Audiência pública na Câmara sobre vaquejadas tem tumulto e bate-boca
Uma audiência pública na Câmara dos Deputados para discutir uma proposta de regulamentação da vaquejada no País foi marcada por tumulto e briga entre os defensores da prática difundida no Nordeste e os defensores da causa animal. Enquanto vaqueiros faziam protesto na Esplanada dos Ministérios - com direito a cavalos espalhados no gramado central - deputados batiam boca nesta tarde na reunião conjunta das comissões de Esporte e Meio Ambiente.
Um dos embates envolveu os deputados Ricardo Tripoli (PSDB-SP) e Vitor Valim (PMDB-CE). Durante sua participação na audiência, o tucano disse que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que tornou inconstitucional a lei cearense que regulamentava a vaquejada naquele Estado não podia ser contestada e sim cumprida. Tripoli destacou que a medida foi necessária "para que não se chegue no rodeio", por isso era bom "que se pare por aqui". "Vamos parar por aqui para não chegar no rodeio. É para defender o rodeio, é isso? Seja homem, rapaz", interrompeu o peemedebista.
Enfurecido, Tripoli - conhecido por defender a bandeira da proteção animal - deixou a mesa de trabalhos e foi em direção a Valim tomar satisfação. "Seja homem", provocava Valim, que é defensor da vaquejada. "Eu dou na sua cara, seu moleque. É um babaca, um moleque", retrucou Tripoli fora do microfone. A sessão foi suspensa para que os ânimos fossem acalmados.
Outro momento de tumulto aconteceu quando a atriz Alexia Dechamps, convidada do deputado Ricardo Izar (PP-SP), se virou para os participantes e mandou que se calassem. Segundo relatos, a atriz disse que ela financiava o pagamento do programa Bolsa Família para os nordestinos.
"A convidada se virou para os vaqueiros que ali estavam e disse para que eles calassem a boca porque ela pagava o Bolsa Família do nordestino. Esse ato de preconceito não é apenas contra os vaqueiros, mas contra nós da bancada do Nordeste", reclamou no plenário o deputado Domingos Neto (PSD-CE), que pediu à Procuradoria da Câmara que tome providências contra a atriz.
Outro deputado a se indignar com a convidada foi Pedro Vilela (PSDB-AL), que chamou a postura de Alexia de "repulsiva" e "inaceitável". Para o tucano, a atriz cometeu crime de racismo. "Nenhum brasileiro pode ser vítima de preconceito", disse no plenário.
PEC
Apesar da decisão do STF contra a prática por considerar que há maus-tratos de animais, tramita na Câmara uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que trata de rodeios e vaquejadas como expressão artística e classifica as atividades como patrimônio cultural e imaterial brasileiro. Mais cedo, o presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), participou da audiência e informou que, assim que a PEC passar pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), vai autorizar a criação de uma comissão especial para apreciar a proposta.
O presidente da Câmara anunciou que vai pedir para a presidente do STF, ministra Carmen Lúcia, avaliar a possibilidade de um acordo que viabilize as vaquejadas. Maia defendeu que é preciso dar clareza de que não existe maus-tratos contra animais e que se produza um marco regulatório para a prática. "A gente não pode olhar uma atividade com 700 mil empregos e achar que isso (fim das vaquejadas) não vai gerar impacto na vida da família brasileira", argumentou.
Nesta quarta-feira (26), a atriz enviou comunicado à imprensa sobre a atitude do deputado. Veja a íntegra:
"Eu, Alexia Dechamps, repudio a atitude do deputado Pedro Vilela, do PSDB alagoano, de atribuir a mim palavras desrespeitosas contra o povo nordestino durante audiência pública sobre a regulamentação da vaquejada. Mais do que isso, abomino sua postura oportunista de aproveitar-se de um falso embate com uma pessoa pública, atriz profissional, para conseguir mídia fácil e destacar-se diante de seu eleitorado. O parlamentar, além de deturpar minhas palavras, me ofendeu, tentou humilhar e constranger, chegando a dirigir-se ao plenário da Câmara pedir que a
Procuradoria da Casa me processe. Não sabe o Sr. Deputado que não me curvo a ameaças, que o tempo de mulheres indefesas e submissas é passado e que antes que siga com sua infâmia eu o estarei chamando a prestar contas de suas palavras perante os tribunais.
No intenso debate que acontecia entre os que defendiam a vaquejada como atividade econômica, geradora de empregos, e os que, como eu, afirmávamos que nenhum trabalho pode se basear em maus tratos a animais indefesos, defendi que o correto seria buscar alternativas econômicas para os vaqueiros que vivem da vaquejada. Se é uma cultura regional, que se mude a cultura, da mesma forma que se deve abandonar a prática das touradas na Espanha. Nada, absolutamente nada, justifica a violência contra animais ou seres humanos.
Disse ainda que no Nordeste, de onde provinha a maior parte dos vaqueiros lá presentes, existem outras atividades como pesca, turismo e lavoura, além do Bolsa Família, que poderia amparar os mais necessitados. Lembrei que a região é que mais tem inscritos no programa do governo federal. Se o auxílio existe, sustentado pelos impostos que eu e todos os brasileiros pagamos, para socorrer pessoas sem renda suficiente, deve ser utilizado para casos extremos como o que discutíamos.
A deturpação dos meus argumentos, como se vê, é vil. Espero que a exposição do caso sirva para desmascarar este tipo de ardil, mostrando aos eleitores do parlamentar quem ele realmente é, em lugar da imagem que gostaria de ver estampada nos jornais. A verdade costuma ser severa com quem manipula fatos e agride semelhantes para conquistar objetivos mesquinhos.
Vim para Brasília para defender a Constituição do meu país, defender a interpretação do Supremo Tribunal Federal contra as vaquejadas e as minhas convicções. É disso que eu vivo. É isso que sou."
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