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Leia a íntegra do interrogatório de Lula a Moro

Lula faz discurso em Curitiba após interrogatório

UOL Notícias

Do UOL, em São Paulo

13/09/2017 23h50Atualizada em 14/09/2017 00h06

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva depôs nesta quarta-feira (13) ao juiz Sergio Moro, que comanda os processos da Operação Lava Jato na primeira instância. Lula é réu em ação no qual é acusado de aceitar propina da Odebrecht por meio da compra de um terreno para o instituto Lula e de um apartamento em São Bernardo do Campo (SP).

Na sala de audiência em que o depoimento foi feito, estavam o juiz Sergio Moro, dois representantes do MPF (Ministério Público Federal), Isabel Cristina Groba Vieira e Antonio Carlos Welter, assistentes de acusação, defensores e um representante da OAB-PR (Ordem dos Advogados do Brasil), além de agentes de segurança. Ao lado de Lula na mesa estava o advogado Cristiano Zanin Martins.

Leia abaixo a transcrição das cerca de duas horas de depoimento do ex-presidente.

*

Sérgio Moro: Então, nessa ação penal 506.31.30/17, depoimento do senhor ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Senhor ex-presidente, boa tarde.

Lula: Boa tarde.

Moro: Senhor ex-presidente, o senhor foi acusado de um crime pelo Ministério Público Federal. Na condição de acusado, pela nossa lei, o senhor tem o direito de permanecer em silêncio. Também pela nossa lei, se o senhor fizer uso desse direito, isso não lhe traz nenhum prejuízo, mas também, senhor presidente, é a oportunidade que o senhor tem de falar no processo; o que o senhor falar, vai ser considerado para o julgamento. O senhor ex-presidente prefere falar ou prefere ficar em silêncio?

Lula: Doutor Moro, apesar de entender que o processo é ilegítimo, que é injusto, eu pretendo falar.

Moro: Perfeito.

Lula: Eu, talvez, eu seja a pessoa que mais queira a verdade nesse processo.

Moro: Perfeito. Senhor presidente, eu não quero aqui cansá-lo com perguntas que já foram feitas na outra oportunidade. Consta que o senhor prestou um depoimento aqui mesmo, perante esse juízo, em 10 de maio de 2017, na ação penal 504.65.12, relativamente àquele apartamento triplex. Naquela ocasião, eu lhe fiz diversas perguntas mais genéricas sobre Petrobras, sobre a administração e vou aproveitar essas perguntas, não vou renovar essas perguntas porque eu não vejo que seja necessário, já que eu posso aproveitar aquilo que o senhor disse na outra ação penal. Eu só gostaria de colocar ao senhor presidente a oportunidade... se o senhor ex-presidente gostaria de retificar alguma coisa que o senhor disse naquela oportunidade.

Lula: Não.

Cristiano Z. Martins: Excelência, antes, pela ordem, eu teria uma questão de ordem a colocar a Vossa Excelência: o Ministério Público apresentou uma manifestação na data de ontem na qual reafirma que desde o dia 22 de março de 2017 tem acesso ao sistema Drousys, da Odebrecht, e também tem acesso ao sistema MyWebDay, igualmente da Odebrecht. Esse material, lamentavelmente, não foi franqueado à defesa. Há, inclusive, aqui, a notícia de que uma parte do material teria sido depositado em cartório, só que não há, inclusive, despacho de Vossa Excelência permitindo, franqueando acesso à defesa, de modo que a defesa está, neste momento, sem conhecer documentos que o Ministério Público reconhece ter a posse e faz referência na denúncia, assim como há referências ao longo de toda a instrução. Então, a defesa entende, com o devido respeito, que não está sendo observada a garantia da paridade de armas e, por isso, pede a Vossa Excelência, mais uma vez, que seja dado acesso, à defesa, a esse material, inclusive para permitir que a defesa esteja com o mesmo nível de informação do Ministério Público para poder orientar os trabalhos e também para que o próprio depoente possa realizar sua autodefesa, conhecendo tudo aquilo que a acusação dispõe. Então, eu pediria a Vossa Excelência que suspendesse esse ato e desse acesso, à defesa, a esse material, a fim de que fosse possível, efetivamente, o exercício do contraditório na extensão que a Constituição Federal prevê, assim como nos acordos internacionais que o Brasil se obrigou a cumprir. Então, é esse pedido que eu faria à Vossa Excelência.

Ministério Público: Excelência, pela ordem, eu faria apenas uma...

Orador não identificado: Excelência, antes de o Ministério Público se manifestar, eu peço licença a Vossa Excelência pra subescrever na íntegra as manifestações do eminente advogado, inclusive reiterar o quanto a defesa de Branislav Kontic já ponderou na audiência anterior, até para que não se alegue futura preclusão.

Moro: Certo. Ministério Público?

Ministério Público: Eu faria apenas um registro: mais uma vez, como já exaustivamente dito nos atos desse processo, o sistema MyWebDay foi recebido em 08 de agosto de 2017 e encontra-se na Procuradoria-Geral para levantamento do seu conteúdo, essa retificação que eu faria no que o senhor disse.

Moro: Perfeito. Essa é uma questão, na verdade, que já foi enfrentada, doutora, então eu acho que nós podemos prosseguir com o interrogatório. De todo modo, como o juízo já colocou, até proferi um despacho hoje no processo, será deferindo um requerimento da defesa, será feita uma perícia sobre esses elementos e, se for necessário, depois nós podemos fazer o reinterrogatório, mas esses elementos, assim, pelo menos na opinião do juízo, nem são assim tão relevantes para o julgamento dessa ação penal. Mas está lá a decisão, eu lembro que a defesa já tentou suspender esse interrogatório, sem sucesso, perante o Tribunal Regional Federal, que também entendeu que não havia prejuízo à realização do interrogatório a ausência desses elementos, que o juízo ainda não os tem, não existe nenhum depósito, ao que me consta, desse material perante esse juízo.

Martins: Mas perícia com acesso prévio à defesa, excelência? Porque...

Sérgio Moro: Não, aí eu vou remeter, doutor, vou pedir escusas, mas vou remeter ao despacho que eu proferi na presente data, daí eu peço que o doutor leia, e daí, eventualmente, discussões em cima disso nós podemos fazer depois, perfeito? Então, vamos prosseguir aqui. Senhor presidente, então, só para deixar claro, eu vou utilizar aquele depoimento que o senhor prestou anteriormente, certo? E o senhor mencionou agora que o senhor não teria nenhuma retificação a fazer em relação àquilo?

Lula: Não...

Moro: Perfeito. Então vou fazer mais perguntas, mais específicas, aqui, relativas ao objeto dessa acusação, apenas.

Lula: Se bem que eu deveria mudar tudo, né? Porque o senhor me acusou...

Moro: Não, eu não acusei, não. Não acusei, senhor presidente.

Lula: Precisaria fazer um novo depoimento.

