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Número de crianças e jovens assassinados duplicou desde a criação do ECA

Criança observa cartaz com fotos de jovens vítimas de violência na periferia de São Paulo - Dário Oliveira - 15.mai.2015/Código 19/Estadão Conteúdo
Criança observa cartaz com fotos de jovens vítimas de violência na periferia de São Paulo Imagem: Dário Oliveira - 15.mai.2015/Código 19/Estadão Conteúdo

Carlos Madeiro

Do UOL, em Maceió*

13/07/2015 11h30Atualizada em 13/07/2015 14h31

O número de homicídios de crianças e adolescentes mais que dobrou desde 1990 quando o Estatuto da Criança e do Adolescente foi sancionado no dia 13 de julho, segundo relatório divulgado nesta segunda-feira (13) pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) para a comemoração de 25 anos do estatuto.

O relatório cita que, em termos absolutos, o número de homicídios de jovens até 19 anos dobrou entre 1990 e 2013 --passando de 5.000 para 10,5 mil casos por ano, conforme dados mais recentes do Datasus. Para o Unicef, existe hoje um cenário “perturbador” e que coloca o país como o segundo com maior número de assassinatos entre jovens até 19 anos –atrás apenas da Nigéria.

No mesmo período, a população de jovens até 19 anos caiu 1,1% --de 66,3 milhões, em 1990, para 65,7 milhões, em 2013, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas).

“Cerca de 42 mil adolescentes brasileiros poderão ser assassinados entre 2013 e 2019 se as condições atuais do país prevalecerem”, afirma o texto. Segundo o documento, o Brasil não tem conseguido impedir o “alarmante crescimento de assassinatos de seus adolescentes”.

Entre os jovens que morrem por causas externas, 36,5% são assassinados. “Na população total, esse percentual é de 4,8%”. O Mapa da Violência 2015 já havia revelado que os homicídios são a principal causa de morte de jovens entre 16 e 17 anos. 

Negros pobres são principais vítimas

“O crescimento do número de homicídios de adolescentes é a mais trágica das violações de direitos que afetam crianças e adolescentes. As vítimas têm cor, classe social e endereço. São em sua maioria meninos negros, pobres, que vivem nas periferias e áreas metropolitanas das grandes cidades”, diz o texto.

Os dados mais recentes mostram que, em 2013, a taxa de homicídio entre adolescentes negros é quase quatro vezes maior do que aquela entre os brancos --36,9 a cada 100 mil habitantes, contra 9,6 entre os brancos. "O fato de ser homem multiplica o risco de ser vítima de homicídio em quase 12 vezes."

“O fenômeno dos homicídios de adolescentes tem múltiplas causas. Entre elas, estão aspectos ligados à raça, ao gênero e à classe social dos adolescentes. As mortes dos adolescentes negros são muitas vezes justificadas, de forma equivocada, pelos conflitos entre facções rivais e pelo tráfico de drogas”, relata o relatório da Unicef.

“Além disso, na maior parte dos casos, não se conhecem os autores desses crimes, porque falta investigação, o que gera um ciclo de impunidade que alimenta uma onda crescente de violência”, complementa Gary Stahl, representante do Unicef no Brasil.

Elogios aos avanços

Apesar das duras críticas à matança juvenil, o documento também faz uma série de elogios ao Brasil em outras áreas. Na saúde, por exemplo, cita que a mortalidade infantil caiu 68,4% desde 1990.

O Brasil também se tornou "referência internacional no combate à exploração do trabalho infantil”. Entre 1992 e 2013, o número de crianças e adolescentes de cinco a 15 anos trabalhando no país caiu de 5,4 milhões para 1,3 milhão.

Na educação, diz que o Brasil “avançou em todos os indicadores”. Entre 1990 e 2013, o percentual de crianças com idade escolar obrigatória fora da escola caiu 64%, passando de 19,6% para 7%. Mesmo assim, mais de 3 milhões de crianças e adolescentes ainda estão fora da escola.

No mesmo período, o percentual de crianças registradas no mesmo ano de nascimento subiu de 66% para 95% graças à garantia de gratuidade do documento prevista no ECA.

Durante entrevista coletiva em Brasília para comentar o relatório, o representante do Unicef no Brasil, Gary Stahl, disse é preciso não confundir a discussão sobre a redução da maioridade penal e as conquistas do ECA. “O Brasil está vivendo uma situação de violência muito séria como mostra esse relatório. O ECA trata tudo desde a gestação da criança na barriga da mãe. Não podemos confundir todo o bem que ele tem feito e o ambiente geral no Brasil”, afirmou.

A adolescente e militante dos direitos de jovens e adolescentes negros Aíla Oliveira Santana, 17, questionou a efetividade dos avanços conquistados pelo ECA nos últimos 25 anos. “Tivemos avanço no que diz respeito à redução da mortalidade infantil, mas de que adianta as crianças estarem aí tendo todo o acesso se na juventude as vidas delas serão ceifadas? Se elas não vão poder usufruir de uma vida plena?”, questionou. De acordo com o Unicef, o Brasil é o segundo país em número de homicídios de jovens até 19 anos, atrás apenas da Nigéria.

(*Colaborou Leandro Prazeres, em Brasília)