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Casas que produzem energia e não poluem são destaque em competição verde na Europa

Maria Denise Galvani

Do UOL, em São Paulo

03/10/2012 13h28

Você pode achar difícil levar uma vida sustentável, mas há pelo menos 20 boas maneiras de se viver numa casa construída com materiais renováveis, que funcione 100% à base de energia solar e que devolva ao meio ambiente quase nenhum dos resíduos produzido por seus habitantes.

Equipes de estudantes e pesquisadores da Europa, da Ásia e do Brasil projetaram e ergueram residências com essas características durante a Solar Decathlon Europe, uma competição internacional em Madri com o objetivo de estimular o interesse do público e a inovação no mercado de residências sustentáveis. As casas ficaram abertas para visitação do público na “Vila Solar”, na capital espanhola, durante o mês de setembro.

“É interessante ver como cada time dá uma resposta diferente para problemas similares”, diz Bruna Mayer de Souza, coordenadora de comunicação do time brasileiro na Solar Decathlon Europe. 

A equipe vencedora, anunciada no final do mês passado, foi a da universidade de Rhône Alpes, na França, que montou na Vila Solar uma casa que corresponde a dois andares de um prédio sustentável. O projeto é uma proposta de vida comum em grandes centros urbanos: um prédio com apartamentos individuais e áreas comuns funcionais,como estufas, depósitos e uma laje. A casa brasileira ficou na 14ª colocação.

Autossuficiência energética e tecnologias inteligentes

O pré-requisito para as casas da competição é a autossuficiência energética, a partir de painéis fotovoltaicos que produzem energia solar. Investindo na matriz da energia solar, a competição estimula o desenvolvimento de uma tecnologia limpa e que pode ser usada em qualquer lugar do mundo.

“A grande vantagem dessa tecnologia é gerar energia junto ao  ponto de consumo e evitar a transmissão e a distribuição”, esclarece a equipe brasileira, que prevê a entrada dos painéis com força no mercado brasileiro em breve, depois que o setor passar por regulamentação. A orientadora acadêmica Claudia Terezinha e outros membros da equipe que foram representar o time brasileiro responderam a perguntas do UOL por e-mail.

As casas do Solar Decathlon também buscaram materiais que geram pouco impacto na natureza e poupam gastos com aquecimento ou resfriamento do ambiente. Do ponto de vista arquitetônico, os projetos também buscam otimizar o equilíbrio térmico da casa e valorizar a praticidade, fazendo uso de espaços modulares que podem ser adicionados ou removidos de acordo com a necessidade dos moradores.

Os 20 projetos foram avaliados em 10 quesitos diferentes, como design, construção, condições de conforto, inovação e viabilidade de mercado. As casas também passaram por inspeções para verificar as exigências básicas da competição, como a autossuficiência energética e o funcionamento de eletrodomésticos básicos.

Mercado

Uma série de soluções tecnológicas aplicadas nas casas sustentáveis do Solar Decathlon podem ser replicadas em escala de mercado. “Diversos sistemas poderiam ser facilmente implementados nas casas brasileiras, como tubos que utilizam a luz do sol para o aquecimento de água e o banheiro seco compostável, uma tecnologia simples e que permite uma enorme economia de água potável”, destaca a equipe.

Sistemas de captação e aproveitamento da água da chuva e o tratamento da água usada no chuveiro, por exemplo, por meio de filtros naturais (zona de raízes ou wetlands) também reduzem a demanda por água potável no dia a dia da casa. “Diversos desses sistemas, além de contribuírem para uma habitação mais sustentável, diminuem bastante o custo de infraestrutura. O banheiro seco e o tratamento de águas cinzas por zona de raízes eliminam, por exemplo, a necessidade da rede de esgoto”, segundo a equipe brasileira.

Participação brasileira, inspiração indígena

A casa apresentada pelo Brasil foi batizada com nome tupi-guarani – Ekó, que quer dizer “maneira de viver”. A inspiração, segundo a equipe brasileira, é a integração do modo de viver dos índios com os ciclos da natureza. “Queríamos reinterpretar o modo de viver indígena e brasileiro em uma casa para moradores de hoje”, diz Souza.

A Ekó House é um projeto de casa modular com estrutura de madeira e cabos de aço, desenhada para o aproveitamento de um espaço interno amplo. Varandas “inteligentes” abrem e fecham de acordo com as condições do tempo no exterior da casa e a vontade dos moradores. Painéis fotovoltaicos no telhado são capazes de produzir até três vezes a quantidade de energia que a casa consome.

Um grupo de estudantes, arquitetos e engenheiros ligados a universidades brasileiras começaram ainda em 2008 a  estudar uma participação brasileira no Solar Decathlon Europe, competição aberta a equipes de todo o mundo, cuja primeira edição foi em 2010. Desde a fase inicial, cerca de 200 profissionais colaboraram com o projeto da casa sustentável brasileira.

Para a edição de 2012, o Brasil consolidou uma equipe coordenada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e Universidade de São Paulo (USP). Cientistas de outras quatro universidades também participaram. “Passamos por uma seleção com outras faculdades do mundo inteiro, concorrendo também com equipes norte-americanas e por fim, fomos selecionados”, conta Tarsila Miyazato, responsável financeira pelo projeto.

O patrocínio da Ekó House veio sobretudo da Eletrobrás e agências de fomento acadêmico. O projeto também contou com o apoio multinacionais que investem em soluções tecnológicas sustentáveis. “A casa brasileira se destaca por ser uma proposta mais focada em sustentabilidade social, projetada para um ambiente diferente das demais”, esclarece a equipe.

A proposta dos pesquisadores é implantar a Ekó House em áreas que já são habitadas há muito tempo e onde o meio-ambiente é frágil: “A ideia é que a Ekó House poderia servir de hotel para turistas nessas regiões, dividir o excedente de sua energia e o tratamento de águas cinzas com a comunidade local, além de prover uma fonte de renda para a comunidade.”