Moro: Tá certo. Senhor ex-presidente, objetivamente, algumas questões são um tanto quanto óbvias, mas o senhor pode confirmar: o senhor reside nesse apartamento 122, bloco um, Avenida Francisco Prestes Maia, edifício Green Hill, em São Bernardo do Campo?

Lula: Desde 98.

Moro: Perfeito. O senhor é proprietário desse imóvel?

Lula: Sou proprietário desse imóvel.

Moro: O senhor ex-presidente pode confirmar se também ocupa o apartamento vizinho, o 121, desse mesmo edifício Green Hill?

Lula: Ocupo. Desde 2000... Acho que desde 98.

Moro: Perfeito. O senhor ex-presidente pode informar a que título o senhor ocupa esse...

Lula: Aluguel.

Moro: Consta, aqui no processo, no evento 44, no processo conexo 504.26.89, um contrato de locação de 01/02/2011, que teria sido celebrado entre o senhor Glauco da Costa Marques e a senhora sua esposa. Eu posso lhe mostrar aqui esse documento se for necessário, mas acredito que o senhor ex-presidente tem conhecimento dele.

Lula: Não precisa, não.

Moro: O senhor ex-presidente pode informar se conhece o senhor Glauco da Costa Marques e explicar sua relação com ele, se existente?

Lula: Olha, eu não tenho relação com o Glauco. Segundo ele disse, eu não me lembro, eu conheci ele em 2002, por ocasião da gravação de um programa de televisão do PT para a campanha presidencial daquela época. Ele disse que estava lá; eu não o conhecia porque tinha gente da produtora, tinha gente da fazenda e tinha o pessoal do PT lá do Estado do Mato Grosso. Eu ouvi ele dizer que ele me conheceu lá; eu não sabia. Depois, ele disse que me conheceu duas vezes, num jantar na casa do Zé Carlos Bumlai; eu também não me lembro, porque não era um jantar entre eu e ele, era um jantar entre centenas de pessoas na casa do José Carlos Bumlai. Depois, ele disse também que me encontrou num aniversário do meu filho, ou num aniversário meu lá em São Bernardo do Campo; é possível que seja verdade, mas eu não lembro.

Moro: Certo. O senhor participou da celebração desse contrato de locação?

Lula: Não, não participei. O senhor deve perceber, o primeiro contrato foi feito com base em manter a segurança, porque eu era candidato a presidente em 98, depois continuou o contrato, porque eu fui candidato e fui eleito presidente em 2002, depois a segurança da Presidência da República resolveu assumir a responsabilidade por garantir o contrato, até porque a segurança da Presidência utilizava parte e utilizava também a garagem do prédio para tomar conta da segurança presidencial. Pelo que eu sei, o dono, o seu Augusto, morreu em 2010, estava discutindo a questão do inventário; a dona, herdeira, queria vender, e como a prevalência é do inquilino, a procuraram, a minha casa, para perguntar se a gente queria alugar; dona Marisa disse que queria manter o aluguel e fez o contrato no dia 1º de fevereiro.

Moro: Certo, mas e como surgiu o senhor Glauco Costa Marques nessa história?

Lula: Porque ele era dono do apartamento.

Moro: Ele adquiriu da senhora Elenice?

Lula: Ah, eu não sei. Não sei, o fato concreto é que ele é dono do apartamento.

Moro: O senhor ex-presidente ocupa esse imóvel, assim, com qual finalidade? O que existe lá?

Lula: A finalidade é fazer segurança, fazer reuniões políticas para não ocupar o meu apartamento.

Moro: Mas esses...

Lula: O apartamento onde morava eu e minha família, a gente não queria ocupar.

Moro: Perfeito. Esse apartamento, ele é ocupado pelos seguranças que lhe dão proteção ou pelo senhor ex-presidente diretamente?

Lula: Não, agora não, agora ele é um apartamento que tá lá à minha disposição.

Moro: Perfeito. E o senhor ex-presidente faz reuniões ali?

Lula: Se permitirem que eu seja candidato em 2018, ele voltará a ter uma função política muito forte.

Moro: Certo. Consta aqui no processo que o — pelo menos segundo o Ministério Público — o senhor Glauco Costa Marques adquiriu esse apartamento em agosto ou setembro... agosto e setembro de 2010 — pagamento, escritura pública — dessa senhora Elenice Silva Campos. O senhor ex-presidente acompanhou essa aquisição?

Lula: Não, não acompanhei. Eu só tinha relação de amizade com o seu Augusto, porque, segundo informação do prédio, o seu Augusto era um homem muito duro, era um senhor português que não tinha relações muito boas com todo o conjunto, e eu nunca conheci a mulher dele, eu conheci ele, só.

Moro: Consta a afirmação do Ministério Público, o senhor Roberto Teixeira e o senhor José Carlos Costa Marques Bumlai teriam participado dessa aquisição, ou dessa venda da senhora Elenice para o senhor Glauco Costa Marques.

Lula: Eu não sei se participaram, mas o Roberto Teixeira, todo mundo sabe, é meu advogado.

Moro: Mas o senhor não ficou sabendo disso na época, em 2010?

Lula: Talvez não, porque, como eu era Presidente da República, e estava muito lá em Brasília, e a minha mulher vinha mais para São Paulo para cuidar dos filhos, pra ver a casa, possivelmente, é por isso que só ela assinou o contrato em fevereiro, porque a minha ausência era constante, e o contrato foi assinado pela minha mulher e pelo representante do... da dona do apartamento.

Moro: Perfeito. O senhor ex-presidente solicitou, de alguma forma, ao senhor José Carlos Bumlai, ou ao senhor Roberto Teixeira, que, vamos dizer, adquirissem esse apartamento?

Lula: Não, não.

Moro: Não?

Lula: Eu acho que foi quase que uma lógica sequencial de uma coisa que vinha acontecendo desde 1998: era manter o apartamento em função da mesma visão de que, por eu ser uma figura, sabe, de projeção nacional, era preciso que aquele apartamento não fosse ocupado por um terceiro, porque tinha muita facilidade de ver o apartamento que eu moro. Inclusive, tem uma mesma laje que, se alguém subir na laje, vai ver o meu apartamento.

Moro: Mas quando houve o falecimento do senhor Augusto, então, e esse imóvel não sei se foi posto à venda ou não, o senhor chegou a externar alguma preocupação nesse sentido, de que o imóvel fosse adquirido por um conhecido?

Lula: Não, porque não chegou a mim a morte de seu Augusto, ou seja, o que chegou a mim foi que comunicaram à segurança da Presidência da República — eu não sei se o General Gonçalves já prestou depoimento —, mas chegou à segurança da Presidência da República de que o apartamento ia ser vendido, e a preferência era para quem morava lá.

Moro: E aí houve a recusa dessa preferência?

Lula: E aí houve recusa para comprar, porque não tinha interesse em comprar. Aliás, a dona Marisa brigou comigo a vida inteira para mudar desse apartamento, porque ela queria mudar pra São Paulo.

