Dois meses depois de desabamento no Rio, inquérito segue sem previsão de encerramento
Dois meses após o desabamento de três prédios no centro do Rio, ainda não há previsão para fim do inquérito policial que apura as causas do acidente. As vítimas estão perdendo a esperança de recuperar bens perdidos, mas conquistaram seus primeiros benefícios junto ao poder público.
Desabamento de prédios completa dois meses
De acordo com a Associação das Vítimas da Avenida Treze de Maio, o prefeito Eduardo Paes baixou, neste mês, um decreto concedendo suspensão dos tributos municipais para os atingidos pelo episódio durante seis meses (35.228, de 12 de março).
Além disso, as vítimas deverão ter acesso a empréstimos com condições especiais, com repasse de recursos do BNDES, de acordo com o presidente da associação criada para dar suporte a elas, o advogado Otávio Blatter.
Segundo Blatter, o empréstimo foi negociado com a Secretaria estadual de Finanças, atendendo a pedido da prefeitura, que intercedeu após uma audiência do grupo com Eduardo Paes em fevereiro. Os detalhes ainda estão sendo fechados, mas a associação enviou nesta semana à secretaria a lista de empresas interessadas.
"Ao que tudo indica, o empréstimo será a longo prazo e a juros extremamente baixos para possibilitar a recuperação das empresas", afirma o advogado, do escritório Blatter e Galvão, que ficava no 13º andar do prédio mais alto que desabou.
Recomeço 'precário'
Na noite de 25 de janeiro, três prédios desmoronaram na Avenida Treze de Maio, na Cinelândia, centro do Rio, logo atrás do Teatro Municipal - os destroços atingiram também a bilheteria do teatro.
Os desabamentos mataram 22 pessoas, das quais cinco continuam desaparecidas. Dezessete corpos foram identificados, mas exames de DNA feitos com restos mortais encontrados nos escombros ainda não identificaram os demais.
Nos três prédios funcionavam empresas, escritórios, cursos, consultórios, lojas. As empresas perderam documentos, arquivos, equipamentos e toda a estrutura que tinham, afirma a advogada Simone Argolo Andres, diretora institucional da associação,
"As empresas estão tentando se reerguer. Perdemos todo nosso equipamento de trabalho de forma inesperada e brutal. Todo mundo está procurando um cantinho para se instalar. O recomeço está sendo precário para a grande maioria", afirma.
Material perdido depositado a céu aberto está se deteriorando
Simone Andres afirma que o recomeço das empresas afetadas é precário
Ela diz que a linha de crédito que está sendo negociada será importante para que as empresas possam seguir com suas atividades sem demitir funcionários. A situação se torna mais difícil porque nenhum seguro vai dar cobertura ao evento, ressalta.
Material perdido
Após os desabamentos, os escombros foram levados para uma área da companhia de lixo do Rio, a Comlurb, na rodovia Rio-Petrópolis. Uma empresa foi contratada para fazer o trabalho de triagem dos detritos.
De acordo com a prefeitura, no processo já foram encontrados documentos, cartões de crédito, fotografias, pen drives, discos de memória, objetos de escritório e outros bens pessoais. O material está sendo catalogado para que as pessoas tenham acesso ele após o processo.
Simone afirma que as vítimas não têm muita esperança de recuperar documentos e equipamentos importantes. Ela lamenta que o trabalho não tenha sido conduzido de forma diferente nas primeiras semanas após o desabamento, com uma triagem inicial antes de remover o material.
"Se o trabalho tivesse sido feito de outra forma, nós teríamos recuperado bastante coisa. Mas os escombros já foram muito mexidos, e estão a céu aberto, sob sol, sob chuva. Cada dia que passa fica mais distante a possibilidade de a gente resgatar alguma coisa inteira", diz ela.
Muitos dos documentos encontrados estão apagados, afirma, e muitos objetos de valor ainda não foram achados. "O cofre do nosso escritório não apareceu, assim como vários outros cofres, e bolsas têm sido encontradas abertas, sem nenhum objeto dentro."
Investigações
Logo antes de o episódio completar dois meses, na semana passada, o inquérito policial que apura suas causas foi transferido da Polícia Civil para a Polícia Federal.
Como o desabamento danificou também um patrimônio de competência federal - o Teatro Municipal, tombado pelo Iphan - cabe à PF apurar as causas, explica o delegado Fábio Scliar, da Delegacia de Meio Ambiente e Patrimônio Histórico da PF.
Nesta semana, Scliar recebeu os dois volumes com cerca de 500 páginas com a apuração que havia sido feita até agora pelo delegado Alcides Alves Pereira, da 5ª Delegacia de Polícia.
Pereira havia ouvido mais de 60 testemunhas, entre pessoas que trabalhavam no prédio, que prestavam serviço no local, que trabalhavam nas obras em andamento, que viram o desabamento ou parentes de vítimas fatais.
Nos próximos dias, afirma Scliar, será possível fazer uma estimativa de quanto tempo levará para concluir o processo.
Causas e danos
A principal suspeita levantada após os desabamentos é de que o Edifício Liberdade - o mais alto dos três e primeiro a cair - tinha problemas estruturais, e que estes poderiam ter sido causados por obras que estavam sendo realizadas no edifício.
"Mas não sabemos se as obras que estavam sendo realizadas no 9º andar (do Edifício Liberdade) foram decisivas para isso ou se foram mais um dos fatores dentre outros que em 40 anos podem ter contribuído para o desmoronamento do prédio", afirma Scliar. "Esta é uma questão fundamental deste inquérito", afirma.
O Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-RJ) também tem um grupo de trabalho com especialistas trabalhando no assunto.
De acordo com o presidente da entidade, Agostinho Guerreiro, as obras que estavam sendo realizadas no Edifício Liberdade continuam sendo a principal hipótese para explicar o acidente.
"O indicador maior são as obras atuais (que vinham sendo realizadas no edifício), mas não podemos descartar obras anteriores. É preciso entender se o desabamento aconteceu a partir das obras recente, ou se elas podem ter sido um gatilho final diante de fragilidades acumuladas ao longo do tempo na estrutura", diz.
De acordo com o advogado Otávio Blatter, as empresas e pessoas prejudicadas aguardam os resultados dos inquéritos para propor ações cíveis por danos materiais e morais.
"Todos os que tiveram prejuízo vão propor uma ação cível. Pretendemos mover uma ação coletiva pela associação. Estamos aguardando a apuração dos fatos", afirma.
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