G-Zero: Quais os 4 países que pedem ajuda para se manter neutros em carbono
Géraud Bosman;Delzons;da RFI em Paris;com colaboração da correspondente em Antananarivo (Madagascar);Pauline Le Troquier;
16/11/2024 13h21Atualizada em 17/11/2024 08h01
Durante a 29ª Conferência da ONU sobre as Mudanças Climáticas (COP29), em Baku, no Azerbaijão, quatro países lançaram uma aliança à qual poucas outras nações do mundo poderiam aderir: a dos países neutros em emissões de carbono ou até com balanço negativo. Butão, Suriname, Panamá e Madagascar. Os membros desta coligação, batizada de G-Zero, pedem para obter um status oficial nas Nações Unidas e recursos para conseguirem se manter nesta privilegiada condição. Madagascar já corre o risco de deixar de ser um país sumidouro de carbono - ou seja, que mais absorve do que emite CO2 e gases equivalentes na atmosfera.
Durante a 29ª Conferência da ONU sobre as Mudanças Climáticas (COP29), em Baku, no Azerbaijão, quatro países lançaram uma aliança à qual poucas outras nações do mundo poderiam aderir: a dos países neutros em emissões de carbono ou até com balanço negativo. Butão, Suriname, Panamá e Madagascar.
Os membros desta coligação, batizada de G-Zero, pedem para obter um status oficial nas Nações Unidas e recursos para conseguirem se manter nesta privilegiada condição. Madagascar já corre o risco de deixar de ser um país sumidouro de carbono - ou seja, que mais absorve do que emite CO2 e gases equivalentes na atmosfera.
Enquanto as maiores potências do planeta - e maiores emissores - negociam um Novo Objetivo Coletivo Quantificado, principal desafio desta COP, o apelo de países pequenos e com pouca influência diplomática, econômica e demográfica chamou atenção. Quando se trata de clima, os últimos da lista muitas vezes são os melhores exemplos.
As Conferências do Clima também servem para que vozes que costumam ser inaudíveis sejam ouvidas, em par de igualdade com outras habituadas a dominar o debate.
A neutralidade de carbono é uma ilustração disso: toca no propósito da conferência, de inverter a curva das emissões de gases com efeito de estufa emitidos pelas atividades humanas, e assim estabilizar o clima na Terra. A dura missão envolve a proteção e o desenvolvimento de sumidouros naturais de carbono, como solos, florestas, manguezais, corais e oceanos, que absorvem mais gases do que emitem.
Muitos países almejam este equilíbrio até 2050. Aqueles que já o fazem hoje, em 2024, alegam que merecem ser reconhecidos por este exemplo.
Continuar neutro "para sempre"
Butão, Panamá, Suriname e Madagascar absorvem mais CO2 do que emitem. Em Baku, juntaram-se para lançar, na terça-feira (12), o seleto clube do G-Zero, cuja presidência será rotativa e o secretariado permanente sediado no Butão.
O objetivo inicial é ser oficialmente reconhecido como um dos Estados-Parte da Convenção do Clima da ONU. Atualmente, não existe uma designação das Nações Unidas para países que são neutros ou negativos em emissões de carbono.
Com este status, poderão ter uma voz diplomática com maior influência e legitimidade para receber remuneração pelos serviços prestados ao planeta.
Segundo dados oficiais, os cerca de 760 mil butaneses e as suas atividades emitiram 3,8 milhões de toneladas de CO2 em 2015, enquanto as suas florestas sequestraram 9,4 milhões de toneladas dos gases poluentes da atmosfera. O reino do Himalaia se autodenomina negativo em carbono desde 2009. Quatro outras nações poderiam reivindicar a mesma situação: Gabão, Comores, Guiana e a ilha de Niue.
"Achamos que tínhamos que unir forças para influenciar o debate público e alertar os parceiros para a importância de manter este status nos nossos quatro países, porque se seguirmos a atual trajetória de crescimento demográfico e industrialização, corremos o risco de perdê-lo", explica Max Andonirina Fontaine, ministro do Meio Ambiente madagascarense. "Há muitos países que têm uma natureza incrível, mas que se tornaram emissores", recorda o chefe da delegação malgaxe em Baku.
