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'Urgência' de sinal ao mercado deve levar PEC dos gastos a aprovação fácil no Senado

26/10/2016 16h46

Após ampla vitória na Câmara dos Deputados, o presidente Michel Temer caminha para aprovar com certa facilidade sua proposta de teto para os gastos públicos também no Senado, o que deve ocorrer até meados de dezembro.

De um lado, a bancada tucana decidiu passar por cima de eventuais discordâncias e apoiar o texto integral, sem alterações - a ideia é evitar que a tramitação demore, o que adiaria a recuperação da credibilidade da gestão das contas públicas, segundo avaliam de senadores do partido, que é governista.

Do outro, a oposição à medida reconhece que hoje não tem os votos suficientes para barrar a criação de um limite de vinte anos para a expansão das despesas federais - e aposta na mobilização nas ruas como única forma de mudar esse quadro.

A proposta é controversa e chegou a ser alvo de críticas pontuais mesmo de economistas liberais, ligados ao PSDB, que sugeriram que ajustes no texto aprovado pela Câmara deveriam ser feitos durante a votação no Senado.

No entanto, senadores tucanos ouvidos pela BBC Brasil descartaram essa hipótese e mostraram compromisso em aprovar a medida rapidamente.

Defesa e crítica

A proposta de emenda constitucional (PEC) 241 prevê que os gastos primários do governo (despesas que excluem gastos com juros da dívida) não poderão crescer acima da inflação por vinte anos.

Defensores da proposta dizem que ela é essencial para reequilibrar as contas públicas e retomar a confiança dos empresários, gerando mais investimentos e empregos.

Já os críticos dizem que a medida é muito rígida e vai reduzir investimentos em saúde e educação, afetando principalmente os mais pobres.

Assessor do PSDB no Senado, o especialista em finanças públicas Felipe Salto foi um dos que criticou o texto aprovado na Câmara. Com a economista brasileira Monica de Bolle, pesquisadora do think tank americano Peterson Institute for International Economics, ele escreveu um artigo intitulado "A PEC do teto não é uma Brastemp", sugerindo mudanças no texto.

A bancada tucana no Senado, porém, fechou posição a favor da aprovação integral da PEC, sem alterações, para evitar que a discussão da proposta se alongue, gerando mais desgaste para o governo Temer.

Por ser uma tentativa de alterar a Constituição Federal, a PEC precisa ser aprovada com texto idêntico na Câmara e no Senado, em duas votações em cada Casa, por ampla maioria dos parlamentares (ao menos três quintos do total).

Nesta terça-feira, a proposta passou pela segunda votação da Câmara com apoio de 359 deputados (bem acima dos 308 necessários). Se os senadores mudarem algo no conteúdo da PEC, ela teria que passar novamente pelo crivo dos deputados.

Daí a resistência em "aperfeiçoar" a proposta.

'O bom é inimigo do ótimo'

"Eu também acho que nós poderíamos aperfeiçoar, mas o sentido da proposta é o mais importante, e ele é correto porque coloca um limite na gastança pública. Não é hora de nós buscarmos o texto ideal. Na vida é mais ou menos assim, o bom é inimigo do ótimo", disse à BBC Brasil o senador Ricardo Ferraço (PSDB-ES).

Ele argumentou que o governo Dilma Rousseff "deixou uma catástrofe para os brasileiros", e que por isso a proposta precisa ser aprovada rapidamente.

"O risco é absoluto. O sinal que nós vamos dar (se mudarmos o texto) é de que estamos brincando de pique na beira do precipício", argumentou.

Seu colega de partido e de Senado José Aníbal (SP) também afirmou que o partido está unido no sentido de aprovar brevemente o texto.

"Mudar essa PEC agora não faz sentido nenhum porque vai atrasar a vigência dela. E porque ela é condição para que (se) comece a ter mais confiabilidade e credibilidade nas contas públicas."

Salto era assessor parlamentar de José Serra, hoje ministro das Relações Exteriores, e agora atua no gabinete de Aníbal, seu suplente no Senado.

Entre as críticas que ele e Bolle fizeram ao texto atual da PEC está a duração de vinte anos para o teto, que consideram muito longa.

Além disso, os economistas avaliam que nos moldes propostos o teto terá impacto pequeno nos primeiros anos de vigência e efeito muito rígido nos finais.

Isso porque a expectativa é que mais à frente a inflação caia e a economia se recupere. Dessa forma, a arrecadação do governo vai crescer, gerando mais recursos para gastos e investimentos, mas o limite de despesas vai subir pouco, já que estará atrelado a inflação.

O resultado é que deve ser produzido um superavit primário (economia para pagar juros da dívida) muito alto, além do necessário, avaliam eles.

Diante da decisão do PSDB de apoiar integralmente a proposta, Salto disse à BBC Brasil que, "apesar das ponderações", é a favor da PEC porque entende que "a aprovação do texto como está é melhor que não aprovar".

Ee sempre foi critico à gestão fiscal do governo Dilma, à qual atribui "boa parte da crise atual".

Oposição

São necessários os votos de 49 dos 81 senadores para que a PEC seja aprovada - para Ferraço, o governo terá apoio de 55 a 60 deles na votação final, que prevê ocorrer em 13 ou 14 de dezembro.

O senador Lindbergh Farias (PT-RJ), líder da oposição no Senado, reconhece não ter hoje votos suficientes para barrar a PEC.

"A base contra a PEC é a base que votou contra o impeachment. Seria insuficiente (para barrar a proposta). Mas a gente acha que aqui vai ter mais debate (do que na Câmara), vai ser mais esclarecedor, e isso pode despertar uma mobilização que pode reverter votos. Segunda já teve uma mobilização grande no Rio, com vinte mil pessoas."

Dentro do Senado, a estratégia é "fomentar o debate" com audiências públicas, disse Lindbergh.

Nesta terça foi realizada uma, a pedido do petista, na Comissão de Assuntos Econômicos. Os economistas convidados defenderam mudanças na estrutura de impostos do país como alternativa à PEC do teto, de modo a aumentar a arrecadação que incide sobre os grupos de maior renda.

Outras duas audiências estão marcadas para as próximas semanas na comissões de Direitos Humanos e de Constituição e Justiça.

Os senadores da oposição também pretendem apresentar propostas de alteração ao texto da PEC, afirmou Lindbergh, com o objetivo de preservar gastos com saúde e educação.

"A gente vai lutar para derrubar a PEC, mas é claro que nós vamos apresentar destaques de partidos e a gente vai tentar escolher aqueles que tenham mais condições de dividir (os senadores)", finalizou.