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Moradores se organizam para questionar ação de reintegração em São José dos Campos

Guilherme Balza

Em São José dos Campos (SP)

25/01/2012 08h25Atualizada em 25/01/2012 08h38

Lideranças dos moradores de Pinheirinho, em São José dos Campos (97 km de São Paulo), se reúnem na manhã desta quarta-feira (25) para conceder uma entrevista coletiva sobre a atual situação das famílias desalojadas pela ação de reintegração de posse realizada pela Polícia Militar no último domingo (22).


Em nota, os organizadores afirmam que questionarão a operação policial considerada violenta e as ações judiciais e políticas que devem ser tomadas “com relação à violação de direitos humanos ocorridas na operação de desocupação”.

Na próxima sexta-feira (27), as lideranças afirmam que vão se reunir, em Brasília, com representantes dos governos federal, estadual e municipal para discutir a reintegração.

O coronel da Polícia Militar Manoel Messias Mello, que comandou a operação de reintegração, diz não ter presenciado ou ter recebido informações de casos de violência e abuso. “Usamos armas não letais. Fizemos o necessário para conter a pressão”, afirmou. O policial disse que foi empregado elevado número de PMS na ação (2.000) para diminuir a possibilidade de confronto. “Quando se põe muita gente é para desestimular um confronto forte. É uma medida preventiva. Sabemos que isso foi perfeitamente favorável.”

A polícia usou bombas de gás lacrimogênio e balas de borracha contra os moradores que resistiram em sair. A operação foi criticada por parlamentares, como o senador Eduardo Suplicy (PT) e o deputado federal Ivan Valente, do PSOL, que viram abuso de autoridade e excesso de violência por parte da PM.
O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), defendeu a ação policial, mas disse na segunda-feira (23) que possíveis abusos serão avaliados. "[Abuso] Sempre é avaliado. A operação foi acompanhada por um juiz de direito, filmada e documentada. Mas a polícia tem de cumprir ordem judicial", afirmou.

Supostos desaparecidos

Na noite de ontem, em assembleia, os moradores criaram uma comissão para procurar sete pessoas que estariam desaparecidas desde a operação.

Um dos presentes, o servidor público Antonio Carlos dos Santos, 63, afirma não ter notícias da irmã e de três sobrinhos desde a desocupação. Ele deixou o município de Caçapava e foi até São José dos Campos atrás dos familiares, mas diz que não os encontrou nos abrigos onde estão as famílias. “Estou desesperado. Já faltei no trabalho dois dias para procura-los, mas não os acho."

A polícia não confirma que haja desaparecidos após a operação. Segundo balanço oficial, cerca de 20 pessoas ficaram feridas e não houve registro de mortos.

A assembleia foi realizada na igreja católica do bairro Campo dos Alemães, vizinho à comunidade. O local está servindo de abrigo para centenas de desabrigados que se recusaram a ir para um dos três alojamentos em escolas públicas que foram oferecidos pela prefeitura.

Na igreja, as famílias não estão recebendo qualquer assistência do governo municipal, diferentemente dos outros abrigos. Os moradores receberam roupas, colchões e alimentação doados por sindicatos, ONGs e pela própria igreja. Na mesma assembleia, os moradores decidiram deixar o local nesta quarta e ir para outro local, provavelmente um dos abrigos da prefeitura.

Segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), havia cerca de 6.000 moradores no Pinheirinho, mas menos de 3.000 foram cadastradas pela prefeitura de São José dos Campos. Na assembleia, as lideranças da associação de moradores fizeram um apelo para que as famílias não cadastradas procurem a prefeitura para receberem o auxílio-aluguel.

Com 1,3 milhão de metros quadrados, a área que abrigava a comunidade pertencia à massa falida da Selecta, do investidor Naji Nahas. O terreno havia sido ocupado há oito anos pelas famílias e foi desocupado por decisão do Tribunal de Justiça do Estado.


Defensoria entra com ação

A Defensoria Púbica de São Paulo em São José dos Campos ajuizou nesta terça-feira (24) uma ação civil pública pedindo à Justiça que determine à prefeitura local e ao Estado o acolhimento emergencial da população removida da comunidade Pinheirinho.

Na ação, a defensoria pede abrigos com boas condições de higiene, três refeições diárias, transporte escolar, medicamentos e equipe médica, além da concessão imediata de auxílio-moradia para todos os desabrigados e inclusão deles em programas de habitação social. Em caso de descumprimento, a ação pede a aplicação de multa diária de R$ 1 mil por morador desatendido.

“Os moradores do bairro foram encaminhados para abrigos improvisados em igrejas e prédios públicos da região. Defensores públicos acompanham a situação desde o último domingo e constaram a falta de estrutura dos equipamentos, com pessoas abrigadas de maneira precária em quadras poliesportivas próximas a viveiros de pombos e fezes de animais”, informou, em nota, a defensoria.

Segundo o defensor público Jairo Salvador, as pessoas estão "amontoadas" em abrigos e igrejas da região, sem acesso a condições de higiene e comida. “Vimos 800 pessoas em uma escola que dispõe de apenas um banheiro com duas privadas entupidas e dois chuveiros. Além disso, em grande parte do tempo o imóvel fica sem água”.

A defensoria pede ainda atendimento psicológico para as pessoas desabrigadas, em especial, as crianças. A ação foi ajuizada e distribuída à 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca de São José dos Campos.

Em nota divulgada ontem, o governo municipal disse que concluiu o cadastramento das famílias e que um grupo de moradores foi direcionado pelas lideranças do movimento a procurar abrigo em uma igreja do bairro ao invés dos locais organizados pela prefeitura. "As lideranças do movimento não aceitaram os locais oferecidos pela Prefeitura e exigiram que essas pessoas fossem acomodadas na creche do Campo dos Alemães. A secretaria de Educação do município avaliou que não será possível deixar 800 crianças da zona sul da cidade sem creche, já que as aulas serão retomadas no dia 6 de fevereiro", alega a prefeitura.

"Em mais uma tentativa de acolher as famílias que estão precariamente abrigadas na Igreja, a Prefeitura ofereceu mais uma opção, montando toda a estrutura necessária no ginásio do Jardim Morumbi, onde as pessoas poderão contar com colchões e cobertores limpos, três refeições por dia, leite para as crianças, além de assistência médica e social. A Prefeitura aguarda uma posição do movimento, que libere a transferência dessas famílias, para que possam ser atendidas e acolhidas dignamente", finaliza.

Aluguel

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), anunciou na tarde de ontem que as famílias retiradas do Pinheirinho receberão até R$ 500 mensais para que aluguem casas, até que as moradias populares previstas pelo governo sejam construídas.

A Prefeitura de São José dos Campos será a responsável por repassar os recursos aos moradores.

(Com Agência Brasil)