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Ditadura, monarquia e governo corrupto: quem indicou filho para embaixador

Eduardo Bolsonaro com o pai, Jair Bolsonaro - 04.dez.2018 - Adriano Machado/Reuters
Eduardo Bolsonaro com o pai, Jair Bolsonaro Imagem: 04.dez.2018 - Adriano Machado/Reuters

Jean-Philip Struck

12/07/2019 17h07

O que Arábia Saudita, Chade e Uzbequistão têm em comum? Seus governantes já nomearam parentes para ocupar embaixadas. Com indicação de filho, Bolsonaro segue o exemplo de ditaduras e pequenos países corruptos.

O presidente Jair Bolsonaro anunciou na quinta-feira (11) que pretende indicar um de seus filhos, o deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), como o novo embaixador do Brasil nos Estados Unidos, posto que está vago desde abril e que nas últimas décadas foi ocupado por diplomatas veteranos do Itamaraty.

Eduardo, que completou 35 anos na quarta-feira, idade mínima para ocupar o posto de embaixador, não tem nenhuma experiência em diplomacia ou formação específica em relações exteriores. Seu currículo inclui cargo de escrivão da Polícia Federal. Ele está em seu segundo mandato como deputado federal.

Ao anunciar a indicação, Bolsonaro admitiu que o fato de Eduardo ser seu filho pesou. Segundo o presidente, isso deve garantir um "tratamento diferente de um embaixador normal", sugerindo que a proximidade vai ajudar a abrir portas em Washington. Bolsonaro ainda destacou que Eduardo é "amigo dos filhos de Trump" e sabe falar inglês e espanhol.

No moderno mundo da diplomacia internacional, a iniciativa por parte de um chefe de Estado ou de governo de entregar uma embaixada para algum parente só encontra paralelos em ditaduras ou pequenos países subdesenvolvidos que aparecem no topo de rankings que medem corrupção. Grupos esses que incluem Arábia Saudita, Chade, Uzbequistão e Armênia.

Nenhuma das principais democracias do mundo registra algum caso parecido na história recente. Há casos de doadores de campanha ou de políticos que ganham postos como parte de acordos, mas nenhum episódio que envolva parentes diretos de um governante. Nos Estados Unidos, o único caso registrado envolve um presidente do final do século 18.

O príncipe saudita


O rei Salman, da Arábia Saudita, que chefia uma monarquia absolutista que mantém seu poder com mão de ferro desde a década de 1930, tomou a iniciativa de indicar um de seus filhos para a embaixada do seu país em Washington.

Tal como Eduardo, Khalid bin Salman não tinha nenhuma experiência diplomática quando assumiu a chefia da representação saudita nos EUA, aos 28 anos. Ele acabou deixando o posto em 2019. Foi substituído por uma princesa, também da família Saud e neta de um antigo príncipe herdeiro que nunca assumiu o trono.

As herdeiras do Uzbequistão


O ex-ditador Islam Karimov manteve o poder por 26 anos no Uzbequistão, uma ex-república Soviética da Ásia Central, usando métodos brutais, assassinatos e fraude eleitoral. Durante sua ditadura (1989-2016), Karimov também recompensou regularmente suas duas filhas com cargos diplomáticos.

A mais velha, Gulnara Karimova, foi nomeada representante permanente do Uzbequistão na sede das Nações Unidas em Genebra, na Suíça. Em 2010, ela ainda acumulou o posto de embaixadora de seu país na Espanha. Mensagens de diplomatas americanos vazadas pelo Wikileaks descreveram Gulnara como "uma baronesa ladra" por causa de sua vida de luxo. Sua irmã, Lola, ocupou o cargo de representante permanente na Unesco.

A grande família do Chade


O ditador Idriss Déby tomou o poder no Chade, uma nação miserável do centro-norte da África, por meio de um golpe militar com o apoio da França em 1990. Seu regime é regularmente acusado de desrespeitar os direitos humanos e promover a corrupção generalizada no país. Em 2016, ele foi eleito para um quinto mandato, em um pleito que provocou acusações de fraude por parte da oposição.

Déby também espalhou parentes em embaixadas do Chade pelo mundo. Um genro ocupou a representação do país nos EUA. Outro genro ocupou o cargo na Arábia Saudita e hoje é embaixador na África do Sul. Um sobrinho foi o representante na França. Um irmão, na Líbia. Por fim, em abril de 2018, Déby nomeou seu filho, Zacharia, de 33 anos, como embaixador do Chade nos Emirados Árabes Unidos.

O genro armênio

O ex-presidente Serzh Sargsyan governou entre 1998 e 2018 a Armênia, uma pequena nação de cerca de 3 milhões de habitantes do leste da Europa que figura na 105ª posição dos países mais corruptos do mundo - empatado com o Brasil - em ranking da ONG Transparência Internacional (quanto melhor o lugar no ranking, menos o país é considerado corrupto).

Em 2013, Sargsyan nomeou seu próprio genro, Mikayel Minasian, como embaixador da Armênia no Vaticano. Minasian só perdeu o cargo no ano passado, quando seu sogro foi forçado a deixar o poder após uma onda de protestos que varreu o país. Hoje, a família Sargsyan é alvo de uma série de inquéritos por suspeita de corrupção na Armênia.

Uma exceção nos Estados Unidos... do século 18

Nos Estados Unidos, não são incomuns os casos de indicações puramente políticas para cargos de embaixador. Em 2013, Barack Obama indicou doadores da sua campanha à reeleição para postos na Holanda, Dinamarca e Espanha. George W. Bush fez o mesmo com seus doadores e entregou cargos na Alemanha e no Canadá. Assim como no Brasil, as indicações precisam ser referendadas pelo Senado.

Apenas um presidente americano indicou um parente direto para um importante cargo diplomático: John Adams, o segundo ocupante da Casa Branca, que governou os EUA entre 1797 e 1801. Alguns meses após assumir o cargo, Adams nomeou seu filho, John Quincy, como embaixador dos Estados Unidos na Prússia.

Porém, Quincy já era um diplomata veterano, tendo chefiado as representações dos EUA na Holanda e Portugal no governo do antecessor do seu pai, George Washington. Ele ainda seria nomeado como embaixador na Rússia e no Reino Unido mais de uma década depois de o pai deixar a Presidência.