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Impeachment de Dilma: O que defesa e acusação disseram à comissão do Senado

A presidente afastada Dilma Rousseff no Palácio do Alvorada - Marlene Bergamo - 26.mai.2016/Folhapress
A presidente afastada Dilma Rousseff no Palácio do Alvorada Imagem: Marlene Bergamo - 26.mai.2016/Folhapress

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

04/07/2016 06h00Atualizada em 05/07/2016 12h11

Foram 45 testemunhas, 73 ofícios de órgãos públicos, um laudo de perícia de 223 páginas. Após analisar todo esse material, a comissão especial que analisa o impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, no Senado encerra a fase de investigações, nesta semana, com a missão de responder se Dilma cometeu crimes de responsabilidade que justifiquem sua deposição do cargo.

É a Lei do Impeachment que prevê os crimes de responsabilidade, tipo de infração política que pode levar à deposição da presidente.

A previsão é de que o relator Antonio Anastasia (PSDB-MG) apresente seu parecer no dia 2 de agosto, com a conclusão sobre se há indícios de irregularidades e se o Senado deveria votar a cassação do mandato de Dilma. Na próxima quarta-feira (6), está marcado o depoimento da presidente Dilma, mas ela pode decidir não comparecer ou ser representada por seu advogado, José Eduardo Cardozo, ex-ministro da Justiça.

O que diz a denúncia?

A denúncia do impeachment acusa a presidente por duas práticas: a de ter editado decretos que ampliaram a previsão de gastos do Orçamento sem autorização do Congresso, quando havia dificuldade de atingir a meta fiscal, e pelas chamadas pedaladas fiscais no Plano Safra, programa federal de financiamento agrícola executado pelo Banco do Brasil.

A meta fiscal é o valor, previsto em lei, da economia nos gastos que o governo deve fazer num ano para poder pagar juros da dívida pública.

"Pedaladas fiscais" é o termo pelo qual ficou conhecido o atraso nos repasses do governo a bancos públicos, o que foi entendido pelo TCU (Tribunal de Contas da União) como uma forma proibida de empréstimo dos bancos ao governo.

Em meio a constantes bate-bocas entre senadores, veja abaixo quais foram os principais argumentos técnicos da defesa e da acusação usados na comissão do Senado:

Dilma é responsável pelas pedaladas?

Dilma Plano Safra - Alan Marques - 4.mai.2016/Folhapress - Alan Marques - 4.mai.2016/Folhapress
Comissão discutiu se pagamentos do Plano Safra são de responsabilidade do Ministério da Fazenda ou de Dilma
Imagem: Alan Marques - 4.mai.2016/Folhapress

ARGUMENTO DA DEFESA: A perícia realizada por técnicos do Senado não encontrou nenhum ato administrativo de Dilma na gestão dos pagamentos ao Banco do Brasil pelo Plano Safra.

O advogado de defesa, José Eduardo Cardozo, afirma que, como não há ato da presidente na gestão, ela não poderia perder o mandato por causa das pedaladas.

Os pagamentos do Plano Safra são de responsabilidade do Ministério da Fazenda, administrados por portarias publicadas pelo ministro da pasta, segundo informou o Banco do Brasil em ofício à comissão.

ARGUMENTOS DA ACUSAÇÃO: O procurador junto ao TCU Júlio Marcelo de Oliveira, em depoimento à comissão, afirmou que a presidente afastada tem responsabilidade sobre as pedaladas fiscais de 2015, pois responde como chefe do Executivo pela gestão fiscal do país. "Em relação aos débitos bilionários do Banco do Brasil, é obrigação da presidente ter consciência disso", afirmou. "Nós não podemos construir a teoria da irresponsabilidade da presidente, em que o Tesouro fica devendo bilhões aos bancos federais e o presidente da República se declara inconsciente", disse o procurador.

Pedalar é crime?

ARGUMENTOS DA DEFESA: Segundo Cardozo, o atraso nos repasses, juridicamente, é um caso de inadimplência e não pode ser comparado a um empréstimo.

Banco do Brasil também afirmou ao Senado que as pedaladas não são um tipo de empréstimo, em parecer da instituição financeira enviado à comissão. 

O argumento também foi defendido pelo o ex-secretário de Política de Investimento e ex-secretário adjunto da Casa Civil Gilson Alceu Bittencourt, em depoimento à comissão. Ele também disse que não havia prazo legal para a quitação do atraso do governo federal ao BB.

ARGUMENTOS DA ACUSAÇÃO: O parecer do relator Antonio Anastasia (PSDB-MG), que aceitou a abertura do processo no Senado, afirma que as pedaladas podem ser classificadas como um crime previsto na Lei do Impeachment, que proíbe “efetuar operação de crédito sem autorização legal”.

Cardozo na comissão do impeachment - Adriano Machado - 29.jun.2016/Reuters - Adriano Machado - 29.jun.2016/Reuters
José Eduardo Cardozo defendeu que "não há delito" nas pedaladas
Imagem: Adriano Machado - 29.jun.2016/Reuters

Além disso, senadores que defendem o impeachment afirmam que a prática "mascarou” as contas públicas. Ao deixar de pagar os bancos, o governo mantinha o dinheiro livre para outros gastos públicos. Mas a falta de transparência nas contas, acusam esses senadores, seria um fator que desestabiliza a economia, piorando indicadores como inflação e desemprego.

perícia de técnicos do Senado também concordou com o argumento do TCU de que os atrasos nos repasses ao banco são, na prática, um tipo proibido de empréstimo ao governo. 

