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Análise: Lições do Iraque pesam na decisão de Obama de manter tropas no Afeganistão

Jacquelyn Martin/AP
Imagem: Jacquelyn Martin/AP

Peter Baker

Em Washington (EUA)

16/10/2015 06h00

Ao descrever os fatores que pesaram em sua decisão de manter tropas americanas no Afeganistão, a única palavra que o presidente Barack Obama não mencionou foi Iraque.

Há quatro anos, ele manteve seu plano de retirada do Iraque, apenas para ver o país recair no conflito sectário e em uma nova guerra contra extremistas islâmicos. Diante de uma situação semelhante no Afeganistão, Obama optou por não seguir um caminho semelhante.

Pode ser debatido se a manutenção de uma força americana residual no Iraque teria feito alguma diferença, mas o presidente decidiu não correr o risco desta vez. Ao reverter seu plano de retirada do Afeganistão até o final do ano que vem, Obama abandonou seu legado desejado de encerrar as duas guerras que herdou, na esperança de evitar uma repetição do colapso no Iraque.

Apesar de não ter abertamente extraído qualquer lição da retirada no Iraque, Obama tentou traçar uma distinção implícita ao enfatizar que o novo governo afegão do presidente Ashraf Ghani, diferente do governo em Bagdá em 2011, ainda apoia a presença militar americana e adotou medidas legais para possibilitá-la.

“No governo afegão, temos um parceiro sério que deseja a nossa ajuda”, disse Obama em sua declaração televisionada. “E a maioria do povo afegão compartilha nossas metas. Nós temos um acordo bilateral de segurança para guiar nossa cooperação.”

Lisa Monaco, sua conselheira de contraterrorismo e segurança interna, tratou posteriormente da cooperação durante uma teleconferência com repórteres. “A diferença com 2011 é clara”, ela disse. “O governo afegão pediu a nossa permanência, nos convidou a ficar e deseja trabalhar conosco”, ela disse.

No Iraque, o governo Obama e o governo de Nouri al-Maliki, o então primeiro-ministro, negociaram a possibilidade de manutenção de milhares de tropas americanas ali após 2011, mas ficaram atolados em uma disputa em torno de um acordo que limitava a responsabilidade legal das forças americanas. No final, ambos os lados desistiram e decidiram se ater ao cronograma original de retirada de 2011, acertado entre o presidente George W. Bush e Al-Maliki no final de 2008.

Obama então saiu em campanha pela reeleição se gabando da retirada de todas as tropas do Iraque. Mas sem a presença americana, Al-Maliki se tornou cada vez mais sectário, reprimindo os sunitas e se alinhando com o Irã, o que parece ter encorajado a ascensão do Estado Islâmico.

De lá para cá, Obama enviou de volta cerca de 3.000 tropas americanas para ajudar a orientar e auxiliar a luta do novo governo iraquiano contra o Estado Islâmico.

Igualmente, apesar dos anos de combate no Afeganistão e um aumento temporário do número de tropas no início da presidência de Obama, o Taleban se recuperou, como ressaltado pela breve tomada da cidade de Kunduz, e o Estado Islâmico também começou a fazer incursões.

Obama deixou claro que detesta empregar as Forças Armadas americanas no Oriente Médio, especialmente tropas terrestres, por considera-la uma proposta perdedora que custa vidas americanas, sem consertar os problemas sendo tratados. E ele repetiu na quinta-feira que se opõe a uma “guerra sem fim”.

Mas o Afeganistão ainda é visto como mais diretamente ligado aos interesses americanos do que o Iraque e a Síria, já que foi a base de onde a Al Qaeda planejou seu ataque aos Estados Unidos em 11 de setembro de 2001. E Obama não deseja passar ao seu sucessor uma situação desgastante no Afeganistão, além da atual turbulência na Síria e no Iraque.

A presença de 9.800 tropas americanas no ano que vem e então 5.500 depois disso –em comparação a mais de 100 mil em seu pico– pode fazer apenas uma diferença modesta militarmente. Mas Obama está apostando que importa politicamente mostrar que os Estados Unidos não estão desistindo do governo em Cabul e deixando um vácuo para outras forças preencherem.

“Nós fizemos um investimento enorme em um Afeganistão estável”, disse Obama. “Os afegãos estão conseguindo progresso com dificuldade, mas genuíno. Esse extensão modesta, mas significativa, de nossa presença –mantendo nossas atuais missões restritas– pode fazer uma diferença real. É a coisa certa a ser feita.”