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Rio tem maior número de mortos pela polícia em 15 anos

Márcia Foletto/Agência O Globo
Imagem: Márcia Foletto/Agência O Globo

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

28/02/2018 19h26Atualizada em 28/02/2018 22h37

Ao menos 154 pessoas foram mortas pelas polícias no Estado do Rio de Janeiro em janeiro deste ano, segundo dados do ISP (Instituto de Segurança Pública) divulgados nesta quarta-feira (28). O número é o maior registrado em um mês no período de 15 anos.

O intervalo considera a série histórica do ISP para o indicador, que teve início em janeiro de 2003. No mês passado, o número de mortes por agentes das polícias Militar e Civil aumentou 57% em relação a janeiro de 2017.

Até então, os meses com mais mortes pelas polícias foram abril e maio de 2008, ambos com 147 casos, período pré-UPP (Unidade de Polícia Pacificadora).

Em janeiro, 12 PMs foram mortos no Estado (cinco deles em serviço), segundo informações da Polícia Militar.

As mortes provocadas pela polícia fluminense representam cerca de 24% do total das 649 mortes violentas registradas no Estado no mesmo período.

Consultada no fim da tarde desta quarta sobre a letalidade policial, a Secretaria de Segurança informou que precisaria de mais tempo para se manifestar adequadamente sobre a situação. Em janeiro, a pasta informou que uma das metas do governo era diminuir em 20% o indicador em 2018.

O fato de a polícia ter autorização para usar a força letal não significa que eles tenham carta branca para decidir quem morre e quem vive nas periferias das grandes cidades Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum de Segurança Pública

"O que vemos no Rio e em São Paulo são as polícias fazendo uso da força com frequência, o que indica que há abusos”, diz Samira.

Apesar da intervenção federal na segurança ter tido início na metade de fevereiro, o Rio conta com reforço das Forças Armadas desde julho. Nos primeiros seis meses, a presença dos militares teve pouco impacto sobre os indicadores de violência no Estado, conforme levantamento realizado pelo UOL.

Para a organização Human Rights Watch, que lançou em julho o relatório "O Bom Policial Tem Medo: Os Custos da Violência Policial no Rio de Janeiro", a alta letalidade policial endossa "o entendimento das autoridades de que execuções extrajudiciais são bastante comuns" no Estado.

"O número de mortos por ação policial é muito maior do que o número de baixas na polícia, fazendo com que seja difícil acreditar que todas estas mortes ocorreram em situações em que a polícia estava sendo atacada", diz o relatório.

Para cada policial assassinado no Rio de Janeiro em serviço em 2017, outras 36 pessoas morreram em decorrência de intervenções policiais.

Outros índices

Além das mortes por policiais, veja abaixo outros tipos de ocorrências que tiveram aumento entre janeiro de 2017 e janeiro de 2018 segundo o ISP:

  • Roubo de aparelho celular: de 1.137 casos 2.053, aumento de 80,6%
  • Roubo a estabelecimento comercial: de 334 casos para 596, aumento de 78,4%
  • Estelionato: de 1.727 casos para 2.815, aumento de 63,0%
  • Roubo a transeunte: de 5.133 casos para 7.829, aumento de 52,5%
  • Total de roubos: de 14.221 casos para 20.939, aumento de 47,2%
  • Extorsão: de 84 casos para 121, aumento de 44,0%
  • Roubo de carga: de 693 casos para 977, aumento de 41,0%

Apenas quatro modalidades de crimes registraram quedas:

  • Latrocínio (roubo seguido de morte): de 25 casos para 20, queda de 20%
  • Furto de veículos: de 1.357 casos para 1.264, queda de 6,9%
  • Encontro de cadáver: de 45 casos para 44, queda de 2,2%
  • Homicídio doloso: de 479 casos para 469, queda de 2,1%

O ISP observou, porém, que por causa de uma greve iniciada pela Polícia Civil em 20 de janeiro de 2017, os números divulgados referentes àquele mês podem estar abaixo dos índices reais. Segundo o Instituto, apenas letalidade por policiais e roubos de veículos continuaram sendo notificados durante o período de paralisação.

Escalada de violência

O Rio de Janeiro passa por uma grave crise política e econômica, com reflexos diretos na segurança pública. Desde junho de 2016, o Estado está em situação de calamidade pública.

Policiais trabalham com armamento obsoleto e sem combustível para o carro das corporações. Faltam equipamentos como coletes e munição. As metas do Gabinete de Intervenção Federal são recompor o efetivo e aumentar o número de veículos para uso policial. Para isso, os militares querem tentar melhorar a gestão administrativa, financeira e a área de planejamento dos órgãos policiais.

A falta de estrutura atinge em cheio a tropa policial e torna os agentes vítimas da criminalidade --foram 134 policiais mortos no ano passado.

O Estado também aparece em último lugar no país quando se trata de investimentos em informação e inteligência policial.

Com a escalada nos índices de violência, o presidente Michel Temer (MDB) decretou logo após o Carnaval a intervenção federal na segurança pública do Estado, medida que conta com o apoio do governador Luiz Fernando Pezão, também do MDB.

Temer nomeou como interventor o general do Exército Walter Braga Netto. Ele, na prática, é o chefe das forças de segurança do Estado, como se acumulasse sob seu comando a Secretaria da Segurança e a de Administração Penitenciária, com PM, Civil, bombeiros e agentes carcerários.

Apesar da escalada de violência no Rio, que atingiu uma taxa de mortes violentas de 40 por 100 mil habitantes no ano passado, há outros Estados com patamares ainda piores. O Rio aparece em 10º lugar no país, atrás de Sergipe, Rio Grande do Norte, Alagoas, Pará, Amapá, Pernambuco, Bahia, Goiás e Ceará.

Os dados têm como base a taxa de mortes violentas por 100 mil habitantes em 2016 compilada pelo Anuário do Fórum de Segurança Pública, divulgados em outubro. Enquanto o Rio apresentou 37,6 casos por 100 mil, o Sergipe, em primeiro na lista, registrou 64 casos.