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Governo mudou contratos de pedágio para favorecer empresas, diz MPF do PR

Osny Tavares

DO UOL, em Curitiba

27/03/2014 18h00Atualizada em 27/03/2014 18h45

Investigação em curso do MPF (Ministério Público Federal) aponta que os contratos de concessão de rodovias federais no Paraná foram alterados de forma unilateral pelo governo do Estado, sem publicação em Diário Oficial ou comunicação ao governo federal. A maioria dos “atos secretos”, como se refere o relatório do MPF, serviu para modificar as obrigações das concessionárias.

O órgão aponta casos em que a alteração contratual eximiu as empresas de realizar serviços de manutenção e expansão das rodovias, substituindo-os por obras de preço e impacto menor, autorizou reajustes no pedágio ou diminuição da tarifa em troca de cancelamento de obras.

“As alterações no Programa de Exploração das Rodovias Federais vêm produzindo efeitos concretos irreversíveis, sobretudo quanto aos aspectos econômico-financeiros, pois eximes as concessionárias de obras, autorizam o aumento de degraus tarifários, alteram os cronogramas de execução, substituem umas obras por outras, alterando o fluxo de caixa da concessão”, diz um trecho do documento. Um força-tarefa foi montada em 2013 para analisar os contratos, aditivos e outros documentos referentes à concessão.

As primeiras mudanças foram feitas por meio de aditivos contratuais em 2000 e 2002. Instado pelo MPF, o DER (Departamento de Estadas de Rodagem) do Paraná justificou que se tratava de compensação por perdas que as concessionárias tiveram entre 1998 e 1999, quando uma decisão unilateral do governo do Estado ordenou a redução de 50% das tarifas de pedágio.

As concessões de rodovias federais entraram em vigor no Paraná em 1998, durante o governo Jaime Lerner (sem partido). Segundo os termos originais dos contratos, qualquer alteração deveria ser comunicada ao Ministério dos Transportes. O MPF apurou que, além da falta divulgação, o DER não realizou qualquer estudo para calcular o impacto econômico das mudanças implementadas.

Em seguida, foram realizados atos administrativos "secretos" a partir de 2003, início do governo de Roberto Requião (PMDB), válidos até hoje.

Em um dos casos, o consórcio Econorte, administrador da BR-369 --que liga o norte do Paraná a São Paulo--, recebeu concessões adicionais de estradas estaduais por meio de aditivos contratuais, passando de 245 km para 350 km sob sua administração.

Os procuradores questionam o alto preço do pedágio neste trecho. Segundo o documento, o usuário paga R$ 13,10 para rodar 100 km em trecho sem duplicação. A mesma empresa, compara o MPF, administra trecho de extensão semelhante em Minas Gerais e cobra R$ 2,85, além da obrigação em fazer a duplicação da pista.

Outra mudança no contrato permitiu que a Viapar, que administra outro trecho da BR-369, trocasse obras do Contorno Norte de Maringá por outras obras de acesso à cidade, uma delas um acesso elevado até um shopping.

Doação de campanha

O MPF também levantou as doações de campanha feitas pelas concessionárias de serviço público, que são proibidas por lei, além de doações de empresas vinculadas ao sistema de pedágio e de pessoas físicas relacionadas ao setor. Nas eleições de 2010, o então candidato ao governo Beto Richa (PSDB) recebeu o total de R$ 2 milhões. Gleisi Hoffmann (PT), que disputava o Senado, recebeu R$ 1,3 milhão.

Roberto Requião (PMDB), governador que terminava o mandato e também postulava uma cadeira no Senado, recebeu doação de R$ 15 mil, e Gustavo Fruet, então candidato a senador pelo PSDB, R$ 140 mil. A lista também inclui doações a candidatos a deputado estadual.

Outro lado

Em nota, o DER-PR refutou o teor das investigações. “O Departamento de Estradas de Rodagem do Paraná desconhece a existência de qualquer “ato secreto” na negociação dos contratos de pedágio”, diz o texto. “O processo de negociação conduzido pela atual administração é transparente e obedece as diretrizes determinadas pelo Tribunal de Contas da União, sem que se desrespeite as cláusulas estabelecidas no contrato de concessão, firmado em 1997, na gestão do então governador Jaime Lerner.”

A Associação Brasileira de Concessionária de Rodovias - Regional Paraná e Santa Catarina, que representa as empresas citadas na investigação, também afirma inexistir atos secretos ou ilegais na gestão do pedágio no Paraná.

A entidade disse, em nota, que o contrato de concessão pode ser alterado por acordo entre as partes.  “O  acréscimo  ou supressão de obras devem ser objeto de ajustes entre o DER e a concessionária. Assim,  não  é  obrigatória  para  todos  os  casos  de  alteração  de  obras  a formação de um Termo Aditivo com a participação da União”, aponta o texto.

A assessoria de imprensa do governador do Paraná, Beto Richa, afirmou que todos os valores foram apresentados na prestação de contas da campanha e aprovados pela Justiça Eleitoral, e que o governador rechaça qualquer insinuação de irregularidade ou ilegalidade.

A assessoria de Gleisi Hoffmann emitiu nota dizendo que a senadora “não recebeu nenhuma doação de concessionárias de pedágio em nenhuma das eleições disputadas, razão pela qual, inclusive, suas prestações de contas sempre foram integralmente aprovadas pela Justiça Eleitoral”. E informou que “se houve doações de empresas que eventualmente tenham participação acionária em concessionárias de pedágio, é importante esclarecer que estas contribuições são regulares”.

A reportagem também contatou a assessoria do prefeito de Curitiba, Gustavo Fruet, e do senador Roberto Requião, mas não obteve retorno ao longo desta quinta-feira (27).