Reféns de seus traumas, refugiados da guerra na Bósnia seguem em acampamentos
Jezevac, Bosnie-Herzégovine, 22 Nov 2017 (AFP) - Em 1994 lhe atribuíram a barraca 21 no campo de deslocados de Jezevac, onde devia esperar o fim do conflito na Bósnia. Mas quase 25 anos depois, Suhra Mustafic continua vivendo ali.
Nem ela, nem seus quatro filhos voltaram ao seu povoado no leste da Bósnia. Quando começou o conflito bósnio (1992-1995), fugiram de Skelani, perto do rio Drina, que separa Bósnia e Sérvia.
Seu marido morreu alguns meses depois em Srebrenica, combatendo as forças sérvias da Bósnia de Ratko Mladic, que na quarta-feira conhecerá o veredito de seu julgamento no Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (TPIY).
Com 54 anos, doente e quase cega, Suhra é uma das 400 pessoas nesse campo "provisório", entre uma floresta de pinheiros e a escória de uma mina de carvão. O campo se tornou um bairro depauperado da periferia de Tuzla (nordeste).
A maioria de seus residentes procede da região de Srebrenica, que em julho de 1995 foi cenário do massacre de 8.000 homens e adolescentes bósnios pelas forças sérvias da Bósnia.
As barracas, de 35 m2, não foram planejadas para durar muito tempo. Suhra, com a cabeça coberta por um véu azul, levanta o tapete para mostrar o chão podre. Ao redor dela, alguns móveis velhos também se decompõem.
Mas esta camponesa nunca pensou em voltar a Skelani, 140 quilômetros a sudeste. "Nunca! Mesmo que me oferecessem uma casa de cinco andares no meu povoado, ou cinco casas. Não voltaria. Lá não há ninguém com quem eu possa dividir o meu dia a dia. Minha família foi aniquilada. As dos vizinhos também", assegura.
- "Prisioneiros de seus traumas" -Skelani se encontra na República Sérvia, a entidade dos sérvios da Bósnia, e Jezevac, na entidade croato-muçulmana. Esta divisão da Bósnia se consagrou por meio dos Acordos de Paz de Dayton que silenciaram as armas após um conflito que deixou 100.000 mortos e 2,2 milhões de deslocados.
Segundo Branka Antic Stauber, diretora da associação A Força da Mulher, em Tuzla, as mulheres, muitas vezes viúvas, não abandonaram os centros coletivos porque se veem "prisioneiras de seus traumas, já que nunca conseguiram sair do ponto morto no qual chegaram".
"A desocupação é o assassino silencioso dessa gente. O fato de que nós nos acostumamos a uma relação de dependência dando a eles durante anos o que precisavam serviu apenas para afundá-los na inatividade. Isso apagou sua necessidade de trabalhar e suas ambições", explica essa médica.
- "Refugiados de nascimento" -Hadzira Ibrahimovic vive nesses centros desde os 13 anos. Neles criou sua família. Seus três filhos, de 18, 11 e cinco anos, são "refugiados de nascimento", diz esta mulher de 38 anos, originária da região de Srebrenica, que sobrevive como pode.
"Vamos recolher a escória do carvão e revendemos. Não podemos voltar. A casa foi destruída, não resta ninguém no povoado, não há escola...".
Entre os refugiados, as viúvas recebem uma pensão mensal de 360 marcos (184 euros ou 216 dólares), com a qual também mantêm os seus parentes. "Nesses centros coletivos estão começando a nascer a terceira geração de filhos. Constatamos uma transmissão do trauma aos filhos e netos", acrescenta Branka Antic Stauber.
Psicólogos e assistentes sociais de sua associação visitam o centro duas vezes por semana. Recebe apoio da Alemanha e Holanda, mas não das autoridades nem das associações de vítimas.
"Os políticos vêm nos ver antes das eleições. As mulheres das associações de mães de Srebrenica nunca vieram!", diz com desolação Suhra Mustafic.
