Onde são produzidos notas de dinheiro, jornais e placas de carro falsos usados em filmes de Hollywood
Você já se perguntou como e onde são feitos os jornais, documentos, placas de carro e até mesmo caixas de cereais feitos por encomenda para filmes de Hollywood? O escritor James Bartlett fez uma rara visita à fábrica de material impresso usada pelos grandes estúdios e conta como foi:
O dono semi-aposentado Ralph Hernandez inicia a tour pela Earl Hays Press, localizada em um despretensioso prédio em Los Angeles, mostrando os souvenirs de seu escritório.
Há uma cópia da revista Time com o astronauta Jack Nicholson na capa, lembrança do filme Laços de Ternura (1983); cópias de romances falsos escritos pela personagem de Kathleen Turner em Tudo por uma Esmeralda (1984); e o painel planetário usado por ET para apontar onde era sua casa.
São todas criações de fantasia, falsas, produtos que ajudam a contar histórias e realçar a ilusão de vida real de filmes para o cinema ou TV. Há mais de 100 anos, a Earl Hays Press fornece a cineastas e produtores de televisão detalhes impressos como anúncios, cardápios, revistas, mandados de prisão e inúmeros outros.
Talvez o produto mais notável da Earl Hays sejam os jornais de época, cruciais para cenas de um filme que passa na França de 1967, em Ohio de 1889 ou em um show televisivo de 1978.
De cartão de crédito a dólares
À medida que caminhamos para a oficina, cheia de armários e prateleiras, também fico surpreso com as carteiras de motorista, cartões de crédito e inúmeros pacotes de dólares falsos.
Em geral, os estúdios preferem usar material de fantasia para não ter problemas com direitos de uso de marca ou de imagem. Por isso, quase tudo, de dinheiro a produtos triviais domésticos, precisam de um novo design ou logo - uma potencial dor de cabeça para produtoras de filmes.
Hernandez aponta para centenas de placas de carro penduradas no corrimão do andar de cima. São de todos os Estados americanos, assim como de países ao redor do mundo.
Ele conta que muitas delas estão sendo atualizadas para novas filmagens. E ri ao lembrar quando vários carros, todos com placas falsas da Earl Hays, estacionaram no Boulevard de Hollywood durante uma filmagem.
"Um policial se aproximou e pensou que tivesse tirado a sorte grande. Ele multou todos ali".
Hernandez, de 83 anos, fez sua entrevista de emprego na Earl Hays há 53 anos, e nunca mais foi embora. O negócio agora pertence à sua família, no qual filho e neto executam operações diárias.
Empresa centenária
Earl Hays, já falecido, foi quem fundou e deu nome à empresa em 1915. Ele começou o negócio como uma gráfica numa pequena loja em Hollywood. Ávido viajante, Hays desenhava as placas de veículos de cada país que visitasse.
Esse hábito deu a ideia inicial do negócio quando Hays voltou aos Estados Unidos. E a gráfica recebia tanta encomenda de filmes que ele decidiu se especializar.
E como funciona?
Geralmente, a escolha do material falso necessário para uma produção é listada quando o responsável do departamento de arte lê o roteiro. Com a lista em mãos, os clientes tem a opção de escolher material do estoque ou encomendar algo novo.
"Mas aí o roteiro acaba sendo reescrito, e sets de filmagem que foram construídos acabam nem sendo usados", diz Hernandez.
Depois de passarmos por uma parede com cartazes de pessoas procuradas e pôsteres de teatro do século 19, chegamos ao showroom do andar de cima.
Ali, há prateleiras com latas de refrigerante falsas, cigarros Morley (inventado para a série Arquivo X) e inúmeras amostras coloridas de comida. Gavetas etiquetadas guardam uma incrível variedade de tudo o que é impresso.
Hernandez folheia os jornais e mostra que alguns têm apenas a primeira e a última página, enquanto que outros até tem as páginas internas, mas geralmente repetidas.
E lembra o trabalho intenso que a empresa teve para produzir uma sequência de primeiras páginas de jornal para O Poderoso Chefão.
"Por poucos mil dólares, vários anos foram cobertos. E a audiência soube o que tinha acontecido e onde eles estavam quando viram Michael (Al Pacino) na Sicília".
Atenção aos detalhes
A Earl Hays não é apenas uma empresa de design e impressão, é também um museu e arquivo não oficial. Segundo Hernandez, isso lhes dá uma vantagem. Eles têm alguns competidores, mas a Earl Hays é a mais antiga e conhecida.
"Todo moleque com um computador pode ser nosso inimigo", diz Hernandez.
Mas a diferença é que a Earl Hays se preocupa com os detalhes.
"Diretores e produtores querem precisão em seus filmes. Seus principais críticos não são seus fãs, são outros diretores e produtores. É uma coisa de ego!", ele ri.
Muitas empresas de design e gráficas podem teoricamente fazer o que a Earl Hays faz. Mas eles provavelmente não conseguiriam o realismo da produção com tanta rapidez. A Earl Hays já tem praticamente tudo à mão.
Movendo-se para a cozinha, Hernandez me mostra uma parede coberta com selos e placas da Presidência dos EUA, do FBI, do Departamento de Segurança Interna, da Polícia e de outras agências.
Embora seja uma mina de outro de histórias da indústria do entretenimento, Hernandez não costuma dar entrevistas. Isso porque alguns de seus produtos podem ser mal utilizados se caírem nas mãos erradas.
Notas fugidas
Um diretor uma vez encomendeu notas de dólares para uma cena de pôquer no filme A Mesa do Diabo (1965), com o ator Steve McQueen.
"As chapas das notas tiveram autorização do Serviço Secreto", conta Hernandez.
Depois do filme, as notas começaram a aparecer em diferentes locais do mundo, embora o número de série fosse um só e as chapas tivessem sido assinadas pelo artista da casa, não pelo Tesouro americano.
O Serviço Secreto insistiu que o dinheiro e as chapas fossem queimados no quintal do prédio, enquanto supervisionava o processo.
"Eles levaram até as cinzas", contou o neto de Hernandez, Keith.
A Earl Hays ainda tem várias impressoras antigas, que raramente são usadas. Mas vira e mexe surgem encomendas que exigem técnicas ou equipamentos antigos, como fontes de um período específico, xilogravuras, chapas, corantes e prensas pesadas.
Por isso, Hernandez quer manter as coisas como estão, mesmo percebendo que os avanços tecnológicos vão acabar chegando à Earl Hays.
"Consigo imaginar que um dia fechemos as portas", ele diz. "Mas sentirão nossa falta quando formos embora".
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