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Reinaldo Azevedo

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Reforma tributária tem de levar em conta pleito de governadores do Sul e SE

Eduardo Leite, Ratinho Jr, Tarcísio de Freitas, Renato Casagrande e Eduardo Riedel durante entrevista coletiva, depois de encontro com parlamentares para debater a reforma tributária - Rafa Neddermeyer/Agência Brasil
Eduardo Leite, Ratinho Jr, Tarcísio de Freitas, Renato Casagrande e Eduardo Riedel durante entrevista coletiva, depois de encontro com parlamentares para debater a reforma tributária Imagem: Rafa Neddermeyer/Agência Brasil

Colunista do UOL

05/07/2023 06h02

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A reforma tributária tramita por intermédio de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição), e isso significa que são necessários, pelo menos, 308 votos na Câmara e 49 no Senado em duas votações em cada Casa. Não seria uma tarefa corriqueira, ainda que o governo tivesse uma base gigantesca na Câmara, e nós sabemos que não tem. Arthur Lira (PP-AL), presidente da Casa, está sinceramente empenhado em aprovar o texto. Ele abraçou essa causa. "Ah, então está tudo resolvido; afinal, ele comanda o Centrão"... Não é bem assim. A reforma tributária mexe também com o imposto que garante a governança dos chefes dos Executivos estaduais: o ICMS — e a questão tem sido um dos entraves. Já volto ao ponto.

De resto, o Centrão não tem 308 deputados, ainda que fosse esse o corte relevante para o caso. Não é. Muitos outros interesses se encontram e se confrontam. Há os políticos — os governadores, por exemplo — e há os econômicos, dos vários setores representados no Congresso. O agronegócio e os serviços têm seus pleitos e reclamações; sempre é preciso lidar com lobbies organizados reivindicando exceções tributárias. É por isso que a reforma tributária sempre foi aquela defendida por todos e querida por ninguém. De gambiarra em gambiarra, chegou-se a uma notável desordem.

Até que, desta vez, reconheça-se, houve um avanço considerável. Mas ainda se está longe da aprovação. Depois da Câmara, há o Senado, onde as postulações organizadas dos Estados estarão ainda mais claras.

Um dos pilares da reforma tributária é a substituição de cinco impostos por dois: a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) juntaria IPI PIS e Cofins, que são federais, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) reuniria o ISS (municipal) e o ICMS, que é estadual.

Não é segredo para ninguém que governadores usam o ICMS para atrair empresas. Cobram-se alíquotas menores sob o pretexto de gerar empregos e atrair cadeias produtivas. É a tal guerra fiscal, que faz mal ao país. Também os prefeitos usam o ISS sob tal pretexto; há verdadeiros paraísos fiscais municipais.

O IBS põe fim à guerra fiscal, mas também diminui o poder que têm os governadores de fazer políticas de incentivo para atrair investimentos. E por que, ainda assim, só Ronaldo Caiado (União Brasil), de Goiás, se opõe à reforma? Há uma barafunda fiscal no Brasil que efetivamente prejudica a economia e o desenvolvimento. Note-se ainda: a cobrança dos impostos, segundo o texto, se dará no destino, não mais da origem. Historicamente, os Estados mais desenvolvidos se opunham à mudança. Essa reserva hoje foi superada em razão de múltiplos fatores, que não vêm ao caso agora.

UM ESTADO, UM VOTO?
Os governadores do Sul e do Sudeste reuniram-se ontem com Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), o relator da PEC, e levaram seus pleitos, tendo à frente Tarcísio de Freitas, de São Paulo (Republicanos)

Topam perder, vamos dizer, a autonomia sobre o ICMS, mas quem vai gerir a distribuição de recursos e arbitrar sobre eventuais impasses? Segundo o texto, será o Conselho Federativo, formado por representantes dos Estados e do Distrito Federal. Há temores aí. Tarcísio, por exemplo, gostaria que os Estados tivessem uma representação proporcional à população. Sabe que isso jamais acontecerá. Mas os chefes dos Executivos dessas duas regiões também não contestam o critério "um Estado, um voto".

Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do Sul, vocalizou uma das preocupações. Num colegiado de 27 Estados, os 16 do Norte e do Nordeste, por exemplo, poderiam formar uma maioria de 16 votos e impor sucessivas derrotas aos outros 11. Uma das ideias é fazer com que esse órgão também leve em conta o voto — ou que nome tenha; não se tem o modelo — das Regiões. No caso em tela, 11 governadores representariam três regiões.

O FUNDO E OS POBRES
Outra demanda diz respeito ao Fundo de Desenvolvimento Regional. Ele vai compensar os Estados por eventuais perdas de arrecadação na fase de implementação da reforma: começaria com R$ 8,25 bilhões em 2025 e cresceria até R$ 40 bilhões em 2033. Esses recursos federais seriam distribuídos segundo qual critério?

No texto da reforma, receberiam proporcionalmente mais os Estados mais pobres, com um PIB menor. Tarcísio lidera a pressão para que se usem também critérios que levem em conta a população. Uma de suas sugestões é que o Cadastro Únicos dos assistidos por programas sociais seja um dos itens.

Uma coisa e outra, noto, não são reivindicações desarrazoadas. Parece-me correto que se considere que, afinal de contas, pobres não são exatamente os Estados, mas pessoas que neles moram. E aí os números podem ser surpreentes para alguns.

Em maio, no recorte por unidades da Federação do Bolsa Família, São Paulo é o Estado com o maior número de famílias assistidas: 2,579 milhões, seguido pela Bahia, com 2,572 milhões. Outros seis reúnem mais de um milhão delas: Rio (1,82 milhão), Pernambuco (1,67 milhão), Minas Gerais (1,62 milhão), Ceará (1,49 milhão), Pará (1,35 milhão) e Maranhão (1,23 milhão).

Em relação ao total da população, obviamente, São Paulo, está longe da dianteira. Convenham: concedem-se benefícios a pessoas e famílias, não a percentuais. Há um número absurdo de pobres também em Estados ditos "ricos". É bem verdade que um Fundo de Desenvolvimento Regional não é um programa de renda. Mas não é menos verdade que investimentos dessa natureza buscam combater a pobreza, que é o substantivo abstrato de que padecem os pobres — um substantivo concreto.

É pouco provável que o pleito dos governadores do Sul e Sudeste seja plenamente atendido na PEC (caso esta prospere).. Mas, parece-me, as questões que propõem não podem ser ignoradas se é reforma tributária o que se quer. Deve haver um meio do caminho.