Moro: E quando o senhor ex-presidente ficou a par de que esse imóvel havia sido adquirido pelo senhor Glauco Costa Marques?

Lula: Eu fiquei a par quando foi feito o contrato com a dona Marisa. Quando veio a proposta de alugar, disseram que o Glauco tinha comprado o apartamento e o Glauco estava disposto a alugar.

Moro: Quando lhe informaram isso, o senhor relacionou o senhor Glauco ao senhor Bumlai, ao parentesco?

Lula: Não. Eu sei que eles são parentes, mas não tinha nenhuma relação.

Moro: O senhor chegou a conversar com o senhor Glauco Costa Marques a respeito desse contrato, dessa locação?

Lula: Não, não...

Moro: E o senhor ex-presidente mencionou, então, essa locação, em fevereiro de 2011, esse contrato entre o senhor Glauco e a senhora sua esposa. O senhor ex-presidente, salvo engano, me disse que não participou dessa negociação e dessa celebração?

Lula: Não participei.

Moro: Tá certo. O senhor ex-presidente sabe explicar como foi pago o aluguel desse imóvel a partir de fevereiro de 2011?

Lula: Deixa eu lhe dizer uma coisa, doutor Moro: eu já disse, em outros depoimentos, eu casei em 1974; em 1975, eu virei presidente do sindicato, e aí eu comecei a viajar muito o Brasil. Eu odiava saber que uma mulher tinha que levantar todo dia e pedir dez reais para o marido pra ir na feira pra comprar uma coisa, então eu abri, em outubro de 1975, uma conta conjunta com a dona Marisa, pra deixar a dona Marisa administrar as questões da casa. Eu penso que eu fiquei próximo de 30 anos sem assinar um cheque na minha vida, porque a dona Marisa, primeiro, era muito séria no trato de dinheiro, era muito econômica — eu nunca tive medo de deixar um cartão de crédito com ela, porque eu tinha a consciência que a dona Marisa não gastaria nada que não fosse essencial —, e a dona Marisa ficou com a responsabilidade de fazer o contrato e de acertar aluguel, condomínio, IPTU e outras coisas da casa, era tudo ela que fazia.

Moro: Então o senhor ex-presidente não tem conhecimento de como era feito esse pagamento?

Lula: Não, pagava no banco. Pagava... sabe? Eu não tenho noção como era feito, mas devia ter pagado no banco.

Moro: O senhor Glauco da Costa Marques foi ouvido aqui em juízo, declarou que somente passou a receber o pagamento do aluguel do imóvel a partir do final de 2015, logo após a prisão do senhor José Carlos Bumlai. Essa é a afirmação dele. O senhor ex-presidente tinha conhecimento disso?

Lula: Não, não tinha conhecimento e fiquei surpreso com o depoimento dele, porque nunca chegou a mim qualquer reclamação de que não estava se pagando aluguel. Porque ele declarava no Imposto de Renda dele que pagava o aluguel, e eu declarava no meu Imposto de Renda, que a dona Marisa mandava para o procurador, o pagamento do aluguel. Então para mim nunca chegou.

Chegou, acho que a dona Marisa já estava doente, chegou uma carta para mim, uma carta em nome da dona Marisa, pedindo para que o pagamento fosse efetuado no Banco do Brasil. Mesmo nessa carta não se fala de atraso, não se queixa de atraso, então para mim estava tudo normal. A não ser que alguém falou para seu Glauco, “olha, você não precisa receber o aluguel que o papa vai pagar”. Porque não tem outra explicação.

Moro: Mas alguém falou isso? A ele?

Lula: Não, não sei, eu estou insinuando aqui.

Moro: O senhor ex-presidente tem os comprovantes de pagamento desse aluguel entre esse período de 2011 até o final de 2015?

Lula: Ah, deve ter. Deve ter, querido, deve ter.

Eu, se for... se for...

Moro: O senhor ex-presidente apresentou isso aos seus advogados?

Lula: Eu, se for mexer na arca, sabe, do baú, que está lá em casa, eu posso achar esse documento. Mas isso deve estar... deve estar no meu Imposto de Renda. Deve estar no meu Imposto de Renda.

Moro: O senhor ex-presidente sabe se, por exemplo, foram feitos depósitos bancários entre 2011 e 2015?

Lula: Eu acho que foram feitos depósitos bancários. Eu não sei como, mas foram feitos. Foi pagamento.

Moro: Não, a princípio, os seus advogados não apresentaram esses depósitos até o momento. O senhor ex-presidente tem conhecimento?

Lula: Porque, certamente, eles não sabiam que... que não estava sendo pago, ou seja. Depois que o Glauco falou. Porque o dado concreto é que, na minha cabeça, até hoje, até hoje, o aluguel estava sendo pago normalmente. Porque nunca houve uma reclamação de que não estava sendo pago.

E por que a dona Marisa iria alugar um apartamento para a gente ficar, como estava desde 98, e não ia pagar? Qual é a lógica?

Moro: O senhor ex-presidente tem recibos do pagamento desses alugueis?

Lula: Deve ter recibo, deve ter. Eu posso procurar o contador, e saber se tem recibo.

Moro: Salvo engano do juiz, esses recibos não foram apresentados ainda, o senhor ex-presidente não sabe o motivo?

Lula: Eu não sei. Nem sei se já foi pedido para os advogados apresentarem.

Moro: Essa acusação contra o senhor foi formulada no final do ano passado, também recebida no final do ano passado, desde então não foi possível levantar isso aí?

Cristiano Z. Martins: Pela ordem, a questão já foi respondida, o ex-presidente já respondeu a Vossa Excelência que não era ele que cuidava desta questão. E então já foi respondida, Vossa Excelência insiste numa pergunta, aparentemente para tentar obter uma mudança do fato real, que já foi explicado aqui pelo depoente.

Lula: Mais importante, doutor Moro, eu acabei de dizer para o senhor que nunca, nunca o seu Glauco disse, em algum momento, para mim ou para dona Marisa que estava atrasado; pelo menos eu nunca soube. Só fiquei sabendo no depoimento dele aqui, sabe, que ele não tinha recebido o aluguel até 2015.

Moro: Certo, senhor ex-presidente.

Lula: Ele nunca se queixou.

Moro: Eu compreendo que o senhor é um homem bastante ocupado nos seus afazeres, provavelmente não cuida dessas questões do cotidiano, mas, por exemplo, depois de formulada essa acusação, no final do ano passado, não foi possível levantar isso com as pessoas ao seu redor, como isso foi pago, se não foi pago, ou foi pago?

Lula: Eu estou dizendo para o senhor que para mim estava pago. Para mim não foi levantado o ano passado, para mim foi levantado no depoimento que o Glauco fez aqui. Porque até então havia normalidade para mim.

