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Força-tarefa da Lava Jato ameaça renunciar se projeto aprovado na Câmara for sancionado por Temer

30/11/2016 18h16

(Reuters) - Os integrantes da força-tarefa da Lava Jato afirmaram nesta quarta-feira que podem renunciar caso seja confirmado o projeto aprovado na Câmara dos Deputados nesta madrugada que inclui a responsabilização de juízes e membros do Ministério Público por crime de responsabilidade e de abuso de autoridade, disse o procurador Carlos Fernando Lima, que integra a força-tarefa.

A proposta aprovada pelos deputados foi chamada pela força-tarefa da Lava Jato, em nota divulgada pelos procuradores, de "lei da intimidação" e, segundo os investigadores, sinaliza o início do fim da Lava Jato, responsável por apurar um bilionário esquema de corrupção na Petrobras e que envolve empreiteiras, agentes públicos e políticos.

"Fica claro com a aprovação dessa lei que a continuidade de qualquer investigação sobre poderosos, sobre parlamentares, sobre políticos, ela tem um risco pessoal para os procuradores... Se nós acusarmos, nós podemos ser acusados. Podemos, inclusive, responder com o nosso patrimônio", disse Lima.

"Nesse sentido, a nossa proposta é de renunciar coletivamente caso essa proposta venha a ser sancionada pelo presidente", acrescentou.

A Câmara dos Deputados aprovou nesta madrugada projeto que inicialmente tinha o apoio do Ministério Público com medidas de combate à corrupção. A proposta, no entanto, foi bastante alterada por destaques apresentados pelos partidos.

Foi incluído no texto dispositivo que prevê a responsabilização de magistrados e membros do Ministério Público por crimes de abuso de autoridade, entre eles a suposta atuação com motivação político-partidária.

A proposta terá agora de ser analisada pelo Senado. Se for aprovada sem alterações pelos senadores, vai à sanção do presidente Michel Temer.

AUTOPRESERVAÇÃO

Em nota lida pelo coordenador da Lava Jato, procurador Deltan Dallagnol, a força-tarefa acusou os deputados de agirem movidos pelo instinto de autopreservação e de se aproveitarem do luto nacional após o acidente com o avião que levava a delegação da Chapecoense para a final da Copa Sul-Americana, na Colômbia.

"Aproveitando-se de um momento de luto e consternação nacional, na calada da madrugada, as propostas foram subvertidas. As medidas contra a corrupção, endossadas por mais de 2 milhões de cidadãos, foram pervertidas para contrariar o desejo da iniciativa popular e favorecer a corrupção por meio da intimidação do Ministério Público e do Judiciário", afirma a nota lida por Dallagnol.

"Persigam os juízes e promotores, soltem os colarinhos brancos. Essa é a mensagem da ação do Congresso de ontem... A aprovação da lei da intimidação acontece em um momento em que as investigações da Lava Jato chegam cada vez mais perto de crimes de corrupção praticados por um número significativo de parlamentares influentes", acrescenta a nota.

A proposta aprovada na Câmara durante a madrugada também foi alvo de críticas da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, que afirmou em nota que a inclusão do trecho sobre abuso de autoridade pode ferir a autonomia do Judiciário. Ela disse ainda que pode-se tentar calar um juiz, mas não se pode calar o Judiciário.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, também reagiu à votação na Câmara e disse que os deputados colocaram "o país em marcha a ré no combate à corrupção". Ele pediu que a sociedade fique atenta à tramitação da proposta no Senado para evitar que o texto aprovado na Câmara se concretize.

O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), negou que a inclusão do trecho que prevê a punição de juízes e promotores seja uma retaliação e destacou a transparência da votação.

“Foi uma votação transparente, nominal. Cada deputado vai responder perante o eleitor em relação a seu voto”, disse Maia, segundo a Agência Câmara Notícias.

“A Câmara vota o que acha importante”, acrescentou, ao negar que a aprovação do texto fosse uma retaliação aos investigadores.

Um assessor de alto escalão de Temer disse que é necessário aguardar o Congresso se manifestar sobre o projeto.

"As medidas ainda estão no Congresso. É preciso aguardar o que será aprovado e quando será aprovado", disse.

(Por Eduardo Simões e Tatiana Ramil, em São Paulo, com reportagem adicional de Anthony Boadle em Brasília)