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Filme reconta massacre na Noruega

22/02/2018 10h16

Diretor diz que produção faz parte do "processo de cura", quase sete anos após atirador fazer carnificina em acampamento de adolescentes. Sobreviventes acusam longa de transformar incidente traumático em entretenimento.O diretor Erik Poppe diz que seu filme faz parte do processo de cura das cicatrizes deixadas pela pior atrocidade da história do pós-guerra na Noruega, o massacre de 69 pessoas, a maioria menores, em um acampamento da ala jovem do Partido Trabalhista, na ilha de Utoya.

O filme U-July 22, que estreou na quarta-feira (21/02) na competição oficial do Festival de Cinema de Berlim, narra a carnificina promovida pelo extremista de direita Anders Behring Breivik no dia 22 de julho de 2011 – horas depois de ele ter matado oito pessoas em um atentato a bomba em Oslo.

Rodado em outra ilha perto de Utoya, o filme segue, em uma única sequência, um grupo de jovens, principalmente a personagem fictícia Kaja, enquanto ela corre para se salvar do atirador através dos bosques e praias.

A produção norueguesa – uma das 19 que concorrem ao Urso de Ouro – narra, em tempo real, a luta dos adolescentes pela sobrevivência, durante 72 minutos, a exata duração da carnificina, enquanto Breivik, disfarçado de policial, vai abatendo a tiros os jovens, um por um, até a polícia finalmente chegar.

A plateia vê Katja procurar desesperadamente sua irmã mais nova – Emilie, de quem se perdeu quando se ouvem os primeiros tiros –, confortar uma adolescente à beira da morte e cantar para si próprio para afastar o pânico, enquanto se esconde atrás de um penhasco.

Celulares no modo silencioso começam a vibrar abandonados na mata, à medida que os pais, que receberam as notícias em casa, tentam entrar em contato com seus filhos. Tiros podem ser ouvidos, mas o atirador só é visto à distância.

Foco nos adolescentes

A obra procura retratar o massacre do ponto de vista dos adolescentes. Poppe ressaltou, durante entrevista coletiva no festival, que nos sete anos desde a tragédia, Breivik repetidamente roubou a cena com aparições extravagantes no tribunal e a cobertura genérica da imprensa, que ofuscou a memória das crianças mortas.

"À medida que iam se passando os meses, os anos, fomos vendo a memória do que aconteceu naquela ilha se apagar, mais e mais", disse o cineasta norueguês, ex-fotógrafo de guerra. "Encontrei sobreviventes daquela ilha. Eles compartilharam aquele sentimento, e isso os estava preocupando.”

O assassino nunca expressou remorso pelo que fez. Ele disse que matou suas vítimas porque elas eram a favor do multiculturalismo.

Poppe entende as críticas de que o filme veio cedo demais, mas contou ter ouvido dos próprios sobreviventes que era a hora de abordar o assunto no cinema.

"Eu diria que, se não doesse ver esse filme, então ele viria tarde demais. Então eu diria que, claro que é duro, mas também faz parte do processo de cura”, sublinhou.

A produção coletou o testemunho de vários sobreviventes para criar uma trama fictícia, baseada em dolorosa realidade e encenada, em maior parte, por atores sem experiência.

"Decidimos fazer uma ficção por razões éticas, para que os pais, irmãs e irmãos não precisassem ver e pensar: 'Será que é minha irmão ou irmão?', disse o diretor,

Segundo ele, psicólogos estiveram nas locações para ajudar os atores e residentes da ilha onde as filmagens ocorreram. Também três sobreviventes acompanharam o desenvolvimento da produção desde o começo.

Alguns sobreviventes na Noruega criticaram severamente a decisão de fazer o filme. "Erik Poppe pegou o pior pesadelo da minha vida e transformou em entretenimento”, acusou Kent Rune Pedersen, que escapou vivo de Utoya,

Ele diz que ainda é perseguido por "recordações, sonhos, barulho, choros e imagens”. "Está fora de questão que eu vá ao cinema ver tal filme”, afirmou.

Outro filme sobre o mesmo acontecimento está sendo rodado pelo diretor britânico Paul Greengrass, produzido pelo serviço de streaming Netflix.

MD/afp/rtr/dpa

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