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Brasil registra 58,5 mil assassinatos em 2014, maior número em 7 anos

Wellington Ramalhoso

Do UOL, em São Paulo

08/10/2015 02h00

O número de pessoas mortas de forma violenta e intencional chegou a 58.559 no Brasil em 2014, de acordo com dados do 9º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. É a marca mais alta em sete anos e representa 160 assassinatos por dia, quase sete por hora. Houve um aumento de 4,8% em relação ao recorde anterior, registrado em 2013, quando 55.878 pessoas foram assassinadas no país.

A taxa nacional de mortos por cem mil habitantes ficou em 28,9 em 2014, também a marca mais alta em sete anos. O crescimento em relação ao índice de 27,8 verificado em 2013 foi de 3,9%.

“O Brasil ostenta taxas tão altas há tantos anos que se pode falar em uma violência endêmica, e não epidêmica. É um problema grave e crônico. Nós concentramos 2,8% da população do mundo e 11% dos homicídios. Somos um país extremamente violento”, afirma a socióloga Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, organização responsável pela elaboração do anuário.

O primeiro anuário compilou dados de 2005, mas, por questões metodológicas, o Fórum informa que os dados mais antigos comparáveis aos mais recentes são os de 2008.

O estudo de 2015, que traz os recordes da série, leva em consideração os homicídios dolosos (quando há intenção de matar), os latrocínios, as lesões corporais seguidas de morte, os policiais mortos e as vítimas de violência policial de 2014.

O Fórum requisitou os dados aos governos estaduais e do Distrito Federal com base na Lei de Acesso à Informação e cruzou as estatísticas com dados disponibilizados pelos governos em suas páginas na internet.

Os homicídios dolosos representam 89% das mortes violentas intencionais do ano passado. As mortes decorrentes de intervenção policial equivalem a 5% do total e superam os latrocínios (4%), as lesões corporais seguidas de morte (1%) e a quantidade de policiais mortos (1%).

As capitais permanecem com uma grande proporção nos índices de violência, mas o peso delas em relação ao total de crimes letais intencionais cometidos no país caiu de 29,2% em 2013 para 28,4% em 2014. 

Estados nordestinos são os mais violentos

A violência cresceu na maioria das unidades federativas. Alagoas permanece como o Estado mais violento mesmo apresentando uma redução de 3,5% em relação a 2013. A taxa alagoana ficou em 66,5 mortes violentas intencionais por cem mil habitantes.

Como no ano retrasado, quatro dos cinco Estados mais violentos são do Nordeste. O Ceará, cuja capital, Fortaleza, é a mais violenta do país, se mantém na segunda posição, com um índice de 50,8, um aumento de 0,6% na comparação com 2013.

No Rio Grande do Norte, que permanece como o terceiro mais violento, a taxa subiu 3,9% e saltou para 50 mortes por cem mil. O Sergipe passou de quinto para quarto por causa da alta de 12,8% que elevou o índice para 48,9.

Também são nordestinos os Estados que apresentaram as maiores altas de violência em 2014. No Piauí, o crescimento foi de 32,4%. No Maranhão, a taxa subiu 20,6%.

Segundo Samira Bueno, o aumento nas taxas em Estados como Maranhão e Piauí se deve à melhora dos registros criminais por parte dos governos. Antes, diz ela, a subnotificação dos casos era maior. “Os dados hoje correspondem mais à realidade do que há alguns anos”.

A diretora do Fórum afirma que a expansão econômica do Nordeste não foi capaz de diminuir a violência. “Num país desigual como o Brasil, o crescimento econômico não resolve a forma como a população administra conflitos”. Além disso, governos nordestinos, acrescenta a socióloga, contam com uma estrutura mais frágil do que os do Sudeste na área da segurança pública.

Norte e Centro-Oeste

O Pará é o primeiro Estado de fora do Nordeste na classificação nacional: aparece em quinto lugar. A taxa paraense subiu 1% e chegou a 44,8 mortes por cem mil habitantes. No Norte, o índice de Roraima é o mais baixo (14,7), mas o Fórum atribui a redução de 33% do índice ao fato de o governo roraimense não ter divulgado parte dos dados.

O Goiás permanece como o Estado mais violento do Centro-Oeste, com um índice de 42,9, o sexto maior do país. A alta de 20,1% fez o Mato Grosso pular de décimo para sétimo mais violento do país, com taxa de 42,6.

Sudeste e Sul

O Espírito Santo é o mais violento do Sudeste e o oitavo do Brasil, com índice de 42,2. A taxa de 34,7 do Rio de Janeiro é a 13ª do país. Minas Gerais e São Paulo estão entre os menos violentos. A taxa mineira, de 19,7, é quarta mais baixa.

O índice paulista, de 12,7, é o menor do país, mesmo com um crescimento de 1,7%. Samira Bueno frisa que o crescimento em São Paulo está vinculado ao aumento da violência policial. As mortes provocadas por intervenções policiais no Estado cresceram 57% em 2014.

Os três Estados do Sul estão entre os dez menos violentos. A taxa de 13,8 mortes por cem mil habitantes de Santa Catarina é a segunda mais baixa do Brasil. No entanto, os índices catarinense e do Rio Grande Sul tiveram altas expressivas: 10,3% e 21,1%, respectivamente.

Medo e solução

Samira Bueno ressalta que as polícias não dão conta sozinhas do problema da violência. “O Brasil tem um desafio imenso pela frente para garantir segurança e justiça para a população. A gente precisa de uma aliança dos governos e do Judiciário e tornar o combate ao crime contra a vida uma prioridade. A violência é a questão que mais mobiliza [a sociedade brasileira]. A população vive com medo. Segundo pesquisa Datafolha divulgada em julho, 52% afirmaram que tiveram um parente ou conhecido assassinado”.

A diretora do Fórum avalia como positivas experiências que levaram à redução dos índices de violência em Estados como Pernambuco, Espírito Santo e Rio de Janeiro, mas afirma que boas políticas de determinadas gestões precisam ser institucionalizadas como políticas de governo para que não aconteçam retrocessos. “A gente não precisa inventar a roda. Temos políticas de sucesso de enfrentamento da violência letal. Existe a dificuldade em institucionalizar as ações. Na medida em que as lideranças [no Poder Executivo] mudam, muitas vezes essas políticas revelam que não estão tão maduras”.