Após 18 anos de poder, o que explica a popularidade de Putin entre os russos?
Em duas décadas, ele criou um império político, cultivando a imagem de salvador de um país imerso no caos pós-URSS. No domingo, irá pela primeira vez às urnas uma geração que não conhece a Rússia com outro líder.
Num evento recente de campanha eleitoral no estádio de futebol Luzhniki, em Moscou, uma multidão aguardava o convidado de honra. Em meio aos 80 mil espectadores, segundo estimativa da polícia, via-se um mar de faixas com inscrições como "Por um presidente forte" e "Por uma Rússia forte".
Em qualquer outro lugar, seria um evento normal de campanha, mas, em 2018, este é o único comício oficial do presidente Vladimir Putin. O líder de fato da Rússia nos últimos 18 anos nunca gostou de fazer campanha eleitoral, mas nestas eleições, em que sua nova vitória parece inevitável, tem-se a impressão de que seu entusiasmo é menor do que nunca.
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O breve discurso para a massa reunida não durou nem seis minutos. Após prometer garantir novas vitórias para a Rússia — como o ouro olímpico conquistado pelo time de hóquei que o flanqueava no palco —, Putin partiu rapidamente. E o mesmo fizeram dezenas de milhares de russos, mostrando pouco interesse no resto da programação planejada pelos organizadores.
A mídia internacional e de oposição afirmaria mais tarde que muitos dos espectadores foram pressionados a participar do evento. Ao que parece, o "Time Putin", como os organizadores se autobatizaram, não quis deixar nada ao acaso na única escala de sua campanha eleitoral.
Império político
O comício foi apenas uma das "ofensivas fotográficas" cuidadosamente elaboradas que se tornaram a marca do império político de Putin, uma operação projetada mais para vender sua imagem do que apresentá-lo como candidato.
Esse fato não passou despercebido para muitos na plateia. À medida que mais espectadores deixavam o estádio, uma mulher comentou para um fotógrafo ainda em ação: "Você tinha que tirar as fotos no início, quando todo o mundo ainda estava aqui”.
Como talvez não seja de espantar para um ex-funcionário da KGB, Putin é um homem que valoriza a própria privacidade e controla estritamente que informações devem chegar ao público. Em quase duas décadas no poder, viu-se uma transmutação de sua imagem pública – de um jovem líder relativamente desconhecido para a encarnação cuidadosamente moldada do machismo russo e da ambição política redescoberta do Estado. E parte dessa ambição exige uma reinterpretação da história.
"Há um sentimento de humilhação em torno da queda da União Soviética. Ela não é mais vista como algo que se deveu aos erros da própria União Soviética; em outras palavras, que eles sejam responsáveis pelo que aconteceu. Em vez disso, é vista como algo que foi feito contra eles por inimigos estrangeiros e, em alguns casos, internos", diz o analista político Jens Siegert, baseado em Moscou.
E esse desejo de redefinir o passado da Rússia parece estar na raiz do tom cada vez mais beligerante com que Putin se dirige tanto à Europa quanto a Washington. Falando recentemente a parlamentares russos, Putin revelou uma série de plataformas armamentistas com potencial nuclear, segundo ele capazes de contornar qualquer sistema de defesa antimíssil dos Estados Unidos. "Vocês não nos escutaram naquela época. Então nos escutem agora", declarou o líder russo em seu discurso.
Navegando através do caos
A popularidade contínua de Putin entre os eleitores também está relacionada ao caos dos anos 1990. A desintegração da União Soviética e o consequente desastre econômico e social deixaram cicatrizes profundas em muitos cidadãos russos. Durante os nove anos entre a criação da Federação Russa e a ascensão de Vladimir Putin ao poder, a economia nacional sofreu várias grandes crises, o PIB caiu quase 50%, e a perspectiva média de vida diminuiu.
"Se você quer a versão curta da história: ele salvou nosso país", afirma Maria Katasonova, estrela da mídia social e simpatizante de Putin. Ela ocupou as manchetes internacionais por seu pôster de campanha com os retratos de Putin, a populista de direita francesa Marine Le Pen e o presidente americano, Donald Trump.
Katasonova afirma que os esforços de Putin para estabilizar a economia insuflaram vida nova no país. "Na década de 1990, as aposentadorias não estavam sendo pagas, e muitas empresas não pagavam seus funcionários […] Quando Putin assumiu o poder, nós começamos a viver."
É discutível até que ponto as medidas de Putin foram responsáveis pela maior estabilidade econômica na Rússia nos primeiros anos de seu governo. A Rússia é um país rico em recursos, que automaticamente se beneficiaria do boom do mercado de bens de consumo no início do século 21.
"O crescimento econômico veio totalmente em favor [de Putin]. Essa é a base do poder dele: o medo de resvalar novamente para o caos dos anos 90", afirma Siegert. Pesquisas recentes indicam que ele está mais de 50 pontos à frente da meia-dúzia de outros candidatos nas cédulas eleitorais.
E quando os russos votarem no próximo domingo (18/03), irá pela primeira vez às urnas uma geração que não conhece a Rússia sem Putin. A completa dominação da vida política russa por ele, comenta Siegert, deixou pouco espaço para o desenvolvimento de uma oposição legítima.
"Ninguém pode realmente imaginar o que virá depois de Putin. Essa é uma parte integrante da estratégia política dele: controle total do campo político, controle que impede qualquer competição possível. É por isso que tanta gente se vê forçada a escolher entre Putin e o caos, ou entre Putin e a humilhação."
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