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Com abdicação do imperador Akihito, Japão se prepara para "nova era"

28/08/2018 14h32

Em muitos documentos oficiais japoneses, não estamos em 2018, mas no ano 30 da era Heisei, o trigésimo ano do reinado do imperador Akihito. Com sua abdicação no final de abril de 2018, o arquipélago se prepara para uma mudança radical.

Geralmente, o nome da nova era é anunciado apenas alguns dias após a morte do imperador, um evento em essência imprevisível. Em 7 de janeiro de 1989, quando Hirohito morreu, o Japão estava no 64º ano da era Showa (1926-1989), que se tornou a noite do ano inaugural da era Heisei, que deu início ao reinado de Akihito.

Desta vez, os fabricantes de calendário estão com sorte. Uma vez que uma lei de exceção autoriza o 125º Imperador do Japão, Akihito, 84, a passar a coroa ainda em vida, tudo tem sido planejado com antecedência e o nome da nova era deve ser anunciado antes de 1º de maio, quando seu filho mais velho, Naruhito, subirá ao trono de Crisântemo.

Será muito tarde para que o nome da nova era apareça nos calendários de 2019, que deve figurar nas publicações de 2020, segundo espera Kunio Kowaguchi, presidente da empresa Todan, que fabrica a cada ano 10 milhões de calendários no Japão. Setores da administração pública, escolas e hospitais que utilizam documentos que mencionam a era, juntamente com o calendário gregoriano, também terão tempo para se organizar.

O Japão e suas 250 eras

A prática da utilização das “eras ("gengo", em japonês) tem suas origens na China antiga, mas continua em vigor no Japão, segundo historiadores. O país conheceu quase 250 eras, muito mais do que o número de imperadores, porque era costume mudar os nomes para marcar um novo começo após desastres naturais ou outros eventos importantes.

A escolha do nome das eras é feita de acordo com um processo rigoroso que não depende da Casa Imperial, mas do governo. O termo selecionado deve ser novo, refletindo os ideais da nação. “Heisei” significa, por exemplo, "cumprimento da paz", e obedece a algumas regras: deve ser composto de dois ideogramas, ser fácil de escrever e ler, além de evitar nomes comuns de pessoas, empresas ou lugares.

E, provavelmente, o nome da nova era não começará com as letras M, T, S e H, já que estas já aparecem em muitas eras do Japão moderno (desde 1868), como Meiji, Taisho, Showa e Heisei.

Os japoneses se divertem fazendo previsões numa atmosfera que contrasta com o clima sério dos últimos meses da era Showa, quando o ex-imperador Hirohiro lutou contra a morte, diz Junzo Matoba, um alto funcionário que trabalhou em silêncio durante as pesquisas para a designação da nova era.

Política do “segredo”

"Alguns achavam que era falta de respeito preparar a próxima era enquanto o atual imperador ainda estava vivo”, diz o octogenário Matoba. "Eu tive que trabalhar em segredo", conta. Ele se lembra de consultas delicadas com os especialistas, com o ego às vezes excessivo - eles acreditavam que eram o "Monte Fuji", diverte-se o funcionário. "Eu me senti preso em uma tarefa tão difícil, com uma espada de Dâmocles sobre a minha cabeça", disse, numa referência ao antigo mito grego, uma metáfora do perigo que se corre quando se relaciona com o poder.

Essa mudança de era é a primeira a ocorrer com a presença da ciência da computação. Alguns temem um "bug", como o esperado no momento da transição para o ano 2000. "Mas a diferença com o problema do ano 2000 e a mudança da era anterior é que as tecnologias agora são usadas em toda parte e que a informação circula também via Internet, com equipamentos adaptados ", comenta Kazunori Ishii, porta-voz da Microsoft no Japão.

Recomeçar do zero

Entretanto, mesmo se o sistema de mudanças de eras é complicado, poucos japoneses hoje o questionam. O dono da empresa que fornece os calendários no Japão chega a defender essa prática. "É mais fácil lembrar o passado com eras: por exemplo, lembramos que a bolha estourou no início da era Heisei", diz Kowaguchi, referindo-se ao colapso da economia japonesa nos anos 1990.

Nos últimos meses, jornais e revistas multiplicaram as retrospectivas sobre os 30 anos da era Heisei, que começou com a queda do Muro de Berlim e o lançamento do popular Gameboy Nintendo, mas também palco de dramas, como o terremoto e o tsunami de março de 2011, ou o ataque com gás sarin da seita Aum no metrô de Tóquio, em 1995.

Após a execução em julho dos 13 japoneses condenados à morte pelo ataque de Aum, a imprensa local alegou que as autoridades haviam escolhido acabar com essa história sombria antes do advento de uma nova era. "Os japoneses adoram começar do zero - uma nova era, um novo estado de espírito", diz Matoba.

(Com informações da AFP)