Até então o apartamento estava sendo pago mensalmente, declarado no Imposto de Renda, declarado no Imposto de Renda dele, até aí não tinha nenhuma notícia de que não estava pago.

Moro: Mas o Ministério Público faz uma acusação contra o senhor de que esse imóvel, vamos dizer, seria do senhor e que os aluguéis não foram pagos. Isso não foi levantado?

Lula: Mas o Ministério Público não é dono da verdade...

Moro: Perfeito.

Lula: Tem muitas inverdades, inclusive...

Moro: Mas não houve uma preocupação do senhor ex-presidente, desde a formulação dessa acusação, em levantar essas provas do pagamento do aluguel?

Lula: Eu estou levantando agora, e vou repetir para o senhor. Nunca houve qualquer denúncia que o apartamento não estava sendo pago. Seu Glauco nunca levantou, seu Glauco nunca cobrou, seu Glauco nunca me telefonou. Nem ele e nem ninguém.

Pois bem, estou dizendo para o senhor que tinha uma relação da dona Marisa, sabe, no contrato do aluguel, porque a dona Marisa cuidava, de forma responsável, das coisas da casa. Eu só fiquei sabendo que não estava sendo pago agora quando o Glauco prestou depoimento.

Moro: Certo. Mas, aparentemente, ele falou isso, senhor ex-presidente, já no final do ano de 2015.

Lula: Não falou para mim.

Moro: Que esses honorários estariam...

Que esses aluguéis estariam sendo compensados...

Cristiano Z. Martins: Excelência, não existe essa afirmação. Eu peço que Vossa Excelência indique onde está essa afirmação, porque essa afirmação não existe.

Moro: Eu posso indicar, doutor.

Martins: Podemos verificar nos autos, mas não existe essa indicação do senhor Glauco.

Moro: O senhor Glauco declarou em depoimento ao inquérito, e antes à Receita Federal, isso ainda em 2015, que esses aluguéis estavam sendo compensados com honorários com o senhor Roberto Teixeira.

Martins: Certo. Então, a Vossa Excelência fez uma afirmação então que me dá razão. Porque o senhor Glauco não disse à Receita que não estaria recebendo esses aluguéis. Se tem outra afirmação, eu peço que Vossa Excelência indique, porque essa para a Receita não fala isso.

Moro: É o que ele afirma, que não estava recebendo aluguéis, porque esses aluguéis estavam sendo compensados com os honorários do Roberto Teixeira.

Martins: Então ele estava dizendo que estava sendo pago.

Moro: Estava sendo compensado com os honorários do Roberto Teixeira.

Martins: Compensação é pagamento, Excelência. Pela lei é isto.

Moro: Então, senhor ex-presidente, depois que o senhor Glauco falou que os honorários estavam sendo compensados pelo Roberto Teixeira, o senhor Roberto Teixeira negou esses fatos expressamente no final do ano passado; o senhor é acusado pelo Ministério Público desde o ano passado, de que esse apartamento seria, segundo o Ministério Público, do senhor, e o senhor não pagaria o aluguel, não foi possível levantar?

Lula: O Ministério Público é muito engraçado. Graças a Deus, como Deus escreve certo por linhas tortas, as coisas estão virando verdadeiras, estamos vendo o que está acontecendo com o Janot, o que está acontecendo com o Miller, e a Força-tarefa da Lava Jato, aqui, em Brasília, está tratando de forma a destruir o Ministério Público contando inverdades. Eles inventaram que o tríplex era meu porque o Globo disse, e não é, e o senhor sabe disso. Eles agora inventaram que o apartamento é meu, e não é, e eles sabem disso. Como inventaram a história do sítio que é meu, e não é. Ou seja, três denúncias do Ministério Público por ilação, porque eles têm a ideia de tentar transformar o Lula no powerpoint deles. E eu poderia ficar zangado, nervoso, mas eu quero enfrentar o Ministério Público, sobretudo a Força-tarefa, para provar a minha inocência.

Eu só espero que eles tenham a grandeza de um dia pedir desculpas. Eu não sei se o senhor Miller vai pedir desculpas pela palhaçada que foi feita, em Brasília, com o Joesley, e que agora está sendo desmontado.

Eu, por exemplo, vi o Ministério público me incluir na denúncia do Delcídio.

Moro: Sei.

Lula: Tem mais de 20 perguntas do Delcídio comigo nesse processo.

E o Delcídio é um mentiroso, descarado, que foi solto num pacto entre o Miller e a Globo para fazer denúncia contra mim.

Então, eu só quero repetir para o senhor com todas as letras, se essa moça vai escrever eu não sei, é o seguinte: eu nunca recebi do senhor Glauco nenhuma denúncia que não estava sendo pago aluguel. Ponto final. O único dia que eu ouvi dizer que não estava sendo pago aluguel foi no depoimento que ele fez aqui, a semana passada.

Moro: Então, eu presumo que senhor vai conseguir levantar, então, os comprovantes desses pagamentos?

Lula: Eu presumo que eu vou pagar, se dever para ele. Presumo que se não foi pago, eu vou pagar. É só isso.

Moro: Então o senhor não sabe dizer se foi pago ou não pago? O senhor não tem certeza?

Lula: Na minha convicção, estava sendo pago. Porque nunca houve, da parte do seu Glauco, para mim um comunicado de que não estava sendo pago.

E ele declarava no Imposto de Renda dele, e declarava no meu.

Moro: Então, o senhor ex-presidente reclama dessas acusações, mas eu recomendaria ao senhor, nesse caso, se não foram pagos esses aluguéis, que o senhor providenciasse a juntada dos comprovantes...

Martins: Excelência, se não mudou ainda o modelo, cabe à acusação fazer a prova da culpa e não ao acusado fazer a prova da inocência. Então...

Moro: Estou só auxiliando...

Martins: Às orientações de Vossa Excelência, eu agradeço às orientações de Vossa Excelência, mas eu prefiro o sistema constitucional.

Moro: Perfeito, vale para o doutor também, para juntar esses comprovantes, se houverem.

Lula: Mas eles é que têm que provar, doutor Moro.

Moro: Está certo.

Lula: Eu estou cansado de mentira e nunca há prova. Eu vi o que fizeram com o Palocci aqui, a semana passada, eu vi a cena.

Moro: Nós vamos chegar lá, senhor ex-presidente.

O senhor ex-presidente sabe informar se esse contrato de locação foi aditado? Foi reajustado os valores?

Lula: Não sei, querido, eu não sei.

Moro: Outra parte da acusação, senhor ex-presidente, aqui, segundo o Ministério Público, o Grupo Odebrecht teria adquirido um prédio na rua Haberbeck Brandão 178, Bairro Indianópolis, para instalação e implantação do Instituto Lula ou de alguma instalação do interesse do senhor ex-presidente. Vou fazer perguntas agora a respeito desse ponto. Consta aqui no processo que esse prédio foi adquirido pela empresa DAG Construtora, em 29 de setembro de 2010, de uma empresa chamada ASA (Agência Sul Americana), consta também que antes os direitos de aquisição foram adquiridos pela DAG, do senhor Glauco de Costa Marques, esse mesmo que seria proprietário desse imóvel, desse apartamento. O senhor ex-presidente acompanhou esses fatos? Essa aquisição específica?

