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Venezuela perto da falência: Maduro tenta remanejar dívida externa e não convence credores

Nicolás Maduro apresenta a cédula de 100 mil bolívares  - Palácio de Miraflores via Reuters
Nicolás Maduro apresenta a cédula de 100 mil bolívares Imagem: Palácio de Miraflores via Reuters

Sandra Weiss (av)

14/11/2017 13h41

Para evitar a bancarrota, Maduro busca remanejamento da dívida externa. Promessas não convencem credores, e agência coloca país em "calote seletivo". Para analistas, quebra estatal é inevitável

Nunca uma falência estatal foi tantas vezes e por tanto tempo anunciada e antecipada, inclusive pelo próprio presidente, como no caso da Venezuela.

Na segunda-feira, após uma reunião com credores da PDVSA, a estatal venezuelana de petróleo, em Caracas, o presidente Nicolás Maduro anunciou, sem dar muitos detalhes, um plano para refinanciar 60 bilhões de dólares em títulos.

Os detentores de títulos, no entanto, veem as coisas de maneira diferente. Eles saíram da reunião ainda confusos sobre como a Venezuela planeja evitar um calote.

"Não propuseram nada, foi uma oportunidade perdida", disse à agência agência de notícias Reuters um dos cerca de cem investidores presentes no encontro.

A agência de classificação de risco S&P pôs a Venezuela em "calote seletivo": o país não conseguiu fazer pagamentos dos títulos com vencimento em 2019 e 2024 dentro do período de 30 dias.

Segundo a agência, há chance real de o país não efetuar mais pagamentos dentro de três meses.

Mais perto da inadimplência

"Quanto mais imprevisível o mercado, maiores são as chances de insiders próximos ao governo fazerem ou lavarem dinheiro", escreveu o economista Francisco del Toro, em seu blog Caracas Chronicles.

A estratégia seria, segundo ele, que o pânico nos mercados financeiros permite a especuladores venezuelanos comprar barato os títulos da PDVSA e da Corpoelec, sabendo que o governo acabaria por restituí-los.

Ainda assim, a inadimplência vai se aproximando cada vez mais. A Venezuela tem uma dívida externa de 150 bilhões de dólares, a maior parte – 50 bilhões de dólares – nas mãos de credores privados, seguidos pela China e a Rússia.

Com ambos Caracas vai amortizando a dívida na forma de petróleo e de participações em refinarias e campos de extração, como

Há meses o pagamento dos empréstimos devidos vem se atrasando. A Venezuela dispõe de menos de 10 bilhões de dólares em reservas no Banco Central, a maior parte das reservas em ouros já está penhorada pela Suíça.

Segundo analistas, a falência estatal é inevitável, o mais tardar em 2018.

Até o último fim de semana não havia um convite formal nem informações sobre o local onde se realizariam as negociações de reestruturação da dívida venezuelana. Um problema adicional é o fato de o negociador designado pelo governo, Tareck El Aissami, estar na lista de chefes do narcotráfico procurados pelo governo dos Estados Unidos, portanto qualquer acerto com ele é passível de pena.

Os hedge-fonds americanos estão entre os principais investidores na Venezuela, pois os títulos estatais eram atraentes, devido a seus prêmios de risco, sujeitos a juros elevados. Os fundos especializados em falências estatais contam ainda lucrar grandemente com a Venezuela, nas negociações de reestruturação.

O pagamento das dívidas deixa a Maduro cada vez menos dinheiro para financiar as importações imprescindíveis à sobrevivência do país, que os fornecedores agora só entregam mediante pagamento antecipado. Por isso o ex-ministro venezuelano e professor da Universidade de Harvard Hausmann apelidou os títulos de "hungerbonds".

Beco sem saída

Tempos difíceis se anunciam para Caracas. Por um lado, é improvável que os credores aceitem um remanejamento sem reformas de mercado profundas na economia socialista de escassez. Isso provavelmente resultaria em programas de austeridade drásticos e perda de poder pelos socialistas.

Por outro lado, a Venezuela possui ativos nos EUA, como uma refinaria de petróleo operada pela sucursal estatal Citgo, que poderiam ser confiscados judicialmente. Da mesma forma, com uma falência estatal, o acesso aos mercados financeiros internacionais estaria, de início, bloqueado.

Embora tenham sempre se mostrado generosos para com Maduro, nas últimas semanas credores estatais como Pequim e Moscou aumentaram a pressão sobre os "caloteiros" venezuelanos.

No entanto, uma suspensão do pagamento das dívidas proporcionaria a Maduro uma breve pausa para respirar. E ele poderia empregar o faturamento com a os quase 2 milhões de barris de petróleo exportados diariamente na importação dos urgentemente necessários alimentos e medicamentos.

Desse modo, o presidente venezuelano teria a chance de reconquistar os eleitores perdidos para a oposição, a fim de vencer tanto a próxima eleição regional como a presidencial, a ser provavelmente marcada para o primeiro trimestre do próximo ano.