Nos 156 centros coletivos que existem por todo o país vivem quase 9.000 bósnios. A ministra de Refugiados, Semiha Borovac, recentemente fixou como objetivo fechá-los "antes de 2020". Mas isso implica a construção de casas sociais.
Nem ela, nem seus quatro filhos voltaram ao seu povoado no leste da Bósnia. Quando começou o conflito bósnio (1992-1995), fugiram de Skelani, perto do rio Drina, que separa Bósnia e Sérvia.
Seu marido morreu alguns meses depois em Srebrenica, combatendo as forças sérvias da Bósnia de Ratko Mladic, que na quarta-feira conhecerá o veredito de seu julgamento no Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (TPIY).
Com 54 anos, doente e quase cega, Suhra é uma das 400 pessoas nesse campo "provisório", entre uma floresta de pinheiros e a escória de uma mina de carvão. O campo se tornou um bairro depauperado da periferia de Tuzla (nordeste).
A maioria de seus residentes procede da região de Srebrenica, que em julho de 1995 foi cenário do massacre de 8.000 homens e adolescentes bósnios pelas forças sérvias da Bósnia.
As barracas, de 35 m2, não foram planejadas para durar muito tempo. Suhra, com a cabeça coberta por um véu azul, levanta o tapete para mostrar o chão podre. Ao redor dela, alguns móveis velhos também se decompõem.
Mas esta camponesa nunca pensou em voltar a Skelani, 140 quilômetros a sudeste. "Nunca! Mesmo que me oferecessem uma casa de cinco andares no meu povoado, ou cinco casas. Não voltaria. Lá não há ninguém com quem eu possa dividir o meu dia a dia. Minha família foi aniquilada. As dos vizinhos também", assegura.
- "Prisioneiros de seus traumas" -Skelani se encontra na República Sérvia, a entidade dos sérvios da Bósnia, e Jezevac, na entidade croato-muçulmana. Esta divisão da Bósnia se consagrou por meio dos Acordos de Paz de Dayton que silenciaram as armas após um conflito que deixou 100.000 mortos e 2,2 milhões de deslocados.
Segundo Branka Antic Stauber, diretora da associação A Força da Mulher, em Tuzla, as mulheres, muitas vezes viúvas, não abandonaram os centros coletivos porque se veem "prisioneiras de seus traumas, já que nunca conseguiram sair do ponto morto no qual chegaram".
"A desocupação é o assassino silencioso dessa gente. O fato de que nós nos acostumamos a uma relação de dependência dando a eles durante anos o que precisavam serviu apenas para afundá-los na inatividade. Isso apagou sua necessidade de trabalhar e suas ambições", explica essa médica.
- "Refugiados de nascimento" -Hadzira Ibrahimovic vive nesses centros desde os 13 anos. Neles criou sua família. Seus três filhos, de 18, 11 e cinco anos, são "refugiados de nascimento", diz esta mulher de 38 anos, originária da região de Srebrenica, que sobrevive como pode.
"Vamos recolher a escória do carvão e revendemos. Não podemos voltar. A casa foi destruída, não resta ninguém no povoado, não há escola...".
Entre os refugiados, as viúvas recebem uma pensão mensal de 360 marcos (184 euros ou 216 dólares), com a qual também mantêm os seus parentes. "Nesses centros coletivos estão começando a nascer a terceira geração de filhos. Constatamos uma transmissão do trauma aos filhos e netos", acrescenta Branka Antic Stauber.
Psicólogos e assistentes sociais de sua associação visitam o centro duas vezes por semana. Recebe apoio da Alemanha e Holanda, mas não das autoridades nem das associações de vítimas.
"Os políticos vêm nos ver antes das eleições. As mulheres das associações de mães de Srebrenica nunca vieram!", diz com desolação Suhra Mustafic.
Nos 156 centros coletivos que existem por todo o país vivem quase 9.000 bósnios. A ministra de Refugiados, Semiha Borovac, recentemente fixou como objetivo fechá-los "antes de 2020". Mas isso implica a construção de casas sociais.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.