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Promoção de juíza que manteve menina de 15 anos em cela com 30 homens é revogada

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió

07/10/2013 09h42

O TJ-PA (Tribunal de Justiça do Pará) revogou a promoção por merecimento da juíza Clarice Maria de Andrade, que em 2007 foi responsável pela decisão de manter uma adolescente de 15 anos presa em cela masculina com cerca de 30 homens, na delegacia de polícia de Abaetetuba, no interior do Pará.

Após a revogação, na quinta-feira (3), a juíza entregou um pedido de licença das funções.

Nesta segunda-feira (7), o Diário Eletrônico trouxe uma portaria confirmando o afastamento da juíza de suas funções da 6ª Vara Penal da Comarca de Ananindeua, na região metropolitana de Belém. Até o seu retorno, o juiz Breno Melo da Costa Braga será seu substituto.

Andrade tinha sido escolhida para ser titular da Vara de Crimes contra Crianças e Adolescentes de Belém, na última quarta-feira (2).

Revogação

Segundo o TJ-PA, a nomeação à Vara de Crimes Contra Criança e Adolescente foi revogada por conta de processo administrativo disciplinar movido pelo CNJ (Conselho Nacional de Justiça), em 2009, e que decidiu pela aposentadoria compulsoriamente, em decisão unânime em abril de 2010.

Entenda o caso

Na decisão de sua aposentadoria compulsória, o CNJ alegou que a juíza foi condenada por ter se omitido em relação à prisão da menor, que sofreu torturas e abusos sexuais no período em que ficou presa irregularmente, em 2007.

A jovem de 15 anos foi detida por tentativa de furto, crime classificado como afiançável.

O CNJ entendeu que a juíza conhecia a situação da prisão --já que havia visitado o local três dias antes--, verificando a inexistência de separação entre homens e mulheres e as péssimas condições de higiene.

O conselheiro do processo, Felipe Locke Cavalcanti, disse ainda que a juíza nada fez para que adolescente fosse retirada da cela. A juíza também foi acusada de ter adulterado um ofício encaminhado à Corregedoria-Geral do Estado, que pedia a transferência da adolescente, após ter sido oficiada pela delegacia de polícia sobre o risco que a menor corria.

Em entrevista ao portal de notícias da AMB (Associação de Magistrados do Brasil), no último mês de junho, a juíza disse que foi vítima de uma injustiça.

"Fui afastada de uma forma violenta. Fui praticamente arrancada do cargo. Foi uma coisa que mexeu com toda a família. Fiquei doente, enfrentei um câncer e meu marido perdeu o emprego. Mas graças a Deus, temos um Deus poderoso e retomamos nossa vida", afirmou.

Segundo a AMB --que apoiou o retorno da juíza às suas atividades--, qualquer violação aos direitos no caso "foi de inteira responsabilidade da polícia, e nunca da juíza".

A Amepa (Associação de Magistrados do Pará) recorreu da decisão e conseguiu, em agosto de 2012, no STF (Supremo Tribunal Federal), anular a decisão do CNJ.

Segundo consulta ao sistema processual do CNJ, o processo contra a juíza já consta a decisão do STF está pronto para despacho final desde o dia 1º de outubro.

O TJ-PA explicou que a magistrada havia sido escolhida por ser a mais apta entre os 13 inscritos na concorrência para o cargo.

Os critérios de escolha seriam definidos objetivamente pelo CNJ, como desempenho, produtividade e aperfeiçoamento técnico.

A decisão de suspender a nomeação antes mesmo de pedido que a OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) no Pará iria fazer em reunião nesta segunda-feira.

"Ela é uma pessoa simbólica de algo que foi marcante por uma grave violação dos direitos humanos", disse a presidente da comissão de Direitos Humanos da entidade, Luanna Tomaz de Souza.

O UOL tentou localizar a juíza, mas não conseguiu. Para a Amepa, a Clarice não foi responsável pelo caso, mas, sim, "vítima da falência do sistema prisional brasileiro, que ela mesma já havia denunciado e requerido providências as autoridades competentes".

"[Ela] demonstrou a mais completa entrega a sua função de magistrada, em tudo dignificando a magistratura paraense", afirmou a instituição, em nota de apoio à magistrada, logo após decisão do CNJ.