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ACM Neto, o "Anão", usou amigo para receber R$ 1,8 milhão de caixa 2, diz delator

ACM Neto 2 - Reprodução - Reprodução
Informações contidas no "Drousys", sistema de informática paralelo ao sistema de informática oficial da Odebrecht, apontam pagamento de R$ 1,8 milhão, via caixa 2, em quatro parcelas, à campanha do atual prefeito de Salvador, Antônio Carlos Magalhães (DEM-BA), identificado com o codinome "Anão", entre julho e novembro de 2012
Imagem: Reprodução

Flávio Costa e Gustavo Maia

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

13/04/2017 15h24Atualizada em 13/04/2017 20h13

O delator André Vital Pessoa de Melo, ex-diretor superintendente da Odebrecht na Bahia, afirmou que a construtora doou R$ 1,8 milhão ao caixa 2 da campanha do prefeito de Salvador ACM Neto (DEM-BA), em 2012. Nas planilhas do departamento de propinas do grupo, seu nome aparece associado ao apelido "Anão". Neto garante ter 1,68 metro de altura.

Em nota enviada ao UOL, na noite desta quinta-feira (13), ACM Neto afirmou que a Odebrecht fez doação para sua campanha de 2012 através de seu partido, o Democratas. "Fato que aconteceu dentro da lei, com tudo registrado na Justiça Eleitoral. Portanto, não houve doação de caixa 2 para a nossa campanha", diz o texto (leia a nota completa abaixo).

De acordo com o delator, que era subordinado ao então presidente da Infraestrutura Brasil Odebrecht, Benedicto Barbosa da Silva Júnior, um total de R$ 2,2 milhões foi repassado à campanha do demista, sendo R$ 400 mil via doação eleitoral. BJ, como era conhecido o ex-executivo no meio político, confirmou o relato de Vital.

"Nas eleições municipais de 2012 eu recebi pedido de doação de campanha de alguns candidatos ao cargo de prefeito e de vereadores na cidade de Salvador. Após conversar pessoalmente com cada um deles eu apresentei, submeti a [Benedicto] Júnior uma proposta de apoio", afirmou André Vital, em sua delação premiada.

ACM Neto - Reprodução - Reprodução
Trecho de documento do termo de colaboração do ex-diretor superintendente da Odebrecht na Bahia, André Vital, citando o atual prefeito de Salvador, ACM Neto
Imagem: Reprodução

Encontro no escritório

André Vital relata que, no primeiro trimestre de 2012, se reuniu com ACM Neto no escritório do político em Ondina, bairro nobre da orla de Salvador. À época, Neto era deputado federal.

"Eu me lembro que pouco antes da convenção do partido, eu fui ao encontro dele no escritório político dele em Salvador, oportunidade em que ele me comunicou que viria a ser candidato a prefeito e que contava com o apoio da organização [Odebrecht]", conta Vital.

O ex-executivo contou que concordou com o pedido e, após a aprovação interna, passou a fazer os pagamentos a uma pessoa indicada por ACM Neto para receber as contribuições.

"Nessa oportunidade eu me recordo que ele me apresentou Lucas Cardoso como o responsável pelo recebimento dos pagamentos da campanha dele em 2012", diz o delator.

O UOL apurou que Lucas Cardoso, empresário do ramo de entretenimento em Salvador, é um dos melhores amigos de ACM Neto e ex-namorado de sua irmã.

ACM Neto - Reprodução/Instagram @acmnetooficial - Reprodução/Instagram @acmnetooficial
ACM Neto ao lado do avô, o ex-senador Antonio Carlos Magalhães (1927-2007)
Imagem: Reprodução/Instagram @acmnetooficial
André Vital conta que se reuniu com Cardoso em junho de 2012, "oportunidade em que informei a Lucas que o valor de doação seria de R$ 2,2 milhões, e que uma parte deste valor seria doada com recursos de caixa 2".

"Eu me recordo que R$ 400 mil foram doados via bônus eleitoral pela Construtora Norberto Odebrecht e o saldo, R$ 1,8 milhão, foi operacionalizado pela equipe de Hilberto Silva via caixa 2. Os valores foram entregues por mim a Lucas Cardoso no escritório da companhia em Salvador", relatou.

Hilberto Silva era o executivo responsável pelo Setor de Operações Estruturadas, nome "oficial" do departamento de propinas da Odebrecht.

Entregas em dinheiro

Os valores foram pagos em quatro parcelas, uma de R$ 600 mil (em agosto de 2012), duas de R$ 500 mil (em junho e setembro), e uma de R$ 200 mil (em novembro, após a a eleição).

"As entregas foram realizadas por mim, em espécie, ao interlocutor do candidato, Lucas Cardoso, no escritório da campanha", afirmou Vital.

Além de planilha com o registro de pagamento feito pelo departamento de propinas da Odebrecht, André Vital entregou aos investigadores da Operação Lava Jato registros telefônicos de suas conversas com Lucas Cardoso.

Em 2012, a campanha de ACM Neto recebeu mais de R$ 21,9 milhões em 147 doações eleitorais. Na prestação de contas de campanha ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), nenhuma delas foi da Odebrecht. Ele foi reeleito prefeito de Salvador em 2016.

Caberá ao TRF-1 (Tribunal Regional Federal da 1ª Região) decidir se vai abrir inquérito sobre os fatos narrados pelos delatores André Vital e Benedicto Júnior a respeito do suposto caixa 2 na campanha de ACM Neto.

As informações constam em uma das 201 petições encaminhadas na terça (11) a instâncias inferiores pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin, relator da Operação Lava Jato na Corte.

Neto: doações foram legais

Procurado pela reportagem, o secretário de Comunicação da prefeitura de Salvador, Paulo Alencar, declarou que as doações à campanha de ACM Neto foram feitas dentro do que a lei preconiza. "O prefeito já se manifestou sobre o assunto e tem reiterado diversas vezes que as doações foram absolutamente legais".

Em nota enviada, após a publicação da reportagem, o prefeito ACM Neto afirma que as doações da Odebrecht foram legais. Leia o texto abaixo:

"Estive com o senhor André Vital, diretor do Grupo Odebrecht na Bahia, que me informou que a empresa estaria disposta a colaborar com a nossa campanha a prefeito de Salvador em 2012.

Indiquei um colaborador da nossa campanha para tratar do assunto. Eles se encontraram e ficou acertado que a Odebrecht faria doação para a nossa campanha através do nosso partido, o Democratas. Fato que aconteceu dentro da lei, com tudo registrado na Justiça Eleitoral. Portanto, não houve doação de caixa 2 para a nossa campanha.

Estou tranquilo e pronto para prestar todos os esclarecimentos que forem necessários neste caso."

O UOL ligou três vezes para o telefone celular de Lucas Cardoso, mas ninguém atendeu as ligações.