidade LGTB propôs a revogação desse artigo durante as eleições legislativas de 2014, mas esbarrou com o "silêncio de todos os partidos", lamenta Trifi.
No partido islamita Ennahda, que conta com a maior bancada do Parlamento e faz parte do governo de coalizão, há dirigentes que "dizem que é uma doença que deve ser tratada, ou que inclusive deve-se matar, prender ou exilar os homossexuais", acrescenta Trifi.
Os obstáculos não vêm apenas do lado religioso. Em outubro de 2015, o presidente tunisiano, o laico Beji Caid Essebsi, afirmou a um canal de televisão egípcio que a revogação do artigo 230 "não acontecerá. Me recuso a fazer isso".
Na vizinha Argélia, segundo o imame Ludovic-Mohamed Zahed, nascido ali há 40 anos e abertamente homossexual, "existe a impressão de que não é possível sequer debater estes problemas".
Segundo ele, o país está nas mãos de uma "oligarquia militar-econômica", que teme a diversidade.
"Se as pessoas vivem em um clima de diversidade e de debate, (a elite) perderá o poder, e sabe disso muito bem. (...) É fácil controlar uma população uniforme", denuncia este imame instalado na França desde os anos 1990.
No Egito, a queda de Hosni Mubarak em 2011 também não se traduziu em uma maior abertura. Apesar da lei do país não castigar expressamente a homossexualidade, tanto com ele como com o atual presidente, Abdel Fatah al Sisi, são habituais as condenações a penas de prisão contra homens homossexuais por "libertinagem".
Em um painel sobre a comunidade LGTB no mundo islâmico na Universidade Autônoma de Madri, o ativista e educador social Daniel Ahmed Said advertiu, porém, contra toda visão "essencialista" da homofobia nos países muçulmanos.
Said recordou que no norte da África e no Oriente Médio, a colonização francesa e britânica a partir do século XIX se traduziu na "importação de uma moral rígida no que diz respeito à sexualidade".
Hafedh Trifi apontou, nesse sentido, que na Tunísia as leis contra a homossexualidade chegaram com o protetorado francês, instalado em 1881.
- O caso turco -Especialmente complexo é o caso da Turquia, onde o laicismo é um dos pilares da República moderna fundada em 1923.
A primeira marcha do orgulho gay em Istambul foi realizada em 2003. No entanto, desde 2015 as autoridades da cidade a proibiram, alegando motivos de segurança.
Na verdade, explica à AFP Sedef Çakmak, ativista e vereadora do distrito de Besiktas, a proibição esconde motivações políticas e religiosas.
"A Turquia é um país laico, por isso não podiam escrever abertamente que a proibição (de 2015) era pelo Ramadã. No entanto, ao telefone nos disseram que a proibição se devia ao Ramadã", o mês do jejum ritual dos muçulmanos.
Em 2014, acrescenta Çakmak, a marcha do orgulho gay de Istambul reuniu cerca de 80.000 pessoas. A partir daí, o governo "viu que o movimento LGTB era um ator político no país, e começou a vê-lo como uma ameaça".
Atualmente, a Turquia vive sob o estado de emergência instaurado após o golpe de Estado frustrado de julho de 2016 contra o governo do presidente Recep Tayyip Erdogan.
A homossexualidade não é punida. Por outro lado, "não há leis que proíbam a discriminação baseada na orientação ou na identidade sexual", aponta Çakmak, de 35 anos.
"Com isto, o que o Estado está querendo dizer é que não se preocupa nem um pouco com o que aconteça com a comunidade LGTB", conclui.
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