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Turcomenistão: a vida num dos países mais repressores do mundo

BBC
Imagem: BBC

Abdujalil Abdurasulov

Da BBC, no Turcomenistão

29/12/2014 18h33

Com largas avenidas e grandes edifícios de mármore branco, Asjabad, a capital do Turcomenistão, país da Ásia Central, parece deserta.

O único som que se escuta é o dos muitos chafarizes em praças públicas. De vez em quando aparecem garis, que varrem as calçadas sem parar.

Fica a sensação de se estar sendo observado.

Um homem em trajes civis e com um walkie talkie aparece do outro lado da rua e começa a gritar comigo quando pego a câmera para filmar.

Os policiais que vigiam as ruas vazias são uma lembrança de que o Turcomenistão é um dos países mais repressores do mundo.

Contrato social

E na ex-república soviética, a vigilância ocorre até no trânsito.

A pequena câmera instalada numa das janelas do meu carro gravou um policial em sua viatura. Ele olhava diretamente para a lente e falava freneticamente.

Sua intenção poderia ser simplesmente me assustar, mas esse tipo de encontro causa pavor na população e ajuda a impor obediência.

E o medo está crescendo. Quando visitei o Turcomenistão sete anos atrás, era surpreendente como os locais eram pouco temerosos em falar com a mídia estrangeira.

Naquela época, elogiavam o governo, que lhes dava gás e eletricidade gratuitos, além de combustível e alimentos baratos.

Isso me lembrou algo que aprendi sobre contratos sociais em minhas aulas da teoria política: o Estado dá benefícios econômicos aos cidadãos e, em troca, os cidadãos não questionam o Estado.

Hoje, porém, a sensação é a de que esse acordo não funciona mais no Turcomenistão.

"Meu salário dá apenas para alimentar minha família", um morador de Asjabad me conta. "Temos imensos recursos energéticos, mas o povo não se beneficia disso. Inclusive, instalaram medidores de gás em nosso apartamento."

O gás e a eletricidade já não são mais gratuitos.

"O preço da carne e do transporte público também subiu", queixa-se um vizinho. "Mas as pessoas não protestam. Elas tem medo, não apenas por elas, mas também pelos parentes, pois aqui há castigos coletivos."

Segundo Rachel Denber, da ONG Human Rights Watch, a situação dos direitos humanos no Turcomenistão permanece "péssima".

"Não há liberdade de expressão, de congregamento, ou religiosa", afirma Denber. "Trata-se de um país em que os cidadãos vivem com medo das autoridades em todos os níveis, incluindo para algo tão simples como conseguir um aparelho de ar-condicionado no verão".

Gás e democracia

Mas o Turcomenistão não enfrenta a condenação da comunidade internacional. Na verdade, governos e empresas ocidentais buscam seduzir as autoridades para ganhar acesso aos recursos naturais do país.

O Turcomenistão tem a quarta maior reserva de gás natural do mundo, e, a cada ano, o país realiza uma conferência energética internacional.

Ao final do evento, os participantes agradecem o presidente Gurbanguly Berdymukhammedov, segurando uma foto sua. No poder desde 2006, substituindo um presidente que passara 16 anos no cargo, Berdimuhamedov "venceu" as mais recentes eleições, em 2012, obtendo 97% dos votos válidos.

Mas a falta de democracia não parece assustar, por exemplo, a União Europeia, que negocia com o presidente a construção de um gasoduto para levar o gás do Turcomenistão para a Europa.

O representante do bloco no país, Denis Danilidis, diz que as reformas virão.

"Não deixamos de tocar em assuntos como os direitos humanos ou o cumprimento da lei. Pelo contrário. Mas discutimos esses temas de maneira positiva", explica Danilidis.

"Ao nos comprometermos com um projeto como o do gasoduto, nosso diálogo ficará mais profundo e permitirá um maior nível de confiança, o que terá efeito sobre nossas discussões sobre temas como os direitos humanos."

Para ativistas de direitos humanos, no entanto, isso é uma ilusão. Eles defendem o argumento de que representantes ocidentais devem deixar claro ao governo turcomano as expectativas que têm a respeito dos direitos humanos.

O Turcomenistão é um dos países mais isolados do mundo, apesar de a expansão da internet através da telefonia celular ter trazido algumas mudanças.

Mas toda atividade online é monitorada. E a maioria das redes sociais é bloqueada. Quem desafia as regras acaba preso ou desaparece.

Para comprar um chip ou mesmo usar um computador num cybercafé é preciso fazer cadastro e mostrar o passaporte.

"O governo torna absolutamente impossível alguma alternativa", afirma Rachel Denber. "E o preço (de desafiar o controle estatal) é ir para a prisão ou algo pior".

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