Lula: Não, doutor, vou apenas repetir uma coisa aqui. Para ficar bem claro que é o seguinte: quando o procurador [Deltan] Dallagnol apresentou, ano passado, uma peça de ficção num PowerPoint que se transformou na “nave-mãe” dos processos contra mim, e contaram uma inverdade deslavada e se submeteram à imprensa para poder continuar contando inverdade e, a imprensa tentar transformar em verdade, inventaram também essa história, sabe, desse prédio.

Moro: Do prédio?

Lula: Desse prédio. Vou lhe dizer com todas as letras quando é que eu fiquei sabendo desse prédio. A única pessoa que falou comigo desse prédio foi o presidente do instituto chamado Paulo Okamotto. Nós já tínhamos visitado outros prédios para alugar ou para pegar oferta de compra, tínhamos visitado um prédio do correio, tínhamos visitado um prédio de uma escola que tinha lá perto do Ipiranga, tínhamos visitado uma espécie de castelinho que tem nas coisas velhas do Ipiranga, que até era um precinho barato porque aquilo está tombado, aí o Paulo falou: “Olha, estão oferecendo para comprar um prédio que me parece que era um antigo shopping”, não sei. Aí eu fui uma única vez, uma única vez, e, cheguei lá, a primeira coisa que eu disse foi o seguinte: “Não interessa, é inadequado, isso aqui não é uma zona que pode frequentar muita gente, nós vamos procurar noutro lugar”. E fomos ao Kassab, pedimos ao Kassab para mandar um projeto de lei, o Kassab mandou, nos deram um terreno na cracolândia, que o Ministério Público como é corroborador comigo, entrou com um pedido para impedir que eu recebesse o terreno, é isso. Essa é a minha história com relação ao prédio.

Moro: Voltando ao prédio, o senhor ex-presidente se recorda quando foi aproximadamente essa visita?

Lula: Eu acho que foi em junho... junho ou julho de 2011.

Moro: O senhor ex-presidente se recorda, não de todos, mas de algumas pessoas que lhe acompanharam nessa ocasião?

Lula: Eu sei que o Paulo Okamotto, eu sei que minha mulher, eu sei que a diretora do instituto, a Clara Ant, que já prestou depoimento. Eu acho que o arquiteto, acho que foi isso.

Moro: E quanto tempo após... quanto tempo essa visita foi feita após a primeira informação que o senhor recebeu do senhor Paulo Okamotto?

Lula: Acho que eu demorei um tempo para ir. Acho que demorei dias, acho que um mês, mais ou menos, para ir.

Moro: E qual foi o relato o que senhor Paulo Okamotto fez ao senhor ex-presidente na ocasião?

Lula: Que tinha um terreno sendo oferecido para compra, sabe, se a gente queria ver se ia comprar o terreno ou não. Sabe? Você ia ver o terreno, como fui ver os outros terrenos, se você tivesse um prédio em condições de alugar, você alugaria, e se você não tivesse, você então iria discutir, sabe, como fazer uma campanha de finanças para comprar o terreno.

Moro: Essa ocasião que o senhor Paulo Okamotto relatou esses fatos ao senhor havia outras pessoas presentes ou foi contato por telefone? Como foi?

Lula: O Paulo falou porque eu vou no instituto.

Moro: Havia outras pessoas nessa reunião se é que o presidente se recorda?

Lula: Não, não.

Moro: O senhor ex-presidente havia recebido antes desse contato algum documento relativo a esse mesmo prédio?

Lula: Não.

Moro: O senhor ex-presidente havia recebido algum projeto arquitetônico relativo a esse mesmo prédio?

Lula: Não.

Moro: E o senhor ex-presidente relatou que não... que entendeu que o prédio era inadequado, pode explicar melhor as razões? O senhor ex-presidente mencionou, mas...

Lula: Não, primeiro...

Moro: Só um minutinho, ex-presidente. Pelo tamanho do áudio, eu vou interromper e nós retomamos com a sua resposta.

Moro: Então, na continuidade do depoimento do senhor ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, no processo 5063130. Senhor ex-presidente, até peço desculpas por ter cortado a palavra, mas o áudio aqui tem uma duração específica para gravação, mas eu lhe indaguei… eu só pediria que o ex-presidente explicasse melhor porque o prédio era inadequado. O senhor mencionou algo, mas eu gostaria de um pouco mais…

Lula: Primeiro porque é na área perto do aeroporto, uma área que não é visitada, e não transita o povo de São Paulo. Segundo porque era um prédio que era inadequado porque era um prédio velho que precisaria ser demolido se fosse adquirido. Como nós decidimos não adquirir, nós fomos procurar um lugar mais adequado onde transita, realmente, o povo de São Paulo, que é ali próximo da estação da Luz, na cracolândia. Era isso.

Moro: E esse prédio que estava sendo buscado, esse ou outros, ele serviria… qual seria o propósito dele, exatamente?

Lula: Nós na verdade queríamos fazer era um chamado “Memorial da Democracia”. A ideia era construir um projeto onde esse projeto pudesse contar toda a história das lutas sociais nesse país, até o término do meu governo e o governo da companheira Dilma, porque como a história desse país é contada pelos vencedores, e os derrotados nunca são citados, a gente queria contar a história no “Museu da Democracia”.

Nós queríamos fazer um projeto com universidades, não deu tempo de fazer um projeto de lei fazendo com que as universidades pudessem assumir um projeto desse, e morreu por aí o assunto, porque nós não conseguimos o terreno, o que nós conseguimos, que era um lugar muito interessante na cracolândia, o Ministério Público entrou com um pedido proibindo que fosse dado para a gente o terreno. Está agora, acho que num embargo, estão brigando lá para ver o que vai acontecer.

Moro: Senhor ex-presidente, quando lhe foi mencionado pelo senhor Paulo Okamotto nessa visita a esse prédio na Haberbeck Brandão, foi mencionado quem era o vendedor desse imóvel?

Lula: Não. Não.

Moro: Foi mencionado que o Grupo Odebrecht tinha algum envolvimento?

Lula: Não.

Moro: Havia, se é que o senhor ex-presidente se recorda, executivos da Odebrecht nessa visita?

Lula: Não. Não.

Moro: O senhor ex-presidente sabe dizer se nessa visita o doutor Roberto Teixeira e o senhor José Carlos Bumlai estavam presentes?

Lula: Não.

Moro: O senhor ex-presidente tem conhecimento do envolvimento do doutor Roberto Teixeira, ou do senhor José Carlos Bumlai ou do senhor Glauco Costa Marques com esse prédio, específico, na Haberbeck Brandão?

