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Cientistas brasileiros e chineses descobrem 215 ovos de pterossauros na China

Fábio de Castro

30/11/2017 17h25

Cientistas brasileiros e chineses anunciaram nesta quinta-feira, 30, a descoberta de 215 ovos fossilizados de pterossauros - répteis voadores pré-históricos que eram parentes dos dinossauros -, com cerca de 120 milhões de anos, no noroeste da China.

A descoberta, de valor incalculável para a ciência, permitirá que os pesquisadores estudem como esses animais viviam, como se reproduziam e - o mais importante - como evoluiu seu voo. Os pterossauros foram os primeiros vertebrados a desenvolver a capacidade de voar.

O estudo que descreve a rara descoberta acaba de ser publicado na revista Science. Segundo os autores, até agora haviam sido descobertos apenas oito ovos de pterossauros, cinco na China e três na Argentina. Desta vez, porém, com uma coleção de mais de 200 ovos preservados tridimensionalmente - isto é, que não foram esmagados -, foi possível identificar 16 deles com embriões em diferentes estágios de desenvolvimento.

De acordo com um dos autores do artigo, Alexander Kellner, do Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a descoberta dos ovos com embriões dará um impulso sem precedentes no conhecimento sobre os pterossauros.

"Pela primeira vez temos embriões em três dimensões. Jamais se imaginou que isso seria possível, porque esses ovos são extremamente frágeis. Eles são flexíveis e têm uma caixa externa de carbonato de cálcio extremamente fina e, por isso, é muito difícil que se mantenham preservados por 120 milhões de anos. Quando vi o material pela primeira vez, em 2015, mal podia acreditar", disse Kellner à reportagem.

Os ovos de pterossauros encontrados em 2015 são da espécie Hamipterus tianshanensis, que havia sido descoberta em 2011 pela mesma equipe, liderada por Kellner e por Xiaolin Wang, da Academia Chinesa de Ciências. A nova descoberta também foi feita no mesmo local da primeira, perto da cidade de Hami, na província chinesa de Xingjiang.

Outra autora do estudo, Taissa Rodrigues, do Laboratório de Paleontologia da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), o local é um paredão rochoso, onde ossos e ovos se acumulam em diversas camadas. O trabalho é meticuloso: é preciso escavar a rocha com um cuidado extremo para não danificar o material.

"Quando encontramos essa espécie pela primeira vez, vimos que os ossos estavam presentes em grande quantidade - e havia cinco ovos. A equipe chinesa continuou realizando escavações até fazer essa nova descoberta vultuosa. Os novos ovos estão no mesmo estado de preservação, mas, com são mais de 200, isso aumentou a nossa chance de encontrar embriões - e foi o que aconteceu", disse Taissa.

Segundo Taissa, quando os frágeis ovos são encontrados esmagados, os embriões não fornecem tanta informação. Mas, quando eles estão em três dimensões, é possível tirar inúmeras conclusões. Uma saliência que aparece em um osso, por exemplo, é rapidamente identificada como o local onde ficavam os músculos e tendões que controlavam as asas - com isso, os cientistas conseguem reproduzir detalhes precisos da anatomia do animal e de seus movimentos e hábitos.

"É incrível ter encontrado esse bloco com tantos ovos e embriões. Ovos de dinossauros são comuns, porque têm uma casca dura como os ovos de galinha. Mas os dos pterossauros são moles e, por isso, quebram facilmente e apodrecem. Além disso os ossos dos embriões são muito finos", afirmou Taissa.

"A ossificação dos embriões ainda é fraca e esses ossos se quebram com muita facilidade. Acreditamos que essa coleção de ovos possui mais embriões, mas decidimos não abrir todos eles, já que é possível que no futuro sejam desenvolvidas técnicas melhores para estudar o interior dos ovos sem precisar quebrá-los", disse Kellner.

Segundo Kellner, só condições muito específicas do ambiente podem explicar a preservação dos frágeis ovos. As características da rocha, segundo ele, mostram que a região era submetida a fortes torrentes de água.

"A rocha onde os encontramos não foi o lugar original onde as fêmeas fizeram seus ninhos. Aquilo foi transportado. Nossa hipótese é que há 120 milhões de anos havia tempestades constantes de grande porte naquela região. Em algum momento, um fluxo torrencial levou os ovos e alguns ossos poara esse local, onde eles foram soterrados muito rapidamente - caso contrário, os ovos não teriam sido preservados", explicou.

Como os ovos foram encontrados juntos em tamanha quantidade, Kellner afirma que os pterossauros certamente formavam colônias para reproduzir - e possivelmente também para acasalar. "Para encontrarmos esse material, foi preciso ocorrer uma tempestade perfeita, com muita água e enchentes, exatamente na área de reprodução dos pterossauros."

De acordo com Kellner, a abundância do material encontrado continuará gerando conhecimento sobre os pterossauros por vários anos. Mas os estudos preliminares já produziram avanços no conhecimento, mostrando, por exemplo, que provavelmente os pterossauros recém-nascidos exigiam 'cuidados parentais', como acontece com as aves.

"Conseguimos constatar em alguns dos embriões uma ossificação diferenciada de ossos associados às asas e aos membros posteriores. O úmero, que é o principal osso do braço envolvido com a atividade de voo, não estava ainda tão bem formado como as pernas", explicou Kellner.

Isso indicaria que, ao nascer, os pterossauros ainda não eram capazes de voar - e por isso precisavam da ajuda dos adultos, como acontece com as aves, e diferentemente do que ocorre com animais como crocodilos e tartarugas. "É muito provável essa seja a primeira evidência direta de uma necessidade biológica de cuidados parentais", disse o cientista.