Circunstâncias fazem PT ser 'ambíguo' sobre Cunha, diz Olívio Dutra
Figura histórica do PT, ex-ministro de Luiz Inácio Lula da Silva e ex-governador do Rio Grande do Sul, Olívio Dutra diz não concordar com a postura do partido frente às graves denúncias que recaem sobre o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Na sua avaliação, o PT hoje tem uma postura "ambígua" porque, sendo governo, carrega "essa carga enorme no ombro de (ter que) fazer o governo funcionar". E para tanto, afirma, "tem que trabalhar relações" com o Congresso.
Cunha é acusado de participação no esquema de corrupção da Petrobras investigado pela Operação Lava Jato - o que ele nega. As denúncias ficaram mais fortes no fim de setembro, quando veio à tona que ele e sua família têm contas milionárias na Suíça. O parlamentar reconhece a existências das contas, mas diz que o dinheiro tem origem lícita.
"O PT, por conta das circunstâncias em que vive, está tendo uma postura, no meu entendimento, ambígua nisso porque não faz a declaração aberta da insensatez que é ter uma figura como o deputado Cunha, com todas, digamos, essas evidências de coisas malfeitas, presidindo a Câmara Federal", afirmou Dutra à BBC Brasil.
"É uma questão realmente muito séria. O partido fica prisioneiro. Eu, particularmente, não concordo com essa postura. Mas quem está de fora (do governo) para dentro pode falar", disse o petista, que atualmente está sem cargo político.
No momento, o Conselho de Ética da Câmara dos Deputados analisa uma representação contra Cunha apresentada por PSOL e Rede, mas que recebeu assinatura de deputados de outros partidos, a maioria deles (32) do PT.
No entanto, a imprensa brasileira tem noticiado que haveria um acordo nos bastidores, articulado pelo ex-presidente Lula, em que o PT retardaria o processo no conselho em troca de Cunha não dar início a um processo de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff.
Esse acordo teria ganhado mais força após a decisão dos partidos de oposição, como PSDB e DEM, de romper com Cunha.
Há três deputados do PT no conselho: Zé Geraldo (PA), Valdir Prascidelli (SP) e Leo Brito (AC). Na semana passada, eles não apareceram no horário marcado para a leitura do relatório a favor da abertura de um processo contra Cunha - o que acabou contribuindo para dificultar o início da sessão por falta de quórum.
A reunião, marcada por muita polêmica, acabou não sendo realizada após manobras do presidente da Câmara para cancelar a sessão. Isso gerou forte reação de parte dos deputados, que abandonou o plenário da Casa aos gritos de "fora Cunha".
A leitura do relatório pelo deputado Fausto Pinato (PRB-SP) ocorreu nesta terça, mas, como aliados de Cunha pediram vista para analisar o documento, a votação para decidir se um processo contra ele será aberto ficou para daqui a uma semana.
Caso seja instaurado, o processo deve se estender até abril de 2016.
PT e Dilma
Dutra nega a existência de tal "acordão" entre PT, governo e Cunha. Para ele, uma negociação do tipo "seria algo absurdo".
"Eu duvido que tenha lideranças sérias do partido decidindo isso. Eu duvido até que me provem por A mais B que tenha essa negociação. Para mim, ela não existe, a não ser nas suposições do jogo político, adversário, para desgastar o governo e o PT", afirmou.
"Até porque a Dilma, no meu entendimento, não tem porque sair do governo. Não tem argumentos consistentes, jurídicos, políticos, para um impeachment contra a Dilma. No entanto, ela fica constantemente prisioneira das chantagens da base aliada. O PMDB está e não está no governo. O Cunha é do PMDB, que é base do governo", acrescentou Dutra.
O petista gaúcho não vê saída rápida para a atual crise, que na sua avaliação não é só do PT, mas de todo o sistema político. Ele aponta um suposto preconceito das elites contra o partido, mas reconhece que a legenda precisa fazer uma autocrítica.
"Eu acho que o PT está sendo uma mala sem alça para a Dilma. É um problema porque o PT se meteu em coisas que feriram profundamente o patrimônio ético e moral do partido. São figuras importantes (as envolvidas) e o PT não fez essa autocrítica pública, então fica cada vez mais desgastado nessa situação", reconheceu.
"Ele (o partido) não ajuda muito a presidente. Aliás, eu acho que de certa forma é um peso. E os demais partidos estão também envolvidos em falcatruas. Às vezes para eles a política sempre foi isso, para nós a política não era para ser isso."
Questionado sobre sua expectativa quanto ao desempenho do PT nas eleições municipais, Dutra disse que o eventual encolhimento do partido não é necessariamente ruim e criticou uma possível candidatura de Lula a presidente em 2018.
"É evidente que o partido não vai resolver a situação ganhando essa ou aquela eleição. Até acho que é muito temerário colocar o Lula como candidato a presidente da República", opinou.
"O partido depender de uma única pessoa significa que o partido tem que fazer muito mais do que já fez para ter base social, quadros políticos, que não dependem de uma única figura, por mais importante que ela seja."
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