Grupos franco-brasileiros alertam para risco de eleição de Le Pen na França
Nunca a extrema direita esteve tão perto de chegar ao poder na França. Diante desse risco, cresce em grupos franco-brasileiros nas redes sociais alertas contra uma eventual eleição de Marine Le Pen, lembrando o que aconteceu no Brasil de Bolsonaro.
Osegundo turno da eleição presidencial na França acontece no próximo domingo (24). Nesta quarta-feira, um primeiro e único debate opõe os dois candidatos: o presidente Emmanuel Macron, do partido de centrista A República em Marcha (LREM), eMarine Le Pen, líder do partido de extrema direita Reunião Nacional (RN).
A polarização do país é grande. As pesquisas indicam uma vitória apertada de Macron e Le Pen pode derrotar o atual presidente nas urnas. Muitos eleitores, principalmente do partido da esquerda radical A França Insubmissa, de Jean-Luc Mélenchon que ficou em 3° lugar no primeiro turno, pretendem não votar no segundo turno ou até votar na líder da extrema direita. Para eles, não há diferença entre Macron e Le Pen, é como escolher entre a "peste e o cólera", comparam.
"Há sim uma diferença", aponta o sociólogo Glauber Sezerino, colaborador do CRID, Coletivo de Organizações de Solidariedade Internacional e de Mobilização Cidadã, e copresidente da ONG Autres Brésil, que compartilha com os cidadãos franceses nas redes sociais e com os movimentos sociais em seu trabalho "testemunhos de países como o Brasil, Hungria e Filipinas, que têm governos de extrema direita extremamente violentos". Para Glauber Sezerino, a alegoria da peste e do cólera é interessante porque o cólera tem uma taxa de mortalidade de 1% a 2%, enquanto a peste tem uma mortalidade de 30%. Então, há sim uma diferença sim real entre a peste e o cólera".
'Descentralizar o olhar'
O objetivo do sociólogo e das mobilizações dos grupos franco-brasileiros nas redes sociais é "descentralizar" o olhar", sair da bolha franco-francesa e comparar a situação do país com o que acontece em outros lugares. "A situação para nós que somos imigrantes brasileiros aqui na França é um pouco simples porque a gente já vive há quatro anos em contato com um governo de extrema direita (em referência ao governo brasileiro de Jair Bolsonaro). (...) A gente sabe que há uma diferença na prática entre um governo de direita extrema e um governo de extrema direita, onde todos os processos institucionais e todas as instituições democráticas não são respeitadas; onde a perda para a população e para os movimentos sociais é consideravelmente maior e incomparável", salienta.
Em um post no Facebook, o copresidente da ONG Autres Brésil lembrou a posição de militantes do movimento negro brasileiro que em 2018 não esperavam que o governo de Jair Bolsonaro, apesar de fascista e de extrema direita, fosse piorar a situação da violência nas favelas do país. Apenas seis meses depois caíram na real. "Ninguém esperava o grau de barbárie que um governo de extrema direita podia implantar em tão pouco tempo", conta.
Segundo Glauber Sezerino, o balanço do governo Macron é negativo, mas ele não pode ser comparado a extrema direita. "Um governo de Marine Le Pen não pode ser comparado ao que foi o governo de Macron que certo, não foi um bom governo. Ele destruiu direitos sociais, atacou os precários, moradores de bairros populares, os coletes amarelos... Atacou uma série de direitos conquistados, mas continua sendo um governo que respeita minimamente as instituições."
Paralelo entre Marine Le Pen e Bolsonaro
Para o sociólogo, o paralelo entre Marine Le Pen e Jair Bolsonaro é possível em alguns quesitos. Os dois têm vontade de reformar a Constituição, diz Sezerino. "Quando a gente olha o programa da Marine Le Pen, uma série de propostas são contra a Constituição atual. Para impor esse programa ela vai ter de mudar completamente as regras do jogo. Por exemplo, impedir binacionais de trabalhar no serviço público é inconstitucional hoje na França, assim como retirar imigrantes e binacionais de habitações populares". Ele alerta que se implementadas, essas "mudanças estruturais muito profundas serão muito difíceis de reverter".
A diferença apontada por Glauber Sezerino entre o presidente brasileiro e a líder da extrema direita francesa são as boas maneiras de Marine Le Pen. "Ela sabe comer à mesa", tem uma certa etiqueta mínima. Mas seu programa é tão brutal quanto o de Bolsonaro", afirma.
O sociólogo não concorda que esse "antimacronismo" seria semelhante ao "tudo menos o PT" no Brasil. A grande resistência ao voto Macron na França é formada "por setores de esquerda que estão mobilizados nos últimos cinco anos e foram muito atacadas pelo governo". No Brasil, "houve uma campanha contra o governo do PT que inflou a população, mas na eleição de 2018 "todos os setores da esquerda que não eram petistas e que tinham críticas ao PT estavam atrás do Haddad (candidato do PT derrotado) contra o Bolsonaro", relata.
A França vive essa encruzilhada política porque há anos os governos sucessivos tentam recuperar os votos do eleitorado de extrema direita abraçando pautas populistas, como a questão da imigração. "Esse processo de normalização da extrema direita cumpria alguns objetivos eleitorais para a direita institucional que era pegar votos de eleitores que sempre votaram no Jean Marie Le Pen, no pai, e que passaram a votar na Marine Le Pen quando ela assumiu o partido (...) O eleitor, entre votar numa cópia da extrema direita, que seria algumas políticas do Macron, e votar no original da extrema direita que é o Reunião Nacional, vota no RN. É uma aposta que foi feita e não rendeu. É uma aposta feita sobre o futuro da França e que quem paga no final das contas é a população francesa", pontua o sociólogo Glauber Sezerino.
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