Lula: Moro, o Roberto Teixeira é um advogado do ramo imobiliário, o Roberto Teixeira a vida inteira dele é advogado, se ele estava lá, ele estava contratado para prestar um serviço como qualquer advogado é contratado para prestar um serviço.

Moro: O senhor ex-presidente - não sei se ficou claro - o senhor ex-presidente tem conhecimento do envolvimento do senhor Roberto Teixeira nessa venda desse imóvel?

Lula: Eu pessoalmente, eu não tenho. Eu tenho o conhecimento pela delação que eu ouvi do próprio Glauco, que o doutor Roberto Teixeira foi contratado para legalizar as irregularidades do terreno.

Moro: Na época dos fatos o senhor ex-presidente tinha conhecimento?

Lula: Não.

Moro: Da participação do senhor Bumlai ou do senhor…

Lula: Não.

Moro: Roberto Teixeira? Não?

Lula: Não. Até porque o Roberto Teixeira não tem que me prestar conta dos serviços dele.

Moro: Claro. O senhor ex-presidente pode esclarecer o seu relacionamento com o senhor José Carlos Bumlai?

Lula: Já está no outro depoimento, o senhor podia se valer da mesma forma do outro.

Moro: Esse eu não me recordo, especificamente.

Lula: O senhor José Carlos Bumlai eu conheci…

Moro: Brevemente, não precisa ser em detalhes.

Lula: Eu vou lhe contar detalhadamente.

Moro: Não, não… nem precisa detalhes, só…

Lula: O Roberto Bumlai eu conheci ele em 2002 porque eu era candidato à Presidente da República e nós queríamos fazer uma gravação de um programa para os empresários da área rural desse país, e o José Carlos Bumlai era amigo do governador do PT, da época - o Zeca do PT - que era o governador do Mato Grosso do Sul. E o Zeca marcou então, nós fomos numa fazenda do José Carlos Bumlai, gravei o programa, depois ficamos fazendo amizade. Eu fui ao Mato Grosso outras vezes, encontrava com o José Carlos Bumlai, depois ele passou a morar em São Paulo, eu já morava em São Paulo, não sei, e ficamos com amizade.

Moro: O senhor José Carlos Bumlai ele prestou um depoimento nesse processo como testemunha, ele declarou, e aqui eu sintetizo que ele declarou, que teria sido procurado pela senhora Marisa Letícia, senhora sua esposa, para implementar um espaço institucional para o Instituto Lula, e que esse imóvel da rua Haberbeck Brandão serviria a esse propósito, que ele - senhor Bumlai - teria tratado com Roberto Teixeira e Marcelo Odebrecht sobre esse assunto, o senhor ex-presidente tem conhecimento disso?

Lula: Doutor Moro, eu queria até fazer uma explicação nesse negócio. O nome da Marisa de vez em quando é citado, eu diria… não sei se com leviandade ou não.

Moro: Não estamos imputando nenhum fato negativo a ela.

Lula: Todas as pessoas que trabalhavam comigo, todas as pessoas, todos sabiam que era proibido falar em qualquer coisa de Instituto Lula ou de Instituto de Memorial, enquanto eu tivesse exercendo cargo de Presidente da República. Eu vi o Palocci mentir aqui essa semana, mas eu quero antecipar. Ninguém, ninguém no meu governo, nem muito menos na minha casa discutia comigo qualquer coisa do Instituto porque eu dei uma ordem, “não quero discutir o futuro do Lula antes do dia 31 de dezembro de 2010, quando eu deixar a presidência, eu vou discutir a minha vida”. Era assim, portanto, se conversaram com a Marisa ela não me contou e eu acho muito difícil ter conversado com a Marisa e ela não me contar.

Moro: Então o senhor acredita que isso que o senhor José Carlos Bumlai declarou não teria ocorrido?

Lula: Eu acredito que têm pessoas que contam fantasias, constroem fantasias e começam a fazer ilações com as fantasias.

Cristiano Z. Martins: Excelência, pela ordem, me recordo que na última audiência quando nós ouvimos o senhor Antonio Palocci, Vossa Excelência chamou minha atenção de que não era apropriado confrontar depoimentos, então se naquela oportunidade eu não tive essa possibilidade, me parece que Vossa Excelência usar hoje desse critério colide um pouco com a orientação anterior.

Moro: Certo, doutor, fica aqui anotado. Havia um relato do senhor José Carlos Bumlai, eu queria ouvir o que o senhor ex-presidente teria a dizer a esse respeito, certo? Mas, evidentemente, eu também acho que há correção em não se questionar se está falando a verdade ou não falando a verdade. Mas pode ser também um conhecimento do imperfeito do seu cliente sobre isso, acho que essas questões têm que ser esclarecidas.

Martins: Correto.

Moro: O documento que vou lhe mostrar, senhor ex-presidente, que é evento 1, anexo 234 desse processo, é um contrato de opção de compra entre a ASA (Agência Sul Americana), e do outro lado o senhor José Carlos Bumlai representado pelo doutor Roberto Teixeira, e diz respeito a esse imóvel na rua Haberbeck Brandão. Eu vou lhe mostrar esse documento.

Lula: Doutor, até queria fazer uma sugestão para o senhor, essas coisas feitas entre o Bumlai e qualquer outra pessoa que eu não participei, é melhor o senhor perguntar para eles. Porque eu não sou obrigado e nem o José Carlos Bumlai tinha qualquer obrigação de apresentar qualquer projeto para mim ou o Roberto Teixeira, qualquer projeto. Como eu não tinha que prestar contas para eles do que eu fazia. Então como eles vão prestar depoimento, eu acho que o Ministério Público deve perguntar para eles.

Moro: Certo. Esse documento que foi lhe mostrado, senhor ex-presidente, o senhor já tinha conhecimento dele?

Lula: Não.

Moro: Já tinha visto ele anteriormente?

Lula: Não.

Moro: Consta afirmação do Ministério Público que esse imóvel teria sido encontrado em sua residência?

Lula: Eu não sei o que eles encontraram na minha residência, doutor. Eles entraram seis horas da manhã, entraram no escritório na minha casa, que faz exatamente 20 anos que eu moro naquela casa e 20 anos que eu não entro naquele escritório, é quase um lugar de jogar tranqueira, jogar papéis e mais papéis, tá? O fato dele ter encontrado isso no escritório, na minha casa, não significa que eu tenha conhecimento ou que eu tenha visto.

Moro: Consta também…

Lula: Até porque eu não sou obrigado a acreditar que encontraram na minha casa.

Moro: Certo. O senhor não confirma então que foram encontrados na sua casa, nem se…

Lula: Eu tenho dúvidas.

Moro: Não saberia explicar.

Lula: Porque depois do que estão fazendo comigo, eu sou um homem que tenho muitas dúvidas hoje.

