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"Se soubesse que era tão bom adotar, não teria feito tratamentos", conta mãe

Janete Nalini (à dir.) adotou Gabriela aos 8 meses - Arquivo pessoal
Janete Nalini (à dir.) adotou Gabriela aos 8 meses Imagem: Arquivo pessoal

Bárbara Paludeti

Do UOL, em São Paulo

25/05/2013 06h00

"Fiz vários tratamentos, gastei dinheiro e tomei muito hormônio, tive um problema sério no útero por causa disso. Hoje, estou realizada e se soubesse que era tão maravilhoso adotar, não teria feito fertilização e passado por tudo que passei”, esse é o relato de Maria Nascimento, jornalista, que optou por adotar Luísa* quando não conseguiu engravidar, motivo muito comum entre mulheres que optam pela adoção.

Dados do CNA (Cadastro Nacional da Adoção), ferramenta criada pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça) em 2008 para centralizar e diminuir a distância entre aqueles aptos à adoção e os pretendentes, mostram que dos 29.440 cadastrados à espera de uma criança ou adolescente, 22.243 não têm filhos biológicos contra 7.197 que têm.

Mas não foi por dificuldades para engravidar que Maria Inês Rupolo Bezerra, 55, professora, resolveu adotar Cássia há cerca de 24 anos, que tornou-se sua quarta filha. “Eu tive três filhos, todos homens, não queria enfrentar uma quarta gravidez, mas a gente queria ter uma filha e então optamos pela adoção. Na época, eu estava trabalhando em um orfanato e apareceu a minha filha. Tive aquele vínculo, aquela afeição e aí a gente entrou com o processo de adoção”, conta a mãe, que diz que o processo levou cerca de um ano até ser concretizado.

Após 12 anos de casamento e ainda sem filhos, Janete Razera Nalini, 54, coordenadora pedagógica, e seu marido, também optaram pela adoção. “Foi tudo bem rápido, preenchemos os papéis no fórum e em poucos meses a Gabriela já estava conosco”, conta. “Nós fomos conhecer o orfanato, conhecemos as crianças, e meu marido se identificou demais com a Gabriela, foi à primeira vista”.

Adaptação

Se há o senso comum de que uma criança adotada pode dar mais trabalho do que um filho biológico, essas mães provam que isso não é verdade. Gabriela chegou à casa de Janete com oito meses --hoje já tem 20 anos-- e, segundo a mãe, a adaptação foi maravilhosa. “A primeira coisa que fiz quando pegamos a Gabi foi passar na casa da minha mãe para a família conhecê-la, e ela foi muito bem recebida por todos. Quando cheguei em casa, fui mostrando todos os cômodos, afinal, ela estava em um ambiente estranho. Em nenhum momento ela chorou”, afirma.

  • A identificação entre Gabriela Nalini e seu pai, Altamir, foi à primeira vista ainda no abrigo

Sobre Luísa, que chegou na vida de Maria Nascimento com sete meses --ela ainda é bebê, tem menos de dois anos--, a mãe conta que “parece que ela esteve sempre ali”. “Ela nunca chorou com a gente, não estranhou nem eu, nem meu marido. E quando chegou em casa ficou super bem. Ela era quietinha no começo, mas comeu, dormiu e brincou. Era como se ela sempre estivesse ali. Foi muito natural, simples, não sei explicar, mas foi muito tranquilo”.

Cássia, que chegou na casa de Maria Inês com um ano e dois meses, sentiu falta dos irmãos que moravam com ela no abrigo. “Ela sentiu falta no começo, teve dificuldades. Através do César, que é meu filho mais novo [tinha cerca de seis anos na época], é que ela foi pegando confiança, aceitando as coisas, depois de um tempo já ficou completamente adaptada”.

Conselhos

Segundo dados do cadastro, há 5.426 crianças e adolescentes aptos à adoção e 29.440 pessoas à espera de um filho, ou seja, um número 5,4 vezes maior. A conta não fecha porque os pretendentes exigem um perfil que pouco existe na lista de espera da adoção.

A maioria dos aptos a serem adotados são crianças maiores de sete anos (4.700) e negras e pardas (3.599), por outro lado, 32% dos pretendentes somente aceitam adotar crianças brancas e uma minoria adotaria crianças maiores de seis anos. A adoção de crianças fora do perfil comumente aceito --meninas, recém-nascidas e de pele branca-- é chamada de “adoção necessária”.

A insegurança na hora de tomar a decisão de adotar um filho é normal, já que juridicamente não há diferenças entre um filho biológico e um adotado, e no quesito amor de mãe, parece que também não. “Adotar um filho é a mesma coisa que ter um filho, não é porque o filho não foi gerado na sua barriga que ele vai deixar de ser filho. A diferença é que quando você adota, escolheu e está sendo escolhido”, conta Maria Inês, mãe de quatro filhos, um deles adotado.

Mesmo que a mãe adotiva não tenha tido a emoção de gerar uma criança, o amor e a preocupação maternos são iguais. “Na adoção, é um amor que vai crescendo, você sente até doer o coração, é uma coisa até mágica. Passado algum tempo, você até esquece que trata-se de uma adoção. É tudo filho, é a mesma coisa”, afirma Janete.

“Meu conselho é adotem, é muito bom. Quando a gente adota a alegria é em dobro, porque a gente fica feliz e vê um serzinho inocente muito feliz também, o que nos dá a certeza de ter feito a coisa certa. Hoje eu acredito que se Deus permite que algumas mães não queiram os seus filhos é justamente porque outras não podem tê-los”, aconselha Maria Nascimento.

Mas é claro que há processos longos e dolorosos, dependendo do perfil desejado pelo pretendente, a espera pela adoção pode durar até dez anos. “A mensagem que eu passo é que a adoção não é tão fácil quanto possa parecer, a pessoa que vai dar esse passo tem que conhecer bem, saber bem como acontece, e ter muita convicção de que é isso mesmo que quer. Você não vai adotar uma criança se não der aquele ‘click’, não tiver uma empatia. E como também você não vai conseguir se a criança não tiver empatia por você. É difícil explicar, você sente”, resume Maria Inês.

*Para preservá-la, mudamos o nome de Luísa porque ela ainda está em processo de adoção, sob guarda provisória

Passo a passo para a adoção