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Ataques homofóbicos expõem divisão sobre casamento gay na França

23/04/2013 06h14

As denúncias de agressões homofóbicas estão aumentando na França, segundo associações de direitos humanos, em razão dos protestos contra o projeto de lei que garante aos homossexuais o direito de se casar e adotar crianças - que deve ser aprovado definitivamente pelo Parlamento nesta terça-feira.

O projeto de lei do "casamento para todos", como é chamado o texto, foi aprovado em última leitura pelos deputados nesta terça-feira - com o placar de 331 a 225 na votação. Com o resultado, a França se tornou o 14º país a aprovar uma legislação favorável ao casamento gay.

Em razão de agressões recentes contra homossexuais, a secretaria de Segurança Pública de Paris anunciou na segunda-feira o reforço policial em bairros da capital que concentram bares gays.

Segundo a SOS Homofobia, entre janeiro e março deste ano, o número de telefonemas de homossexuais que relatam ser vítimas de insultos ou agressões triplicou em relação ao mesmo período do ano passado na França.

A associação recebeu 1,2 mil ligações apenas nos três primeiros meses deste ano, quase o número total ocorrido em 2011, de 1,5 mil queixas registradas pela associação.

"Isso é consequência do clima atual, decorrente das discussões sobre o casamento gay, que encoraja as vítimas a denunciarem as agressões", afirma Elisabeth Ronzier, presidente de SOS Homofobia.

'Discurso homofóbico'

Nos últimos dias, várias agressões homofóbicas tiveram grande destaque na imprensa francesa.

Dois bares gays, um em Lille, no norte da França, e outro em Bordeaux, no sudoeste, foram atacados por grupos suspeitos de ligação com a extrema direita. Eles destruíram móveis e vitrines dos locais e agrediram clientes e funcionários.

Um casal homossexual foi agredido na madrugada do último sábado ao sair de uma discoteca em Nice, no sul do país.

Recentemente, dois casais gays também foram violentamente espancados na rua em Paris. Uma das vítimas, o holandês Wilfred de Bruijn, publicou nas redes sociais a foto de seu rosto coberto de hematomas e sangue.

Nesta terça-feira, antes da votação do projeto na Assembleia Nacional, o Parlamento francês também se tornou cenário de protestos. O presidente da assembleia ordenou que manifestantes fossem expulsos do local por tumultuar o debate sobre a nova lei.

Apesar das manifestações contrárias, o projeto aprovado nesta terça conta com o apoio da maior parte da população francesa. Os partidos de oposição dizem que vão recorrer contra a lei ao Conselho Constitucional, órgão de mais alta instância para julgar questionamentos legais na França.

'Igualdade'

O ministro do Interior, Manuel Valls, declarou na segunda-feira que os opositores ao casamento gay "liberaram o discurso homofóbico na França".

Valls admite ser "incontestável" que os opositores ao casamento gay "são numerosos" na França.

"A lei vai permitir que pessoas do mesmo sexo que se amam tenham os mesmos direitos das demais. É uma questão de igualdade entre cidadãos", disse à BBC Brasil Guillaume Bonnet, porta-voz da associação All Out em Paris.

"A lei representa um elemento essencial na luta contra a homofobia. O ressurgimento repentino de violências contra gays na França mostra que devemos continuar mobilizados mesmo após a votação parlamentar", diz.

Deputados socialistas chegaram a receber cartas com ameaças de mortes. O presidente da Câmara dos Deputados, o socialista Claude Bartolone, recebeu na segunda-feira uma carta contendo pólvora e afirmando que haverá "guerra" se o projeto for adotado.

Adoção

O ponto mais polêmico do projeto e que divide a sociedade francesa é a possibilidade dos casais homossexuais adotarem crianças.

Boa parte da população (58%, segundo a última pesquisa do instituto BVA) é favorável ao casamento homossexual, mas a maioria (53%) se opõe ao direito dos homossexuais adotarem crianças.

A principal porta-voz do movimento contrário ao "casamento para todos", a humorista Frigide Barjot - trocadilho com o nome da atriz Brigitte Bardot, que significa literalmente "frígida doida" -, afirma que a lei "ignora os dois pilares da identidade humana: a diferença sexual e a filiação".

"O parentesco biológico não pode ser substituído por um parentesco social", afirma Barjot, que ressalta que seu movimento é pacífico e condena as violências cometidas contra os homossexuais.

Para o sociólogo Michel Wieviorka, a oposição ao projeto de lei se concentrou na questão da adoção e "se juntou às preocupações ligadas à vida, à morte, à procriação e à filiação, que não são específicas apenas dos meios católicos".

O cientista político Jean-Yves Camus, a crise econômica e social também permite ampliar a contestação, já que para alguns a oposição à lei seria uma forma de protestar de forma geral contra o governo do presidente François Hollande, que registra o mais baixo índice de popularidade de um líder francês em mais de 50 anos.

Várias passeatas contra a lei estão previstas em toda a França após a votação do texto nesta terça-feira.