Moro: Perfeito. Consta também, senhor ex-presidente, no processo, projetos arquitetônicos de reforma desse imóvel na rua Haberbeck Brandão, isso foi objeto de um laudo da Polícia Federal, 0620/2016, está no processo evento 1, anexo 269, e esse projeto arquitetônico serviria para abrigar uma biblioteca, sala de exposições, aparentemente, na linha dessas finalidades que o senhor ex-presidente mencionou para esse Memorial da Democracia. O senhor ex-presidente não se recorda de ter visto projetos arquitetônicos?

Lula: Eu tinha visto, pela imprensa, uma ideia de projeto e, sinceramente, doutor, aquilo não é um projeto, aquilo é uma fotocópia que tiraram de uma coisa feita pelo computador e que alguém, ou para tentar enganar a dona Marisa, entregou aquele negócio pra ela sem nenhuma importância, sem nenhuma importância. Eu, sinceramente, já vi documentos mais sérios do que aquele, já consultei pessoas muito importantes que disseram “isso não vale nada”. Isso não vale nada. É uma fotocópia malfeita, sabe, de uma coisa feita pelo computador e que, portanto, aquilo não significa um projeto, significa que, se for um projeto, alguém tentou vender mais uma mentira para dona Marisa.

Moro: Mas o senhor ex-presidente, eu não sei se ficou claro para mim, teve contato com esses documentos anteriormente, não?

Lula: Não, não, não.

Moro: Consta a afirmação, também, no processo, que eles teriam sido apreendidos nesse sítio em Atibaia?

Lula: Numa pasta cor-de-rosa.

Moro: Isso.

Lula: Eu já sei, porque o meu advogado me contou.

Moro: Isso. Pasta cor-de-rosa, eu não sei a cor…

Lula: É porque essas coisas são hilariantes, doutor.

Moro: O senhor ex-presidente não tinha visto esse documento anteriormente, então?

Lula: Deixa eu lhe falar uma coisa: eu comecei dizendo aqui que, na minha casa e no meu gabinete, eram proibidos falar de qualquer atividade minha depois. Pelo que eu sei, a dona Marisa nunca tratou de Instituto. Nunca tratou de Instituto, pelo que eu sei, comigo. Eu acho muito estranho que ela não tenha tratado comigo e tenha tratado com terceiros! Sabe? Eu, sinceramente, não acredito, doutor. Não acredito.

Moro: Certo. Então, só para confirmar, então, o senhor não tinha visto esse documento anteriormente?

Lula: Não, eu vi porque meu advogado mostrou.

Moro: Perfeito. O senhor ex-presidente tem conhecimento do envolvimento do senhor Antonio Palocci Filho na busca ou na aquisição desse imóvel na Rua Haberbeck Brandão?

Lula: Não. Eu vi ele falar aqui, depois eu vou tratar o Palocci como um capitulo à parte.

Moro: Certo.

Lula: Ele merece.

Moro: O senhor nunca conversou com ele sobre esse imóvel?

Lula: Não. Eu vou repetir aqui, doutor Moro, pra ficar claro: a única pessoa que conversou comigo sobre esse imóvel chama-se Paulo Okamotto, presidente do Instituto Lula. Ponto.

Moro: Certo. O senhor Paulo Okamotto relatou ao senhor se o senhor Antonio Palocci tinha algum envolvimento?

Lula: Não. Não.

Moro: Ou o senhor Roberto Teixeira?

Lula: Não.

Moro: Não?

Lula: Não.

Moro: Consta no processo aqui — eu vou até lhe mostrar, só peço um minutinho… Evento 1, anexo 230, consta um e-mail do senhor Marcelo Bahia Odebrecht enviado ao senhor Branislav Kontic, mas, de fato, direcionado ao senhor Antonio Palocci, que seria o chefe do senhor Branislav Kontic, com informações sobre esse prédio. Eu posso lhe mostrar, se o senhor quiser dar uma olhadinha…

Lula: Eu não quero ver documento endereçado ao Palocci, doutor.

Moro: Tá. O senhor sabe…

Lula: O Palocci esteva aqui, vocês não mostraram esse documento pra ele, mostraram?

Moro: Mostramos.

Lula: Eu não vi, no depoimento dele, esse documento.

Moro: Tá. Aqui consta referente ao prédio institucional, aí fala da Rua Haberbeck Brandão, prédio, Instituto… O senhor ex-presidente tinha conhecimento dessa mensagem eletrônica anteriormente?

Lula: Não. Não.

Moro: O senhor ex-presidente saberia me explicar por que o senhor Marcelo Bahia Odebrecht enviaria esses elementos ao senhor Antonio Palocci?

Lula: O Marcelo tá preso, é só a Polícia Federal perguntar pra ele, ou o Ministério Público. Ele já fez até delação, já assinou contrato pra fazer delação…

Moro: Sim, ele respondeu aqui que esse documento era… que essa mensagem era sobre o prédio na Haberbeck Brandão, que o Grupo Odebrecht estaria adquirindo no seu interesse.

Lula: Uhum.

Moro: O senhor não teve conhecimento disso?

Lula: Não tive conhecimento.

Moro: O senhor conhece o senhor Branislav Kontic?

Lula: Conheço porque trabalhava com o Palocci, tenho muito pouco contato com ele, mas conheço, eu sei que é uma pessoa da confiança do Palocci.

Moro: O senhor ex-presidente tinha conhecimento do envolvimento do senhor Branislav Kontic, de alguma forma, com esse prédio, ou com a busca de um prédio pro Instituto Lula ou pro Memorial da Democracia?

Lula: A única coisa que eu tenho conhecimento é que o Branislav trabalhava com o Palocci.

Moro: Senhor ex-presidente, havia algum plano, durante sua presidência, ou mesmo depois, de que o Grupo Odebrecht adquirisse um imóvel a qualquer título para o Instituto Lula ou pra esse Memorial da Democracia?

Lula: Não. Não.

Moro: O senhor ex-presidente nunca tratou desse assunto com o senhor Emílio Odebrecht?

Lula: Nunca tratei desse assunto nem com o Emílio Odebrecht, nem com o Marcelo, nem com o Palocci, e vou repetir aqui: a única pessoa que me comunicou do terreno chama-se doutor Paulo Okamotto, sabe? Obrigado, Moraes. Leva essa daqui e traga cheia quando puder. Sabe que, depois do câncer, eu sou obrigado a beber muita água, porque a garganta seca demasiadamente.

Moro: O senhor ex-presidente teve conhecimento se, eventualmente, foi solicitado o apoio do Grupo Odebrecht pra localização desse imóvel?

Lula: Não.

Moro: O senhor Marcelo Odebrecht e senhor Antonio Palocci relataram aqui em juízo — o senhor ex-presidente deve ter ouvido — a existência de uma espécie de conta-corrente informal, ou crédito, que a Presidência da República — no caso, o senhor — teria com o Grupo Odebrecht, que, através dessa conta, teria sido paga aos senhores esses valores indevidos, inclusive para aquisição desse prédio na Rua Haberbeck Brandão. O senhor mais ou menos adiantou as suas respostas, mas eu vou lhe perguntar expressamente: isso não existiu? Não aconteceu nada disso?

