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Auxiliar de limpeza é morto a tiros dois dias após discutir com policiais em Santos (SP)

Rafael Motta

Do UOL, em Santos (SP)

08/08/2013 10h10

O assassinato de um auxiliar de limpeza terceirizado que trabalhava na unidade central da Unifesp (Universidade Federal Paulista) em Santos (72 km de São Paulo), no último dia 2, causa desconfiança a estudantes da instituição.

Alunos da universidade relatam que, dois dias antes de sua morte, a vítima foi abordada por policiais militares e agredida fisicamente. O DHPP (Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, da Polícia Civil) apura o homicídio.

Por volta das 14h20 do último dia 31 de julho, policiais militares interpelaram Ricardo Ferreira Gama, 30, durante apuração de uma denúncia de tráfico de drogas. Gama estava no intervalo do serviço e, segundo o DCE (Diretório Central dos Estudantes da Unifesp), respondeu “a uma ofensa” e “foi agredido pela polícia” diante do prédio da universidade.

À 1h30 do último dia 2, o auxiliar de limpeza foi morto diante da casa onde morava, a três quadras do edifício da universidade, com oito tiros. Testemunhas disseram que os disparos foram feitos por quatro homens encapuzados, que fugiram em duas motos e um carro.

Investigação preliminar feita pelo comando da PM em Santos informa que os policiais participantes da abordagem a Gama, no dia 31, “estavam em outros locais no momento do homicídio”.

Os resultados dessa apuração interna foram enviados à Polícia Civil, segundo informou o capitão Samuel Robes Loureiro, em nota. Segundo a SSP (Secretaria de Estado da Segurança Pública), o assassinato também está sob apuração do 4º DP (Distrito Policial) de Santos.

Suposta agressão

Após a operação policial do dia 31, estudantes foram ao 4º DP, onde receberam a informação de que PMs e Gama haviam ido ao Pronto-Socorro vizinho à Santa Casa de Santos, no Jabaquara –conforme o diretório, para tratar dos ferimentos decorrentes da abordagem. Gama não registrou BO (boletim de ocorrência) contra os policiais.

“Confirmou-se que o Sr. Ricardo Gama possuía antecedentes criminais por envolver-se com o tráfico de entorpecentes, mas já havia cumprido a pena. (…) Não foi registrado qualquer tipo de queixa contra os policiais, pois o delegado de plantão não vislumbrou indícios de arbitrariedades ou de abuso de autoridade na abordagem ou na condução do suspeito para o DP”, menciona o comando da PM na Baixada Santista.

O capitão Loureiro também destaca que, “face a esta constatação [da existência de antecedentes], os policiais anunciaram que iriam conduzir o sr. Ricardo até o 4º DP para uma pesquisa mais detalhada sobre a situação criminal dele. O suspeito debateu-se até a chegada do […] chefe dele no serviço de limpeza da Unifesp. […] Não foi algemado e sempre esteve acompanhado [do chefe da limpeza]”.

O DCE cita que, na noite do dia 1º, “viaturas com homens não fardados, de cabeça para fora, rondavam a Unifesp. Pessoas também chegaram a ir à Unifesp [para] pedir, a funcionários, vídeos que estudantes teriam feito da agressão, e disseram que, se eles não entregassem, 'seria pior'”.

Ameaças e providências

Uma mulher que conversou com Ricardo Gama na Unifesp por volta das 20h daquele dia declarou ao UOL, sob condição de anonimato, ter perguntado ao auxiliar de limpeza se pretendia prestar queixa contra os policiais. “Ele me respondeu: 'Não, não vou fazer nada. Já avisei 'pra' polícia [que não registraria BO], eles sabem'. À 1h30, ele foi assassinado”.

Segundo outra pessoa, que mora em bairro distante da Unifesp, estudantes que presenciaram a agressão e filmaram a abordagem policial com telefones celulares não querem divulgar os vídeos e deixaram de usar redes sociais na internet para se comunicar. “Abriguei um deles em minha casa de um dia para o outro, pois ele está assustado”.

Sobre a morte de Gama, a reitoria da Unifesp emitiu nota para informar que assiste a família de Ricardo Gama, “desde o velório e o sepultamento” dele, por meio de serviços de atendimento a vítimas de violência.

“A direção do campus está em diálogo com a Corregedoria da Polícia Militar de Santos para discutir o caso”, e a reitoria “está em contato com o secretário de Segurança Pública do Estado de São Paulo, Fernando Grella Vieira, e com o prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), com o objetivo de discutir o assassinato do funcionário e também os problemas de segurança da região”.

O DCE (Diretório Central dos Estudantes da Unifesp) informou que pretende organizar um protesto diante do campus, no bairro Vila Mathias, às 17h desta sexta-feira (9).