Análise: Kuczynski, o presidente engolido pela corrupção que prometeu combater
O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, renunciou nesta quarta-feira (21) ao cargo, engolido pela ampla corrupção na política do país, um crime que prometeu combater e exterminar quando tomou posse há cerca de 20 meses.
A longa experiência no setor público e privado, o extenso patrimônio particular e a formação anglo-saxã tornavam Kuczynski idôneo para lutar contra a corrupção, mas o caso Odebrecht colocou seu governo no patamar das épocas mais obscuras do regime de Alberto Fujimori, beneficiado por um indulto que ajudou a sepultar a breve administração do agora ex-presidente.
Kuczynksi estava há seis meses no poder quando a Operação Lava Jato, o maior escândalo recente da América Latina, chegou ao país, atingindo diretamente o alto escalão da política peruana. O presidente então foi engolido pela corrupção que jurou combater.
A credibilidade de Kuczynski foi colocada em cheque depois da revelação de que sua empresa de consultoria, a Westfield Capital, tinha recebido US$ 782 mil da construtora brasileira entre 2004 e 2007. Na época, o agora ex-presidente era ministro do governo de Alejandro Toledo, também acusado de envolvimento com a Odebrecht.
A pá de cal definitiva veio pouco depois, graças a uma ação tomada pelo próprio Kuczynski. Na véspera do natal do ano passado, o presidente resolveu conceder um indulto a Alberto Fujimori pela condenação a 25 anos de prisão por crimes contra a humanidade, quebrando uma promessa de campanha. Dias antes, a primeira-ministra do país, Mercedes Araóz, tinha reafirmado que isso não ocorreria.
O indulto foi concedido três dias depois de parte da oposição, liderada pelo filho mais novo do ex-presidente, Keiko Fujimori, ter preferido a abstenção na votação do processo de vacância, um impeachment, contra Kuczynski.
A liberdade de Fujimori, considerado como um dos presidentes mais corruptos da história do país, foi entendida pelo eleitorado de Kuczynski como uma traição política.
O agora ex-presidente perdeu o pequeno apoio que ainda tinha hoje, poucas horas antes de o Congresso peruano debater e votar um segundo processo de impeachment, após a divulgação de uma série de vídeos e gravações nas quais Keiko Fujimori, assim como outros congressistas e funcionários do governo, oferecem apoio a parlamentares opositores para que votassem a favor de Kuczynski.
Os vídeos foram batizados como "kenjivideos", por lembrarem os "vladivideos", imagens do ex-assessor presidencial Vladimiro Montesinos responsáveis para derrubar Alberto Fujimori por revelarem a compra de congressistas, empresários e jornalistas com dinheiro público.
Desta forma, Kuczynski encerra uma longa carreira política. Antes da presidência, ele foi ministro de Fernando Belaunde Terry (1980-1985) e Alejandro Toledo (2001-2006). Anteriormente, tinha trabalhado como funcionário do Banco Central do Peru (BCRP).
No entanto, sua atuação como funcionário público foi marcada por polêmicas e denúncias de lobby. Em 1968, por exemplo, Kuczynski, gerente do BCRP, foi acusado pelo governo militar peruano de entregar dinheiro à International Petroleum Company (IPC) quando a empresa já tinha sido nacionalizada. Kuczynski fugiu do Peru no porta-malas de um carro.
Nos anos 1980, voltou a abandonar o país após renunciar ao cargo de ministro de Energia devido aos protestos contrários a uma lei que dava isenções tributárias à exploração de gás e petróleo.
Nascido em 1938, em Lima, Kuczynski é filho do médico judeu alemão Maxime Kuczynski, que chegou ao Peru fugindo do nazismo para estudar doenças tropicais na Amazônia, e da professora franco-suíça Madeleine Godard, tia do cineasta Jean-Luc Godard.
Fora da política, Kuczynski estudou economia nas universidades de Oxford (Inglaterra) e Princeton (Estados Unidos). O agora ex-presidente é casado com a americana Nancy Ann Lange, prima da atriz Jessica Lange, que já recebeu duas estatuetas do Oscar.
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