O laudo da perícia apontou que, em 31 dezembro de 2014, o governo devia R$ 10,9 bilhões ao Banco do Brasil e, em 31 de dezembro de 2015, R$ 3,38 bilhões. Todos os valores devidos em 2015 foram pagos naquele ano e custaram ao governo, em atualização monetária pelos atrasos, R$ 1,13 bilhão.

Após o julgamento final da questão pelo TCU, em outubro de 2015, o governo pagou as parcelas em atraso. Os pagamentos foram efetuados até dezembro.

Qual a responsabilidade de Dilma nos decretos?

Dilma assina - comissão - Roberto Stuckert Filho - 18.mar.2015/Presidência da República - Roberto Stuckert Filho - 18.mar.2015/Presidência da República
A assinatura de Dilma Rousseff está presente nos decretos? Defesa e acusação divergem
Imagem: Roberto Stuckert Filho - 18.mar.2015/Presidência da República

ARGUMENTOS DA DEFESA: Os quatro decretos de crédito ao Orçamento alvos do processo de impeachment receberam parecer favorável da consultoria jurídica do Ministério do Planejamento. Os técnicos do ministério avaliaram que a abertura dos créditos ao Orçamento estava “em conformidade” com as exigências legais e chegam a citar o artigo 4º da Lei Orçamentária de 2015.

Os pareceres foram encaminhados à comissão do impeachment e analisados pela perícia, que apontou que “não houve, portanto, na requisição dos decretos editados, apontamento de incompatibilidade da meta fiscal”.

A defesa afirma ainda que a presidente não pode ser responsabilizada pelos decretos porque eles tiveram o aval de técnicos do governo que avaliaram sua adequação à meta fiscal.

ARGUMENTOS DA ACUSAÇÃO: A acusação afirma que Dilma é diretamente responsável pelos atos, já que apenas o presidente da República pode assinar decretos de crédito suplementar.

A perícia do Senado também afirma que “não há controvérsia” sobre a participação de Dilma na edição dos decretos.

Os decretos vão contra a meta fiscal?

Dilma publicou em julho e agosto de 2015 decretos de suplementação ao Orçamento sem a autorização do Congresso Nacional. Esses decretos permitem a ampliação de gastos em programas específicos de governo.

A autorização seria necessária, segundo a denúncia do impeachment, por que naquele momento o governo não estava conseguindo cumprir a meta fiscal, que é a economia que o governo deve fazer para conseguir pagar juros da dívida pública.

Um crédito orçamentário equivale a uma autorização para que um gasto seja realizado, mas não torna obrigatória a realização da despesa. Por exemplo, o governo pode ampliar o orçamento para a compra de ambulâncias, mas não adquirir nenhum veículo como forma de controlar os gastos.

A principal controvérsia no processo de impeachment é sobre a interpretação do artigo 4º da Lei Orçamentária de 2015 que permite a abertura desse tipo de crédito. A lei permite os decretos desde que “as alterações promovidas na programação orçamentária sejam compatíveis com a obtenção da meta de resultado primário”, diz o texto.

ARGUMENTOS DA DEFESA: A defesa da presidente diz que não há impacto na meta fiscal, pois esta é controlada por meio dos pagamentos de fato realizados pelo governo e não por meio das autorizações de despesa.

A denúncia do impeachment diz que o impacto dos decretos nas contas seria de R$ 2,5 bilhões, mas perícia realizada por técnicos do Senado apontou um valor menor, de R$ 1,75 bilhão.

ARGUMENTOS DA ACUSAÇÃO: Quem defende o impeachment diz que, se no momento do decreto não houver saldo positivo nas contas do governo, a ampliação do Orçamento só pode ser feita por meio de lei aprovada pelo Congresso.

O secretário de macroavaliação governamental do TCU, Leonardo Albernaz, afirmou à comissão que o governo não poderia ter editado os decretos. “O que nós temos muito claro é que foi avaliado pelo próprio governo que a meta não estava em cumprimento”, disse. 

Descumprir a meta fiscal é crime?

ARGUMENTOS DA DEFESA: Senadores aliados a Dilma e sua defesa dizem que a punição com a perda do mandato seria desproporcional aos fatos pelos quais a presidente é acusada.

A defesa afirma que mesmo que os decretos tenham impacto negativo nas contas do governo, descumprir a meta fiscal não é considerado crime de responsabilidade.

Ao rever a meta fiscal de 2015, deputados e senadores autorizaram o governo Dilma a fechar o ano passado com um rombo de R$ 119,9 bilhões nas contas públicas.

ARGUMENTOS DA ACUSAÇÃO: Senadores que defendem o impeachment afirma que a edição dos decretos é um ato grave por ir contra o cumprimento da meta fiscal, pois a falta de confiança de que o governo possui condições para pagar os juros da dívida acarreta efeitos negativos na economia, como alta da inflação e desemprego.

“Fica evidente que essa maquiagem montada pelo governo trouxe sequelas graves. Ou seja, o desdobramento de tudo isso e o descumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal produziu todo esse caos econômico e todo este momento que nós estamos vivendo”, disse o senador Ronaldo Caiado (DEM-GO).

 

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