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Hugh Hefner, o bon vivant que fez sucesso vendendo seu próprio estilo de vida a milhões de homens no mundo

28/09/2017 16h39

Hugh Hefner, que morreu de causas naturais nesta quarta-feira, aos 91 anos, criou um mundo de fantasia para milhões de homens, mas, diferentemente da maioria de seus leitores, conseguiu viver esse sonho.

Ele atingiu com êxito uma nova geração de americanos que estavam desfrutando de novos padrões de vida nos anos 1950 e 1960.

Ativista político e filantropista, ele criou não apenas uma revista, mas todo um estilo de vida.

E com o famoso logotipo da Playboy de um coelho usando uma gravata borboleta, lançou uma das mais reconhecidas marcas do século 20.

Hugh Marston Hefner nasceu em Chicago em 9 de abril de 1926, filho de dois professores com fortes convicções religiosas.

Depois de servir o Exército americano como repórter, ele se formou em psicologia antes de começar a trabalhar como redator na revista masculina Esquire.

Em 1953, pegou emprestado US$ 8 mil para produzir a primeira edição da Playboy. Hefner estava tão preocupado que a revista não vendesse que decidiu não colocar a data na capa.

Nudes

Sua mãe contribuiu com US$ 1 mil. "Não porque ela acreditou no negócio", Hefner disse depois, "mas porque acreditou em seu filho".

Ele originalmente pensou em batizar a nova publicação como Stag Party ("Despedida de Solteiro"), mas mudou de ideia no último minuto.

A primeira edição da Playboy trouxe algumas fotografias de Marilyn Monroe nua, que Hefner comprou por US$ 200 e que foram tiradas originalmente para um calendário de 1949.

Por sorte ou capacidade de avaliação, o timing de Hefner foi perfeito. A publicação das reportagens de Alfred Kinsey sobre comportamento sexual questionou as crenças convencionais sobre sexualidade e levantou temas até então considerados tabu.

"Kinsey era o investigador, eu, o panfletário", Hefner frisou.

Estouro da Playboy

A sociedade americana de classe média era notoriamente puritana nos anos 1950, mas a combinação de fotos de mulheres com artigos intelectualmente estimulantes atraiu o homem urbano do pós-guerra.

"Nunca pensei na Playboy como uma revista de sexo", Hefner recordou. "Eu sempre pensei nela como uma revista de estilo de vida, na qual o sexo era um ingrediente importante."

A revista foi um sucesso absoluto, vendendo mais de 50 mil cópias em poucas semanas. Hefner achou um nicho no mercado de publicações masculinas, até então era dominado por temas como caça, armas e pesca.

A segunda edição trouxe pela primeira vez o logotipo do coelho com gravata borboleta, criado por Art Paul, diretor de arte da revista. A marca apareceria em milhões de produtos nas décadas seguintes.

Em 1955 Hefner publicou um texto do escritor Charles Beaumont sobre homens heterossexuais enfrentando perseguições em um mundo onde homossexuais eram a maioria na sociedade.

Em resposta a uma enxurrada de cartas raivosas sobre o texto, Hefner respondeu: "Se era errado perseguir heterossexuais numa sociedade homossexual, então o contrário também é".

Anos depois, ele se tornaria um defensor do casamento de pessoas do mesmo sexo descrevendo isso como "uma luta por todos os nossos direitos".

Sua linha editorial estava sintonizada com as mudanças na sociedade, como as campanhas da revista por políticas liberais de drogas e o direito ao aborto.

Pelos próximos 20 anos, a Playboy dominou seu mercado, com sua circulação atingindo o pico de sete milhões no começo dos anos 1970, quando uma pesquisa indicou que um quarto de todos os estudantes universitários homens nos Estados Unidos compravam a revista.

Naquela época, a publicação trazia alguns dos melhores textos da escrita contemporânea no mercado de revistas, tendo Saul Bellow, Arthur C Clarke, Norman Mailer e Gore Vidal entre seus colaboradores frequentes.

Luxo e indulgência

Os artigos apareciam no meio das fotos obrigatórias de mulheres bonitas, registradas com muito melhor gosto do que muitas de suas concorrentes inferiores.

A seção Coelhinha do Mês destacava nomes famosos como Jayne Mansfield e Pamela Anderson, enquanto outras celebridades, incluindo Bo Derek, Kim Basinger, Farrah Fawcett e Madonna, ficaram felizes em posar para a revista.

Em 1963, as fotos de Mansfield provocaram a prisão de Hefner. Ele acabou acusado de obscenidade, mas o júri não conseguiu chegar a um veredito.

Hefner começou a explorar o sucesso de sua revista com a abertura do primeiro clube Playboy em Chicago, em 1960, que lançou as garçonetes coelhinhas.

A flexibilização das leis de jogos no Reino Unido se mostrou uma nova oportunidade, e Hefner abriu três cassinos. Em 1981, esses negócios estavam contribuindo com todo o lucro mundial da Playboy.

Naquele período, Hefner estava vivendo uma vida de luxo e indulgência em suas duas mansões Playboy, acompanhado de um time de celebridades e namoradas que variava sempre, e se deslocando entre elas em seu jato DC9 personalizado, o Big Bunny.

Sem roletas

A fortuna de Hefner sofreu uma grande queda nos anos 1980 - as autoridades britânicas fecharam os cassinos do Reino Unido por causa de uma série de irregularidades, cortando significantemente a renda da Playboy.

Um ano depois o cassino em Atlantic City, nos Estados Unidos, foi fechado após Hefner ter sido considerado pelo setor responsável uma pessoa inapropriada para possuir uma licença.

E a revista Playboy também estava em decadência, já que concorrentes com conteúdo sexual mais explícito competiam com ela por espaço nas bancas e seus leitores tradicionais estavam ficando mais velhos e deixando a publicação.

E em um revés pessoal, Hefner sofreu um derrame em 1985, e quatro anos depois passou o controle diário da Playboy Enterprises para sua filha Christie.

Em 1989, aos 63 anos, Hefner se casou com uma de suas coelhinhas, Kimberley Conrad, de 27 anos. O casamento durou dez anos e eles tiveram dois filhos.

Viagra

Nos anos 1990, a sorte da Playboy mudou - Christie Hefner levou a empresa a novas áreas, incluindo a de TV a cabo.

Enquanto isso, Hefner, em suas próprias palavras, descobriu o Viagra e passou a ficar a maior parte do tempo em sua mansão vestido em pijamas de seda e rodeado por mulheres.

Em 2012, aos 86 anos, ele se casou com sua terceira mulher, Crystal Harris, 60 anos mais nova.

Libertário por natureza, sua Fundação Playboy continuou a apoiar a liberdade de expressão. Ele foi um grande doador do Partido Democrata, ajudando, inclusive, na campanha presidencial de Hillary Clinton no ano passado.

Também era um apoiador de organizações de consevação ambiental e teve uma espécie de coelho, Sylvilagus palustris hefneri, batizada em sua homenagem.

Nos seus últimos anos, Hugh Hefner acabou ridicularizado como um idoso rodeado de mulheres jovens.

Mas à frente da Playboy, criou um estilo de vida que ia ao encontro das aspirações de uma grande parte da sociedade americana do pós-guerra. A feminista Camille Paglia o descreveria, anos depois, como "um dos principais arquitetos da revolução social".

"Sou uma criança em uma loja de doces", declarou Hefner uma vez. "Sonhei sonhos impossíveis e eles se revelaram acima de tudo o que eu poderia imaginar. Sou o gato mais sortudo do planeta."