STJ nega habeas corpus e Raul Schmidt pode ser extraditado
A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por maioria, rejeitou o habeas corpus solicitado pela defesa do empresário Raul Schmidt para barrar sua extradição para o Brasil. Cabe agora à Interpol localizar o empresário em Portugal para que o país o disponibilize às autoridades brasileiras para a extradição. Apenas o ministro Napoleão Nunes Maia votou pela concessão do habeas corpus ao empresário.
Alvo da primeira fase internacional da Operação Lava Jato, Schmidt é investigado pelo pagamento de propinas de mais de US$ 200 milhões em "serviços" - entre eles, facilitação de desvios de recursos da Petrobras em diferentes diretorias - aos ex-diretores da estatal Renato de Souza Duque, Nestor Cerveró e Jorge Luiz Zelada. Os três estão envolvidos no esquema de corrupção, lavagem de dinheiro e organização criminosa instalado na Petrobras entre 2004 e 2014.
Ao discursar na tribuna, a ministra Grace Mendonça, da Advocacia-Geral da União (AGU), defendeu que Schmidt "retorne ao Estado brasileiro e preste contas dos atos irregulares e ilegais que foram praticados no ambiente brasileiro".
O advogado do empresário, Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, considerou o caso uma discussão jurídica "importantíssima" porque pode abrir precedente futuramente. "O que tem a defesa a dizer é que esse caso é de extrema importância por abrir um precedente: de abrir as portas para pedir a extradição de um português nato."
"Ele saiu do Brasil em 2010. Ou seja, antes da deflagração da Lava Jato. Há um costume no Brasil de tudo ser Operação Lava Jato. Ele não é foragido e nem pode ser", arguiu Kakay.
Na avaliação de Grace, compete ao Estado português revisar o ato originário que desencadeou o processo de extradição de Schmidt diante do novo fato (a condição de português nato), não o Ministério da Justiça, como pede a defesa.
Terminada a sessão, Grace celebrou a decisão do STJ. "Foi bastante importante, porque é assunto que toca diretamente atuação que a República Federativa do Brasil vem fazendo diante do Estado português."
Ao ser questionada pela reportagem, a ministra negou que o caso possa eventualmente abrir precedentes, como alertou a defesa de Schmidt. "As circunstâncias desse caso são bastante peculiares. Não há risco de precedente, à medida que não tem repercussão generalizada."
Apesar de ainda não ter sido localizado pela Interpol, não há uma declaração formal de que Schmidt está foragido. "A Interpol está trabalhando para localizá-lo e disponibilizá-lo ao Estado brasileiro." De acordo com Grace, a estratégia de locomoção de Schmidt dentro do país ficará a cargo da Polícia Federal.
"A partir de agora (com a decisão do STJ), temos autorização do Estado português para trazê-lo de volta. Já apresentamos petição neste sentido. Estamos aguardando o Estado português disponibilizá-lo para entrega. A partir do momento que ele estiver apto a ser entregue para o Estado brasileiro, toda a estrutura já está organizada e ordenada para trazê-lo."
Defesa
O advogado de Schmidt afirmou que vai recorrer no Supremo Tribunal Federal. "O STJ não fez o enfrentamento do que era o pedido do habeas corpus. O habeas corpus era para dizer que o ministro da Justiça teria que dizer para Portugal que não pode mais oferecer a reciprocidade. Eles se prenderam no fato de que se ele é português nato, quem tem que decidir isso é Portugal. E isso é mais ou menos óbvio."
No entanto, Kakay acredita que o Supremo Tribunal de Justiça português possa decidir amanhã a respeito de um pedido da defesa, que alega que passado o prazo que determinou a soltura de Schmidt, seja deferido o arquivamento da extradição.
O caso
Schmidt estava foragido desde 2015, quando foi para Portugal, pelo benefício da dupla nacionalidade. Detido em março de 2016, ele fez acordo com o Judiciário português para responder o processo de extradição em liberdade. Foi preso em 13 de abril, quando a Justiça de Portugal rejeitou seus últimos recursos e determinou sua extradição para o Brasil.
Na última sexta-feira, o Tribunal de Relação de Lisboa determinou o cumprimento da ordem de extradição do empresário. O empresário reside atualmente em Portugal, e o pedido de extradição foi solicitado pelo juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, no âmbito da Lava Jato.
No final de abril, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Sérgio Kukina decidiu que a Primeira Seção da Corte é competente para julgar o pedido de habeas corpus de Raul Schmidt para barrar extradição para o Brasil.
A decisão de Kukina suspendeu a eficácia de decisões do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), que havia concedido liminar para suspender o processo de extradição do empresário, e de Moro, que entendeu que o TRF-1 não tinha jurisdição sobre as questões relativas à extradição.
Conflito de competência
Inicialmente, o juiz convocado pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região Leão Aparecido Alves concedeu liminar para suspender a extradição do alvo da Lava Jato. Ele entendeu que, por ser "português nato", como argumentou a defesa, Schmidt não poderia ser enviado ao Brasil porque não há reciprocidade entre os dois países no caso de extradição de cidadãos natos.
A decisão atropelou entendimento do próprio STJ sobre o caso, que já havia enfrentado os mesmos argumentos dos defensores e negado liminar ao operador. Mais tarde, o juiz federal Sérgio Moro proferiu decisão mantendo a extradição de Schmidt. No despacho ele criticou a decisão de Leão.
Um dia depois, o desembargador Ney Bello, presidente da 3ª Câmara do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, afirmou, por meio de nota, que a decisão de Moro "atenta contra o judiciário". O TRF-1 suscitou conflito de competência ao STJ e pediu para ser reconhecido como a Corte competente para julgar o habeas de Schmidt.
O ministro Sérgio Kukina é o relator do habeas corpus, que foi negado liminarmente pela Corte em 30 de janeiro deste ano. Em janeiro, o vice-presidente do STJ, ministro Humberto Martins, no exercício da presidência e em decisão liminar, havia negado a suspensão do processo de extradição apresentado pela defesa do empresário por meio de habeas corpus. Em fevereiro, o próprio ministro Sérgio Kukina negou pedido de reconsideração da decisão liminar do vice-presidente.
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