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Como funcionava o "Mensalinho do Twitter"

Fernanda Pugliero

29/08/2018 12h07

DW fala com uma das pessoas que participou do esquema de difusão de conteúdo favorável a candidatos do PT e PR nas redes sociais por meio de influenciadores, que eram pagos para isso. Prática contraria legislação.Nos últimos dias veio à tona um esquema de pagamento de influenciadores de redes sociais para propagação de pautas positivas disfarçadas de notícia, que ficou conhecido popularmente como Mensalinho do Twitter. O esquema teria surgido da promessa do deputado federal Miguel Corrêa, do PT de Minas Gerais, a candidatos de seu próprio partido e do PR de criar uma estratégia diferenciada de campanha via redes sociais.

Além de petistas, candidaturas do PR, como a de Tiririca, que tenta se reeleger como deputado federal em São Paulo, e de Kátia Sastre, policial militar que concorre pela primeira vez a um cargo eletivo após ter matado a tiros um ladrão em frente a uma escola, tiveram material propagado.

Na lista de clientes que teriam contratado o serviço aparecem ainda a senadora Gleisi Hoffmann, do PT do Paraná, Luiz Marinho, que concorre ao governo de São Paulo, e o governador Wellington Dias, que tenta a reeleição no Piauí. Foi por causa deste último que o esquema acabou jogado no ventilador, quando uma das influenciadoras digitais que participava do esquema replicando pautas positivas no Twitter decidiu se revoltar contra uma das missões sugeridas pela plataforma: elogiar o mandato de Dias no Piauí.

Corrêa, que deixou o cargo de Secretário de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais em janeiro para concorrer ao Senado, teria fechado contratos milionários com pelo menos uma dezena de políticos que pagaram para participarem de um espécie de game, que ocorria através do aplicativo Follow, criado por empresas subcontratadas por ele. Para ganhar pontos nesse game, os influenciadores convidados a baixar o aplicativo deveriam compartilhar conteúdo positivo sobre os candidatos nas redes sociais.

A DW teve acesso ao contrato de uma das pessoas selecionadas pela empresa Fórmula Tecnologia, da qual um dos sócios é Corrêa, para trabalhar durante a campanha eleitoral. Conforme o documento, essa pessoa foi empregada para "prestar serviços de comunicação de redes sociais e mídias digitais" de julho a outubro para o projeto Follow, aplicativo que servia de ligação entre as pautas positivas das candidaturas que contrataram o serviço e os influenciadores responsáveis por fazer a difusão dessas pautas nas redes sociais.

O projeto teria iniciado com um cunho noticioso, para replicar pautas positivas nas redes sociais. A dezena de jornalistas contratados pela empresa cuidava tanto da curadoria quanto da produção de conteúdo. Uma parte do time era responsável por recolher notícias positivas sobre as candidaturas, fazendo o clipping de grandes veículos da imprensa. Os textos eram inseridos no aplicativo, com a indicação da fonte da notícia, e a reverberação deles era tarefa dos influenciadores que participavam do game. "Não vi nada sendo inventado, tudo tinha fonte", afirmou um membro da equipe à DW.

Outra parte dos contratados tratava de produzir matérias jornalísticas a partir de pautas próprias, que poderiam surgir, por exemplo, de uma entrevista de um dos candidatos a um veículo de comunicação ou de uma visita para prospecção a eleitores. A assessoria dos candidatos não tinha responsabilidade sobre o esquema de produção e quase nunca enviava sugestões de pautas ou material para os textos.

Por orientação interna, os jornalistas da Fórmula Tecnologia começaram a investir também em matérias que falavam bem do candidato à Presidência da República Luiz Inácio Lula da Silva, que tinha seu próprio aplicativo, o Brasil Feliz de Novo, mesmo nome de sua coligação. Começaram também a produzir pautas contrárias a Jair Bolsonaro, que concorre à Presidência pelo PSL. Pouco tempo depois, outra orientação interna vetou o tema.

Na outra ponta do aplicativo ficavam os influenciadores, pessoas com uma elevada quantidade de seguidores nas redes sociais, especialmente no Twitter, e que poderiam ser utilizadas para difusão do conteúdo disponibilizado pelos jornalistas. Essas pessoas eram abordadas individualmente pelas redes sociais e convidadas a baixar o Follow para participar do chamado game.

Cada tarefa cumprida valia pontos. Os pontos, ao final de certo período de tempo, seriam trocados por dinheiro. Os ganhos poderiam chegar a 1.500 reais por mês. Não havia contrato entre a empresa e os influenciadores.

Como o aplicativo não obteve resultados positivos logo nas primeiras semanas, já que os conteúdos postados não entusiasmavam os seguidores dos influenciadores a replicarem as postagens, a Fórmula Tecnologia e as duas empresas contratadas por Corrêa para prestar apoio e consultoria (a Lajoy e a Be Connected) decidiram mudar o formato do projeto.

Passaram então a enviar missões por e-mail e mensagens de WhatsApp de forma mais personalizada, de acordo com o interesse político dos influenciadores, que variavam desde o feminismo até a proteção de animais. Por esse motivo, alguns influenciadores, que vieram mais tarde a público revelar convite ou posts envolvendo o aplicativo, afirmaram não saber que se tratava de uma ação ligada a partidos políticos.

Candidaturas que pagavam pelo serviço podem ser cassadas

A estratégia do aplicativo Follow tenta burlar não só a legislação eleitoral como também as regras das redes sociais. Facebook e Twitter já estão vacinados contra tentativas de postagens por robôs ou de direcionamento de opiniões disfarçadas de comentários e têm mecanismos para combatê-los. Postagens feitas por usuários únicos e reais, entretanto, geralmente não passam por nenhum tipo de verificação. Essa foi a brecha aproveitada pelo esquema do Follow.

De acordo com o advogado Antônio Augusto Mayer dos Santos, especialista em direito eleitoral, houve abuso dos meios de comunicação e da Lei Eleitoral. O artigo 24 da resolução publicada pelo Tribunal Superior Eleitoral sobre a campanha deste ano aponta que é vedada a veiculação de qualquer tipo de propaganda eleitoral paga na internet, com exceção de conteúdos impulsionados, desde que identificados como tal e contratados exclusivamente por partidos políticos, coligações e candidatos e seus representantes.

A violação da norma está sujeita a multa, que pode variar entre R$ 5.000 e R$ 30.000. Para Mayer dos Santos, trata-se de ato passível de investigação eleitoral, que pode culminar em cassação do registro ou do mandato.

Por enquanto, apenas o governador do Piauí, que concorre à reeleição, está sendo investigado pela Justiça Eleitoral. O Tribunal Regional Eleitoral do Piauí definiu esta quinta-feira como prazo final para que Wellington Dias e a empresa Lajoy manifestem-se sobre a acusação de propaganda irregular. A ação foi solicitada pelo advogado da coligação do candidato Luciano Nunes (PSDB), que disputa com Dias o governo do Piauí.

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