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Aliado linha-dura de Israel é, sem querer, o melhor amigo do Irã

Thomas Friedman

08/04/2014 00h01

Ocorreu-me o outro dia que o fervoroso bilionário pró-Israel Sheldon Adelson e o líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, na realidade têm muita coisas em comum. Os dois estão tentando destruir Israel. Adelson está fazendo isso por amar Israel demais e Khamenei, por odiar Israel demais. E agora até mesmo o governador de Nova Jersey, Chris Christie, foi arrastado inadvertidamente para o meio de toda essa loucura.

Qual é a lógica disso? Muito simples. Os líderes do Irã querem que Israel seja destruído, apesar de não terem nenhum desejo, a meu ver, de usar uma bomba atômica para levar essa tarefa a cabo. Jogar uma bomba nuclear em Israel exporia os iranianos a retaliações e à morte certa. A real estratégia dos iranianos é mais sutil: fazer todo o possível para garantir que Israel permaneça no “território ocupado”, que é como o Departamento de Estado dos Estados Unidos se refere à Cisjordânia, que foi anexada por Israel durante a guerra de 1967.

Ao apoiar os militantes palestinos dedicados a destruir qualquer processo de paz, Teerã espera manter Israel permanentemente atolado na Cisjordânia – território ocupado onde vivem 2,7 milhões de palestinos –, negando a essa população qualquer soberania e impedindo o surgimento de um estado palestino que possa reconhecer Israel e viver em paz ao lado do estado judeu. Quanto mais Israel se mantiver atolado na Cisjordânia, mais os palestinos e o mundo exigirão uma “solução de um único estado” que daria aos palestinos o direito do voto. Quanto mais Israel resiste, mais isolado o país fica.

O Irã e seu aliado Hamas possuem muitas evidências de que essa estratégia está funcionando: a ocupação da Cisjordânia por Israel, em vigor há 47 anos, levou os israelenses a construírem mais assentamentos no território e, ao fazê-lo, tornarem-se parecidos com o poder colonial mais ativo do planeta hoje em dia. Os 350 mil colonos israelenses que vivem na Cisjordânia reforçam esse ponto de vista ao afirmarem que sua presença no território não tem a ver com a segurança de Israel, mas sim com um projeto de inspiração divina para reunir o povo judeu a sua pátria bíblica.

O resultado dessa estratégia é um movimento que vem crescendo nos campi das universidades e no âmbito das organizações internacionais para isolar e deslegitimar o estado judeu por causa dessa ocupação. Esse “movimento BDS” – composto pelo tripé boicote, desinvestimento e sanções contra Israel – está a ganhando adeptos nos campi norte-americanos, e não apenas entre os não-judeus, mas também em alguns Hillels, os centros judaicos que atuam nos campi de todo o mundo.

O Irã não poderia estar mais feliz com essa situação. Quanto mais Israel se afundar na Cisjordânia, mais o país ficará deslegitimado e isolado. Quanto mais o mundo se concentrar no colonialismo israelense, em vez de pensar sobre o enriquecimento de material nuclear pelo Irã, mais as pessoas clamarão pela implantação de um único estado democrático em toda a Palestina histórica.

E agora o Irã tem um aliado: Sheldon Adelson, o audacioso e imprudente magnata dos cassinos de Las Vegas, que além de tudo é direitista até o último fio de cabelo e extremista pró-Israel. Adelson doou cerca de US$ 100 milhões durante a última campanha presidencial dos EUA para financiar os candidatos republicanos. E Adelson tinha várias prioridades em mente: ele queria que os candidatos republicanos deslegitimassem os palestinos e que evitassem se referir à Cisjordânia como “território ocupado”, além de desejar que os presidenciáveis acabassem com qualquer ideia de que os EUA deveriam pressionar Israel a trocar terras pela paz. Tanto Newt Gingrich quanto Mitt Romney pegaram o dinheiro e seguiram as regras de Sheldon.

Caso você tenha perdido, a Coalizão Judaica Republicana (Republican Jewish Coalition ou RJC), realizou um retiro no final de semana passado em um cassino em Las Vegas que pertence a Adelson. O evento foi apelidado de “Prévia do Sheldon”. Os republicanos fizeram fila para competir pela bênção e pelo dinheiro de Adelson, ou como informou o site Politico, “Adelson convocou (Jeb) Bush e os governadores Chris Christie, de Nova Jersey, John Kasich, de Ohio, e Scott Walker, de Wisconsin, para irem a Las Vegas. ...O novo cenário político influenciado pelas grandes corporações e pelas grandes fortunas – no qual um punhado de doadores podem alterar drasticamente a campanha com apenas um cheque ou dois – explica a ânsia dos atarefados governadores em realizar peregrinações até Las Vegas e a obsessão com a tentativa de adivinhar em que direção Adelson se inclinará em 2016”.

Adelson personifica tudo o que está envenenando Israel e nossa democracia hoje em dia – oligarcas arrogantes que utilizam enormes quantias de dinheiro para tentar dobrar todos os sistemas a sua vontade.

Em seu discurso, Christie referiu-se à Cisjordânia como “território ocupado” – da mesma maneira que qualquer outro líder norte-americano bem informado faria. Isso, segundo o Politico, “provocou resmungos na multidão”. Alguns judeus republicanos explicaram a Christie depois de ele terminar sua fala que o governador havia cometido uma gafe terrível. (Isso devido ao fato de ele ter utilizado a descrição correta para a Cisjordânia, que sempre foi descrita pelo governo dos EUA como território ocupado!). Mas, segundo a recomendação de Adelson, a Cisjordânia deveria ser chamada de “território disputado” ou de “Judéia e Samaria”, que é como os judeus linha dura preferem descrever o território.

Por isso, segundo o Politico, Christie marcou uma reunião às pressas com Adelson para explicar que havia se enganado e que ele é um verdadeiro amigo de Israel. “O governador de Nova Jersey pediu desculpas durante uma reunião privada realizada no escritório veneziano do magnata dos cassinos logo em seguida”, informou o Politico. O site disse que Adelson “aceitou a explicação” e as “prontas desculpas” de Christie.

Leia essa frase mais uma vez e medite sobre ela.

Eu não sei se Israel tem um parceiro palestino para realizar uma retirada segura da Cisjordânia nem se algum dia os israelenses deixarão o território. Mas eu sei uma coisa: se Israel quiser se manter como um estado judeu e democrático, o país deveria estar fazendo tudo ao seu alcance para firmar uma parceria como essa ou agir unilateralmente para deixar os territórios ocupados. Eu tenho certeza de que, quando as informações relacionadas à “Prévia de Adelson” aterrissaram na mesa do líder supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei, em Teerã, um grande sorriso iluminou seu rosto e ele disse a seus assessores: “que Deus conceda a Sheldon uma vida longa. Tudo está indo conforme o planejado”.