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O estranho zumbido que intriga cientistas e enlouquece moradores de uma cidade canadense

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Imagem: Getty Images

25/02/2018 08h14

O som se assemelha ao de um caminhão em movimento, à queda de um raio em um lugar distante ou ao barulho de alto-falantes durante um show de música.

Às vezes vem, às vezes vai embora. Mas quem o escuta passa a sofrer de dores de cabeça, insônia, náuseas, irritação e fatiga. Ou, em casos mais graves, depressão.

"A pessoa simplesmente perde a capacidade de aproveitar seu tempo com a família. O ruído é muito penetrante. É muito difícil até mesmo assistir à televisão", explica Mike Provost. "Esse é o tamanho do poder desse som".

Provost é morador da cidade de Windsor, no Canadá, onde, desde 2011, algumas pessoas têm denunciado as consequências de um ruído misterioso.

Em referência à cidade, na fronteira com os Estados Unidos, o zumbido está sendo chamado de "Windson Hum".

O intrigante fenômeno motivou alguns estudos para explicá-lo - mas nenhum conseguiu precisar exatamente a sua causa.

Para alguns moradores de Windsor, porém, se as causas não são conhecidas, suas consequências são perturbadoras.

"Imagine ter que fugir de tudo o que você conhece e ama simplesmente para ter a oportunidade de se afastar do zumbido", escreveu Sabrina Wiese em um fórum online de pessoas afetadas pelo ruído, entre as quais algumas que consideram deixar a região por conta do problema.

'Vai e vem'

25.fev.2018 - Algumas pessoas em Windsor e Cleveland relataram terem escutado o ruído - BBC - BBC
Algumas pessoas em Windsor e Cleveland relataram terem escutado o ruído
Imagem: BBC

A população de Windsor é de cerca de 210 mil pessoas, mas só algumas pessoas sofrem com o zumbido. Autoridades e pesquisadores não têm um número preciso para o volume de afetados.

A cidade, na província de Ontario, está localizada na divisa com a cidade americana de Detroit - que tem uma população de 672 mil pessoas e é um grande centro industrial, principalmente de automóveis.

O rio Detroit divide as duas cidades.

"O ruído vai e vem durante o dia, mas é pior à noite", explica Provost, um aposentado que administra o fórum de afetados na internet e já forneceu às autoridades algumas gravações do ruído.

"Percebemos que o clima influencia. Quando faz frio, o som tende a diminuir. Quando tem vento, ele sobe. Não sabemos de onde vem e o que o causa", descreve.

Ao longo dos anos, os afetados pelo zumbido também perceberam que a altitude tem influência: quanto mais alto se está, mais se percebe o ruído.

https://www.youtube.com/watch?v=tPDILKQjJW8

Possível origem

25.fev.2018 - Triângulo avermelhado identificado no estudo da Universidade de Ontario Ocidental mostra a origem mais provável do ruído, na ilha Zug - Agência Geológica de Canadá - Agência Geológica de Canadá
Triângulo avermelhado identificado no estudo da Universidade de Ontario Ocidental mostra a origem mais provável do ruído, na ilha Zug
Imagem: Agência Geológica de Canadá

Três pesquisas diferentes conseguiram apontar uma fonte mais provável para o fenômeno: a ilha Zug, pertencente à cidade americana de Detroit.

Em 2011, a Agência Geológica do Canadá confirmou, por meio de análises sísmicas, que o ruído em Windsor existe e tem origem mais provável na ilha.

"Os sinais registrados são consistentes com os zumbidos relatados na região de Windsor, em termos de tempo, duração e características", conclui o relatório.

Um estudo da Universidade de Ontario Ocidental de 2013 também não conseguiu identificar uma fonte exata, mas sinalizou que as "possíveis fontes podem incluir escavações ou sistemas de ventilação industrial".

O maior estudo sobre o zumbido, porém, veio em 2014 - feito por meio de instrumentos de medição acústica pela Universidade de Windsor.

A pesquisa assinalou como fonte mais provável o uso de fornos de alta potência na ilha Zug pela empresa de metalurgia United States Steel Corp.

"Essas conclusões são reforçadas pela natureza periódica do ruído, que foi observado e medido pelos investigadores", diz o estudo.

Gary Wheeler, da Secretaria de Meio Ambiente e Mudanças Climáticas de Ontario, Estado canadense, disse à BBC que por ora não há planos para novos estudos sobre o "Windson Hum".

Sem acesso à ilha Zug

25.fev.2018 - Especialistas têm usado equipamentos para tentar medir o ruído - Universidade de Windsor - Universidade de Windsor
Especialistas têm usado equipamentos para tentar medir o ruído
Imagem: Universidade de Windsor

Enquanto algumas pessoas em McGregor, ao sul de Windsor, e na cidade americana de Cleveland já relataram terem escutado o zumbido, em Detroit não há relatos.

David Bower, advogado em uma cidade americana próxima, descartou no passado a ideia de uma investigação na ilha Zug, parte de sua jurisdição.

"Não vamos pagar por algo que beneficie outra pessoa porque não é um problema que nos afeta", disse ao jornal canadense National Post.

Mas um estudo de campo ali é fundamental para a obtenção de um "resultado significativo" sobre o que está causando o zumbido que afeta os moradores do lado canadense, como indicou a Universidade de Windsor.

Gary Gross, morador de Windsor afetado pelo ruído, disse à BBC que os interessados em buscar uma solução para a situação sabem que contar com a colaboração de autoridades americanas "é muito difícil, se não impossível".

A BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC, pediu uma entrevista com a empresa United States Steel Corp., mas não obteve resposta a tempo.

Micro-ondas?

Nos Estados Unidos, houve casos similares ao de Windsor que remontam à década de 1990, mas os especialistas tampouco conseguiram identificar a fonte dos barulhos.

Um amplo estudo foi realizado na localidade de Toas, no Novo México - onde, em 1993, 161 pessoas de uma população de 8 mil relataram incômodo com um ruído.

O único ponto que pôde ser identificado foi "um nível de campo eletromagnético elevado que, segundo relatórios, estava relacionado às linhas elétricas locais".

Em Kokomo, no Estado americano de Indiana, 126 pessoas entre 46 mil habitantes disseram sentir os efeitos de um zumbido e algumas disseram que redutores de ruído em instalações industriais aliviaram seus efeitos.

James Cowan, especialista em acústica, considera que não se trata de "um fenômeno acústico tradicional".

"Ele pode ser escutado por algumas pessoas, mas não pode ser localizado usando instrumentos de acústica padrão", indicou em uma análise dos casos de Novo México e Indiana.

Cowan aponta que uma possível explicação seja o fenômeno da "audição de micro-ondas".

"É um fenômeno pelo qual as pessoas (incluindo as diagnosticadas com surdez) podem escutar sons relacionados com a exposição ao campo eletromagnético e que não têm a pressão acústica mensurável", diz Cowan.