Neutralidade de carbono "não é automática"
O objetivo final da neutralidade de carbono é mais fácil de alcançar quando a população é inferior a 5 milhões de habitantes, como no Panamá, e o território é naturalmente coberto por florestas, como o Suriname (90% da sua área) ou o Panamá (68% em 2021, um aumento de 3% em dez anos, segundo os últimos dados oficiais). Além disso, muitas vezes, tratam-se de florestas primárias, que são mais eficientes na captura de carbono.
"Não nos tornamos automaticamente neutros ou negativos em carbono", observou o primeiro-ministro do Butão, Thsering Togbay, à AFP. "Sacrifícios tiveram que ser feitos."
Desde 2008, a Constituição exige pelo menos 60% de cobertura florestal no país, em detrimento do desenvolvimento da agricultura nacional. "Deveríamos derrubar nossas florestas? Devemos explorar nossa terra?", questionou o premiê, que em 2016, afirmou que preservar o meio ambiente fazia parte da identidade butanesa.
O desenvolvimento sustentável é contínuo na política do país há mais de meio século, favorecido por uma tradição cultural e espiritual baseada no respeito e no cuidado da natureza. Foi no país que surgiu o já famoso índice de crescimento não econômico, o FIB, Felicidade Interna Bruta, declarado pelo rei Jigme Sinye Wangchuck em 1972 - ano da publicação do relatório Meadows sobre os limites do planeta Terra, por cientistas do MIT americano.
A ecologia é um dos pilares da FIB, única no mundo e constitucional no país. Para financiar o seu modelo, o reino cobra um pesado imposto sobre o turismo sustentável. Graças aos glaciares que o rodeiam, o pequeno estado asiático tornou-se um gigante na energia hidroelétrica, que é exportada para os seus vizinhos da Índia e do Bangladesh e lhe proporciona uma fonte de renda a longo prazo.
Mas, no futuro, nada é garantido e as mudanças climáticas também podem fazer a sorte virar. O Butão está exposto, pela primeira vez, ao derretimento das enormes massas glaciais do Himalaia, que ameaça transbordar os seus lagos de grande altitude, como já aconteceu. Também sofre com o aumento das temperaturas, as mais elevadas já vistas em altitude, o que suscita receios quanto ao ressurgimento de doenças e pragas. O padrão das monções também poderá se tornar menos previsível e perturbar a agricultura.
Madagascar pode ser o primeiro a sair do clube dos negativos em carbono
Em Madagascar, a pegada de carbono per capita é insignificante, mas as emissões do país estão em alta. A eletrificação da economia é subdesenvolvida e os seus sumidouros naturais de carbono estão enfraquecidos pelas secas e pelo aumento do desmatamento.
Incêndios descontrolados levaram a ilha a perder quase um milhão de hectares de florestas primárias húmidas entre 2001 e 2023, segundo a Global Forest Watch. A área equivale a toda a região de Menabe, no oeste.
"Madagascar é certamente o primeiro a correr o risco de deixar o status de negativo em carbono", teme o ministro Max Andonirina Fontaine. De acordo com as mais recentes metas climáticas do país (NDC de novembro de 2022), a quarta maior ilha do mundo poderá se tornar emissora de gases com efeito de estufa a partir de 2026.
O ministro alerta: "Madagascar não sacrificará o desenvolvimento e o bem-estar da sua população apenas para colocar a causa ambiental em um altar. Sabemos que dependemos dos recursos naturais, sabemos que a nossa biodiversidade é única no mundo, mas a prioridade do governo é, acima de tudo, satisfazer as necessidades básicas da população", salientou. "Então temos desafios, como a eletrificação do país, a educação, a soberania alimentar. Tudo isso deve ser compatível com as ambições ambientais."
O orçamento do Ministério do Ambiente não ultrapassa 1% do orçamento total do Estado. Na África, o desenvolvimento econômico pesa na balança, face às exigências impostas pelo aquecimento para o qual o continente pouco contribuiu.
Na plenária da ONU na terça-feira, G-Zero apelou pelo "aumento do apoio financeiro e técnico da comunidade internacional aos países vulneráveis, "para ajudá-los a mitigar e a se adaptar aos impactos das mudanças do clima".