Presidente do Senado defende boicote a eventual primeiro-ministro de esquerda na França

O presidente do Senado francês, Gérard Larcher, da direita republicana, disse nesta quinta-feira (11) que se opõe categoricamente à nomeação de um primeiro-ministro da Nova Frente Popular (NFP) de esquerda, vencedora do segundo turno das legislativas, mas sem ter conquistado a maioria absoluta na Assembleia dos Deputados. "Se o presidente da República fizer esta escolha, vou defender que este governo seja derrubado", anunciou Larcher, em entrevista ao canal BFMTV. 

Um primeiro-ministro indicado pela aliança de esquerda, formada por socialistas, ecologistas, comunistas e membros da França Insubmissa (LFI), sigla de esquerda radical, "não corresponde ao desejo profundo dos franceses", argumentou Larcher. O presidente do Senado considera que a NFP chegou em primeiro lugar nas eleições "em um contexto de bloqueio à extrema direita", representada pelo partido Reunião Nacional (RN), de Marine Le Pen, e aliados. Ele justificou sua posição pelo "ódio da França Insubmissa aos policiais franceses" e a proposta de retorno da idade mínima da aposentadoria para 60 anos, contra os 64 anos aprovados na última reforma da Previdência.

O senador, que se recusa a ser primeiro-ministro, mas criticou Emmanuel Macron pela dissolução da Assembleia Nacional, defendeu "mais tempo" para as articulações políticas e a manutenção de Gabriel Attal na chefia do governo por dois meses. "Passemos pelo importante período em que acolhemos o mundo nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos e então, no início de setembro, damos início à fase de estabelecer as consequências destas eleições", ponderou Larcher.

Depois de se reunir na terça-feira com Macron e comunicar ao presidente seu posicionamento, o presidente do Senado ainda disse que é a favor de uma "linha independente" para o seu partido, que já foi rebatizado na Assembleia de 'A Direita Republicana', após o racha que levou parte dos deputados conservadores a aderir ao programa da extrema direita no segundo turno. "Esta linha independente nos dá a possibilidade de propor, votar, apoiar ou censurar, e esse é o papel do Parlamento", afirmou Larcher na entrevista.

O secretário-geral do Partido Socialista, Olivier Faure, denunciou imediatamente o "sectarismo e cinismo" do presidente do Senado, "contrário à volta da esquerda ao poder".

Na quarta-feira (10), Macron atiçou ainda mais os ânimos ao publicar uma carta aos franceses, na qual afirmou que "ninguém ganhou" as legislativas. No texto, ele acrescenta que só "decidirá sobre a nomeação do primeiro-ministro" quando as forças políticas tiverem "construído compromissos", (...) "o que pode levar tempo". 

Negar que a esquerda venceu o segundo turno foi a gota d'água para a líder da bancada da França Insubmissa na Assembleia, Mathilde Panot, declarar que Macron "dá um golpe de força" contra a democracia.

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Rachas e paralisia

Quatro dias depois do anúncio dos resultados das eleições, o cenário político francês continua parasitado por disputas e rachas internos entre as forças republicanas. A esquerda e o bloco macronista afastaram a extrema direita do governo, mas com bancadas muito aquém da maioria de 289 deputados exigida na Assembleia, ambos ficam em situação de vulnerabilidade para governar.

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Deputados da França Insubmissa já anunciaram que tentam formar um grupo independente na Assembleia, por discordar da estratégia do líder Jean-Luc Mélenchon, que fez uma série de expurgos na campanha e não abre mão de emplacar um primeiro-ministro do seu círculo. Entre os macronistas, a maioria defende um acordo com a direita republicana, mas um grupo de deputados da legenda presidencial ameaça debandar para o Partido Socialista, caso o presidente prefira nomear um chefe de governo de direita. 

Os dois campos permanecem irredutíveis na negociação de um programa mínimo de governo, principalmente na área econômica. Constitucionalistas e cientistas políticos têm alertado que qualquer governo minoritário, seja de esquerda ou de centro-direita, ficará sujeito a sucessivas moções de censura.

Por outro lado, conforme a Constituição francesa, o chefe de Estado não tem prazo para nomear um primeiro-ministro. No caso de fracasso na construção de uma coalizão parlamentar, ainda sobra para Macron a cartada de nomear um governo técnico até junho do ano que vem, quando terá os poderes renovados para fazer uma nova dissolução e reconvocar eleições. 

Desde o início dessa crise desastrosa para a França, Macron excluiu uma coalizão parlamentar que considerasse a extrema direita e a esquerda radical. Assessores palacianos lançaram a proposta de um arco-íris parlamentar que fosse de comunistas, socialistas, verdes, passando pelos centristas, a centro-direita até a direita conservadora, mas em um país sem a menor tradição de compromisso, como existe em outros países da Europa. Uma parte dos franceses se entusiasma com essa ideia, mas, na prática, a postura de luta ideológica entre correntes políticas prevalece.

Diante do impasse, a Confederação Geral do Trabalho convocou uma manifestação para 18 de julho, em frente à Assembleia Nacional e sedes administrativas do Estado, "para exigir que os resultados eleitorais sejam respeitados".

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