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Norte-coreanos na Coreia do Sul querem voltar para casa, mas lei os impede

16/09/2018 10h35

Seul, 16 set (EFE).- Ex-espiões, prisioneiros de guerra ou desertores desencantados com a vida na Coreia do Sul, pelo menos 30 norte-coreanos desejam atravessar a fronteira para voltarem ao país natal, algo que é impedido por uma lei e que representa um complexo desafio que as duas Coreias devem abordar na cúpula que terão em Pyongyang nesta semana.

Kim Ryen-hui, uma costureira de 49 anos, passou os últimos sete tentando reencontrar marido e filha na Coreia do Norte.

Em 2011, ela viajou para a China para tratar de um problema hepático, e um "intermediário" a convenceu que podia levá-la para a Coreia do Sul, onde, segundo ele, poderia trabalhar "durante um ou dois meses" e voltar com muito dinheiro para pagar as despesas médicas.

Quando desembarcou na Coreia do Sul, Kim já sabia que tinha sido enganada. O Serviço Nacional de Inteligência (NIS) sul-coreano - acostumado a trabalhar com estes "intermediários" - lhe deixou claro que seu status era o de desertora, e que não poderia voltar atrás.

"Me disseram; assine este papel, ou nunca mais vai sair desta sala. Portanto, eu o fiz", contou Kim à Agência Efe em uma lanchonete de Seul.

Isto a transformou em cidadã sul-coreana, a impedindo de viajar para a Coreia do Norte (exceto com autorização do governo e com obrigação de retornar), como diz a Lei de Segurança Nacional.

O NIS, que sabe de seu desejo de retornar, tem se encarregado desde então de bloquear seu pedido para obter um passaporte, frustrando seu plano de viajar para a China como sul-coreana e, de lá, voltar a seu país.

Kim tentou de tudo, desde fretar um barco que a levasse ilegalmente para a China, a falsificar um passaporte.

Devido a este último caso, ela ficou dez meses na prisão, onde tentou se suicidar várias vezes, contou, sem esconder as lágrimas, e reforçando o quanto sente a falta da filha.

O NIS trabalha com outro polêmico caso: a deserção, em 2013, de 12 norte-coreanas que trabalhavam em um restaurante na China.

Da mesma forma que Kim, várias delas asseguram ter sido enganadas para irem para a Coreia do Sul, como se contaram elas mesmas ao relator da ONU para os Direitos Humanos na Coreia do Norte, o argentino Tomás Ojea Quintana.

O objetivo do NIS nestas operações seria o de vender todas estas deserções como uma vitória propagandística para os governos conservadores da Coreia do Sul entre 2008 e 2017.

Liberal, o atual governo, apesar da aproximação com Pyongyang, se vê incapaz legalmente de ceder a suas demandas para que Kim e as outras mulheres sejam devolvidas, uma exigência que chegou a colocar em risco a retomada dos laços entre os países, iniciada neste ano.

Reformar a Lei de Segurança Nacional requereria um amplo apoio da oposição conservadora, algo virtualmente impossível atualmente.

Além disso, as primeiras emendas, caso sejam aprovadas, nunca incluiriam permitir a livre circulação de cidadãos entre os países, afirmou à Efe Kang Jung-woo, advogado especializado em segurança nacional e militar.

As esperanças destes norte-coreanos estão depositadas na possibilidade de que, na cúpula, os líderes das duas Coreias, Kim Jong-un e Moon Jae-in, assinem um acordo similar ao fechado em 2000, durante a primeira reunião intercoreana.

Naquela ocasião, Seul enviou de volta 63 espiões e ex-prisioneiros de Pyongyang que tinham expressado seu desejo de retornar.

É assim como se sente Yang Won-jin, que, aos 90 anos, só quer uma coisa: voltar para casa.

"É lá onde está meu coração, com os ideais da República Popular", contou Yang, sentado no salão da residência que a Associação de Apoio para Prisioneiros de Consciência tem em Seul, onde divide espaço com outros dez ex-agentes infiltrados ou soldados do Exército Popular capturados, além de Kim Ryen-hui.

Yang, nascido na Coreia do Sul, mas que ficou na Coreia do Norte ao fim do conflito, se infiltrou outra vez em 1955 em uma operação militar e não conseguiu voltar. Ele acabou detido quatro anos depois e ficaria na prisão por 29, até a chegada da democracia na Coreia do Sul.

"Este é um tema humanitário, porque estão sendo violados os direitos fundamentais destas pessoas, que só querem voltar para seu país", explicou Kwon Wo-hon, diretor e um dos fundadores da associação, que presta auxílio a norte-coreanos desde 1989.

"Estas pessoas precisam voltar para seus familiares, sofrem muito, e o tempo continua correndo. Alguns, pela idade, não têm muito tempo", ressaltou Kwon.

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