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Opinião: Alemanha não merece a confiança dos afegãos

Maissun Melhem

28/08/2021 08h23

Opinião: Alemanha não merece a confiança dos afegãos - Forças Armadas alemãs encerraram os voos de resgate em Cabul. Deixaram para trás ajudantes que, por anos, confiaram nelas. Estas pessoas estão agora à espera da misericórdia do Talibã, opina Maissun Melhem.Enquanto eu lia sobre as notícias sobre o último voo de resgate alemão a decolar de Cabul, me lembrei de uma anedota que um político alemão me contou em uma entrevista há dez anos.

Durante uma estada no Afeganistão, o político iniciou uma conversa com um vendedor de tapetes. Enquanto olhava os artigos expostos, ele se apaixonou por um determinado tapete que custava centenas de euros. Mas, como não tinha dinheiro suficiente no bolso, pediu ao vendedor que reservasse o tapete até que ele retornasse com a quantia correspondente. Mas o vendedor respondeu: "Leva o tapete e volta assim que tiver o dinheiro. Eu confio em você". O político cumpriu sua promessa e não enganou o vendedor de tapetes.

Por que a Alemanha não agiu desta maneira no Afeganistão? As Forças Armadas alemãs deixaram o país de forma irrevogável, mas milhares de afegãos desesperados foram deixados para trás, com medo mortal.

Quebra de confiança

Em pronunciamento ao Parlamento na quarta-feira, a chanceler federal Angela Merkel comemorou os sacrifícios feitos pelos soldados alemães para combater o terrorismo e construir a democracia e as estruturas liberais no Afeganistão. Ela elogiou a missão da Bundeswehr e seus feitos.

Mas o excelente trabalho da Bundeswehr, de vários ministérios federais e organizações de ajuda alemã no Afeganistão teria sido absolutamente impossível se não fossem os vários trabalhadores humanitários afegãos locais, que conhecem bem o caminho.

Como quase ninguém na Bundeswehr fala dari ou pashto, as línguas locais, os ajudantes foram indispensáveis como intérpretes durante a missão no Afeganistão. Sua tarefa muitas vezes ia muito além da mera tradução. Foram também mediadores culturais e guias locais indispensáveis em patrulhas fora dos acampamentos das tropas.

E mesmo dentro das bases, a vida cotidiana dos soldados alemães teria sido diferente sem a cooperação de muitos ajudantes locais.

Sem a rede de jornalistas, artistas, ativistas de direitos humanos e muitos outros construída nos últimos 20 anos, os esforços para promover a democracia e a educação no Afeganistão teriam fracassado muito antes do avanço do Talibã.

Essas pessoas confiaram na Alemanha e nas autoridades alemãs – confiaram a elas suas vidas e as de suas famílias. Porque sabiam que eram considerados traidores pelos extremistas e que trabalhar para os alemães os colocaria em perigo. Muitas dessas pessoas estão agora presas no Afeganistão e têm que esperar pela misericórdia do Talibã.

O desastre do Afeganistão

Em seu pronunciamento no Parlamento, a chanceler tentou justificar o dramático erro do governo de não ter começado mais cedo a retirar as forças locais em perigo. "Depois que aconteceu, é relativamente fácil olhar para trás e prever exatamente o que aconteceu”.

Agora o governo alemão está na posição desagradável e absurda de, por um lado, negociar com o Talibã sobre novas possibilidades de resgate mesmo após a retirada completa das tropas, ao mesmo tempo em que não os reconhece como governantes legítimos.

Só se pode desejar sucesso ao governo alemão neste aspecto. Assim como as forças locais deixadas para trás, a Alemanha agora também depende da misericórdia do Talibã para poder salvar nossos trabalhadores humanitários no Afeganistão e, portanto, a reputação da Alemanha como um parceiro confiável no mundo.

O desastre do Afeganistão, como tantas outras coisas, não pode ser remediado com ajuda financeira. Esta falha custou vidas humanas que foram negligentemente colocadas em risco e ameaçadas. Nada pode compensar este dano. A única coisa que falta fazer é admitir o erro e esclarecer totalmente as razões do fracasso. E, finalmente, pedir perdão às vítimas e suas famílias – algo que, até agora, nem Merkel nem seus ministros fizeram.

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Maissun Melhem é jornalista da DW. O texto reflete a opinião da autora, não necessariamente a da DW.
Autor: Maissun Melhem