França: comissão independente identifica cerca de 3 mil pedófilos na igreja católica desde 1950
A França teve entre 2.900 e 3.200 padres ou religiosos pedófilos nos últimos 70 anos. Essa é uma das primeiras revelações, divulgadas neste domingo (3), de um relatório elaborado por uma comissão independente que investigou crimes cometidos pela igreja católica francesa. O documento integral será revelado na terça-feira (5).
Após dois anos e meio de trabalho, a Comissão Independente sobre os Abusos Sexuais na Igreja (Ciase, sigla em francês), presidida por Jean-Marc Sauvé, se prepara para apresentar as conclusões em um relatório de "2.500 páginas" na próxima semana. O documento será entregue à Conferência dos Bispos da França et à Conferência das Religiosas e Religiosos dos Institutos e Congregações (Corref), que pediram a elaboração deste balanço. A divulgação ocorerrá durante uma coletiva de imprensa da qual participarão representantes de associações de vítimas de pedofilia.
"Será uma explosão", declarou, sob anonimato, um integrante da Ciase. "Vai ter o efeito de uma bomba", reiterou Olivier Savignac, do grupo Falar e Reviver, que reuniu os depoimentos das vítimas de abusos sexuais.
Sauvé adiantou que a quantidade de padres e religiosos pedófilos apontada no documento, "entre 2.900 e 3.200", é apenas "uma estimativa mínima". A Ciase também pretende comparar o número de violências sexuais na igreja católica com as denunciadas em outras instituições: no esporte, na escola e nas famílias. Outro objetivo é avaliar "os mecanismos, especialmente os institucionais e culturais" que puderam favorecer a pedocriminalidade.
Segundo os autores do trabalho, as propostas podem ser aplicadas em diversos âmbitos, como no momento de ouvir as vítimas, na prevenção, formação dos religiosos, na transformação da governança da igreja, além da defesa de uma política de reconhecimento e de reparação.
Testemunhos das vítimas
Para elaborar o relatório, a Ciase transformou os testemunhos das vítimas na "matriz de seu trabalho", explicou Sauvé. Primeiro com uma convocação para depoimentos, que permaneceu aberta durante 17 meses e recebeu 6.500 ligações ou contatos de vítimas e parentes. Em seguida, procedeu quase 250 longas audiências ou interrogatórios de investigação. O trabalho também contou com informações colhidas junto a arquivos da igreja, dos Ministérios da Justiça e Interior e da imprensa da França.
Na maioria dos casos, os atos estão prescritos e os autores dos abusos morreram, o que torna improvável um recurso à justiça. Além disso, os procedimentos canônicos, quando ativados, são muito longos e pouco transparentes.
A revelação do relatório "será um teste de verdade e um momento difícil e grave", afirma a mensagem divulgada pelo episcopado aos padres e paróquias antes das missas do fim de semana. O texto faz um apelo "a uma atitude de verdade e compaixão".
A expectativa é grande para saber qual resposta será dada pelas lideranças católicas ao relatório. O episcopado já se antecipou ao prometer um dispositivo de "contribuições" financeiras pagas às vítimas a partir de 2022, algo que não gera unanimidade entre as pessoas que foram alvo destes crimes.
"Espero que consigamos enfrentar este fardo, por pior que seja, para que possamos então adotar as medidas necessárias", afirmou Véronique Margron, presidente da Corref.
A divulgação do relatório será acompanhada de perto pelo Vaticano, onde o tema foi abordado pelo papa Francisco durante uma visita de bispos franceses em setembro à Santa Sé.
(Com informações da AFP)
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