Proposta permite que parlamentar ocupe embaixada sem deixar mandato
Estão em jogo as chefias de 133 embaixadas espalhadas por todos os continentes, além de 12 missões e delegações permanentes perante organismos internacionais. A mais recente delas foi criada oficialmente anteontem pelo presidente Jair Bolsonaro, em Manama, no Bahrein. A abertura do posto faz parte de uma mudança na política externa, após anos de contração do serviço exterior, como mostrou o Estadão, e pode impulsionar negócios agrícolas e a venda de armamentos no Oriente Médio.
Em situações excepcionais, qualquer cidadão brasileiro nato, maior de 35 anos, com reputação de bons serviços prestados ao País, pode servir como embaixador, se escolhido pelo presidente e aprovado em votação no Senado. No caso dos parlamentares federais, eles devem, obrigatoriamente, renunciar ao cargo para o qual foram eleitos antes da posse. A exigência, prevista em diferentes Constituições, existe desde 1937 e nunca foi derrubada.
Na prática, a vedação implicou maior profissionalização das embaixadas e do corpo diplomático. Dos atuais embaixadores brasileiros, só um vem de fora da carreira, o general da reserva Gerson Menandro, do Exército, indicado por Bolsonaro para ocupar o posto em Tel-Aviv, Israel, no ano passado. O presidente também chegou a escolher como embaixador na África do Sul o ex-prefeito do Rio Marcelo Crivella, bispo da Igreja Universal, mas ele não recebeu o aval do governo, o chamado agreement.
Protocolada nesta quinta-feira, a PEC é de autoria do senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Comissão de Constituição e Justiça. Antes aliado do Palácio do Planalto, o ex-presidente do Senado virou um obstáculo aos interesses de Bolsonaro. É ele que tem segurado a sabatina de André Mendonça, ex-advogado-geral da União e ex-ministro da Justiça indicado pelo presidente para o Supremo Tribunal Federal.
'AFRONTA'
A proposta de Alcolumbre representa mais uma ação corporativista. Ao justificar a mudança, porém, o senador disse que a restrição para ocupar embaixadas consiste em "discriminação odiosa aos parlamentares". Ponderou que nem para o cargo de ministro das Relações Exteriores, o superior hierárquico dos embaixadores, há tal exigência. "É uma afronta ao bom senso e à razoabilidade que o parlamentar federal possa ocupar o cargo de ministro das Relações Exteriores, sem perder seu mandato, e não possa ocupar o cargo de chefe de missão diplomática de caráter permanente", afirmou Alcolumbre.
O senador não explicou, no entanto, o motivo de ressuscitar o debate agora. A PEC precisa ser aprovada em comissões, uma delas a CCJ, e em duas votações de plenário, no Senado (49 votos) e na Câmara dos Deputados (308 votos).
No Congresso, pelo menos cinco senadores são afeitos à política externa e ao menos três já circularam como possíveis indicados à chancelaria: Nelsinho Trad (PSD-MS), Antônio Anastasia (PSD-MG) e Fernando Collor (PROS-AL).
Se fosse aprovada, a PEC poderia beneficiar, por exemplo, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente. Em 2019, Bolsonaro manifestou a intenção de indicá-lo como embaixador em Washington (EUA). Diante da resistência ao nome do deputado, o Planalto nunca formalizou a indicação.
Caso Eduardo passasse agora pelo crivo do Senado, não precisaria renunciar ao mandato e poderia apenas se licenciar, mantendo as prerrogativas do cargo. O Estadão questionou o Itamaraty sobre a proposta, mas não houve resposta.
Presidente da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, a senadora Katia Abreu (PP-TO) disse que não se opõe à PEC, mas fez ressalvas. "Tem que haver limites de vagas e do período de servir numa embaixada", afirmou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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