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Estupro coletivo que chocou Índia levou a endurecimento na legislação

Protesto durante julgamento de estupradores que mataram jovem em Nova Déli - AP
Protesto durante julgamento de estupradores que mataram jovem em Nova Déli Imagem: AP

27/05/2016 09h16

Basta uma palavra para evocar o caso de estupro coletivo que chocou a Índia há quatro anos - levando a mudanças na legislação e, segundo especialistas, repercussões culturais no país.

Nirbhaya - "destemida".

Como na Índia a imprensa não é autorizada a publicar o nome de vítimas de estupro, a estudante de fisioterapia de 23 anos agredida e estuprada dentro de um ônibus na capital Nova Déli em dezembro de 2012 ganhou diversos apelidos como este.

A jovem morreu duas semanas depois no hospital em consequências dos ferimentos.

A indignação e os protestos públicos subsequentes ao caso levaram à aprovação de uma emenda à legislação criminal que entrou em vigor em abril de 2013, menos de cinco meses após o ocorrido.

A lei ampliou a definição de estupro, endureceu as penas (notadamente para casos seguidos de morte) e tornou crime sexual ações como ataques com ácido (que vitima centenas de pessoas por ano no país, a grande maioria mulheres), assédio sexual, voyeurismo e acosso.

A jornalista Vandana Vijay, do serviço indiano da BBC, diz que a sentença mínima para estupro coletivo, de menores e por policiais ou autoridades foi dobrada para 20 anos - até prisão perpétua.

Além disso, segundo as novas leis, a falta de resistência por parte da mulher não indica concordância com o ato.

Ponto de inflexão

Na noite de 16 de dezembro de 2012, a estudante - cujo nome real é Jyoti Singh - voltava do cinema com um amigo tarde da noite quando abordou o ônibus na capital indiana, Nova Déli. No veículo estavam seis homens, incluindo o motorista e um menor.

A certa altura do percurso, o ônibus se afastou do seu trajeto. Os agressores usaram uma barra de ferro para bater no amigo de Jyoti e deixá-lo inconsciente, e estupraram a mulher.

Depois da agressão, ambos foram jogados para fora do ônibus. Os detalhes da história chocaram a opinião pública e geraram protestos em várias cidades indianas.

Segundo especialistas, o caso não apenas mudou a legislação, mas virou uma espécie de "ponto de inflexão" no debate sobre violência sexual na Índia.

Nos dois anos seguintes ao caso, as queixas de estupro saltaram de cerca de 25 mil por ano (em 2012) para mais de 36 mil (em 2014). Ativistas dizem, porém, que as queixas continuam muito abaixo da realidade.

Além da ampliação do conceito de estupro, a pressão sobre a polícia é um fator que explica o salto: é mais provável hoje que as autoridades registrem as queixas.

E de acordo com o repórter da BBC Justin Rowlatt, as próprias vítimas estão mais dispostas que antes a sair a público.

Elas confrontam uma forte cultura que, como no Brasil, culpa as vítimas pelos ataques. De acordo com o jornalista da BBC, muitas vítimas indianas temem trazer desonra para si e para sua família.

Punições

Por outro lado, dados do governo indiano mostram que em apenas 28% os agressores são punidos - sem mudança em relação aos anos anteriores.

No caso que marcou a Índia, todos os agressores foram presos. Um morreu em custódia policial e o menor voltou à liberdade após cumprir três anos de prisão em regime juvenil.

Os quatro restantes foram condenados à morte - prevista em lei para apenas "para o mais raro dos casos". Um recurso contra as sentenças está tramitando na Suprema Corte do país.