Lula: Isso não existiu, doutor Moro, e eu queria um pouco de paciência para dizer uma coisa que tá acontecendo no Brasil. Eu já disse, logo que eu vim aqui a primeira vez, que a desgraça de quem conta a primeira mentira é passar o resto da vida mentindo para justificar a primeira mentira. E aquele PowerPoint feito dizendo que o PT é uma organização criminosa, que o Lula, por ser a pessoa mais importante, era o chefe, e que, portanto, o governo do Lula foi feito para roubar, sabe, merecia, na verdade, um processo contra quem escreveu aquilo, a bem, a serviço da opinião pública. Pois bem, o Palocci veio aqui, e eu vi o Palocci — o senhor sabe que eu tenho uma profunda amizade com o Palocci há mais de 30 anos, não é uma coisa de um dia, sabe? O Palocci foi meu Ministro da Fazenda e prestou um grande serviço a esse país. Eu tirei o Palocci do governo em março de 2003 porque ele não conseguiu explicar uma coisa pequena. Saía a denúncia de que ele frequentava uma casa, sabe? E ele disse que não ia na casa; a oposição denunciou, o caseiro disse que ele ia, e ficou uma briga na imprensa, vai ou não vai, vai ou não vai? Eu lembro que eu vim a Curitiba inaugurar uma obra, acho que com o prefeito, e eu disse ao Palocci: “Ó, Palocci, se você não resolver esse problema do caseiro, quando eu voltar de Curitiba, eu vou tirar você do governo”, porque não é possível um Ministro da Fazenda ficar brigando com um caseiro!

Moro: Certo.

Lula: E voltei à tarde, o Palocci não tinha resolvido; eu, então, afastei o Palocci do governo. Eu ia exonerar, ele pediu para ele pedir demissão, falei “tudo bem, pode fazer isso”, e o Palocci, então, virou deputado, e foi deputado até 2010, tá? Eu tô lhe contando isso porque o senhor fala muito em contexto, e eu quero contar o meu contexto.

Moro: Certo.

Lula: Pois bem. Eu vi atentamente o depoimento do Palocci. Uma coisa quase que cinematográfica, quase que feita por um roteirista da Globo, sabe? Você vai dizer tal coisa, os leads são esses, prepararam alguns leads para ele dizer, e ele foi dizendo, habitualmente, lendo alguma coisa, falando, sabe? E eu conheço o Palocci bem. O Palocci, se não fosse um ser humano, ele seria um simulador.

Moro: Sei.

Lula: Sabe? Ele é tão esperto que ele é capaz de simular uma mentira mais verdadeira que a verdade. Palocci é médico, é calculista, é frio.

Moro: Nada daquilo é verdadeiro, então?

Lula: E ele... Nada é verdadeiro.

Moro: Certo.

Lula: A única coisa que tem verdade ali é ele dizer que ele está fazendo aquela delação porque ele quer os benefícios da delação. Ou, quem sabe, ele queira um pouco do dinheiro que vocês bloquearam dele.

Moro: Certo.

Lula: É a única coisa. Pois bem. E ele termina o depoimento dele da forma magistral, que o Ministério Público queria que ele dissesse: “O Lula conversou comigo sobre obstrução de justiça”. Eu venho ouvindo isso há tempos; o Delcídio falou a mesma coisa…

Moro: Certo.

Lula: Tá lembrado? Eu venho ouvindo isso.

Moro: José Aldemário também, não é?

Lula: E eu vou lhe dizer uma coisa: se tem um cidadão que tem coragem de olhar no seu olho, e no olho dos meus acusadores, e dizer que tem um cidadão nesse país que tirou o tapete da sala para que a podridão apareça, esse cidadão chama-se Luiz Inácio Lula da Silva. Portanto, eu não admito que ninguém diga que eu tento obstruir a justiça, porque eu, se não acreditasse na justiça, não estaria fazendo política.

Moro: Certo. Mas, senhor presidente…

Lula: Não, mas eu vou… Não, é que eu vou…

Moro: Não é a questão, é que aqui o senhor não responde por essa questão de obstrução de justiça.

Lula: Mas aqui tem que falar do contexto. Porque quando eu viro as costas, eu leio o Jornal Nacional transformar uma mentira em 20 minutos de Jornal Nacional. Então, doutor, eu sei que hoje é o meu dia de falar. Eu sei que hoje é o meu dia de falar. E eu vou falar o seguinte: eu não estou aqui com bronca de Palocci, eu estou apenas tentando falar o seguinte, a única verdade que ele disse ali foi de que ele estava fazendo a delação porque ele precisava de benefícios, e quem sabe do dinheiro que bloquearam dele.

Moro: Mas aí o senhor já está repetindo isso, né?

Lula: Eu vou repetir. Porque aqui se repete muita coisa, doutor. Aqui se repete muita coisa. Pois bem, então eu fiquei vendo o Palocci falar, ele inventou a frase de efeito pacto de sangue com Emílio Odebrecht, ele fez um pacto de sangue com os delatores, com os advogados dele e talvez com o Ministério Público, porque ele disse exatamente o que o PowerPoint queria que ele dissesse.

Há muito tempo, doutor, há muito tempo eu leio, eu escuto, eu converso com o advogado, e eu fico sabendo, todo mundo que é preso, a primeira pergunta é: “E o Lula? Você conhece o Lula? O Lula estava lá? Diga alguma coisa do Lula”. Isso faz dois anos e meio, doutor Moro.

Moro: Certo.

Lula: Eu lamento profundamente que o senhor tenha feito as denúncias.

Moro: Não, eu não fiz denúncia nenhuma, senhor ex-presidente.

Lula: Mas de qualquer forma, eu fiquei vendo o Palocci falar, sabe o que eu penso? Eu não tenho raiva do Palocci, eu tenho pena dele. Porque o Palocci é um quadro político excepcional da qual esse país não tem muitos.

Moro: Eu tenho algumas perguntas a lhe fazer sobre essa questão do Palocci.

Lula: Deixa eu falar um pouco dentro do meu contexto, o senhor fala, eu já repito ou não repito. Então o companheiro Palocci vem aqui e conta uma série de inverdades, ele fala de um fundo, sabe, que hora é 300, outra hora é 200, mas que ele não soube, ele não estava lá, fui eu que contei para ele. Ele fala do terreno com a maior desfaçatez, que foi na minha casa, que conversou com a dona Marisa, que eu pedi para a dona Marisa, para ele conversar com a Dona Marisa porque a Dona Marisa tinha, sabe, era muito brava…

Moro: Essa mensagem eletrônica, que eu lhe mostrei, não confirma o envolvimento do senhor Palocci nessa negociação?

Lula: Deixa eu falar uma coisa para você, eu não sei se ele estava envolvido ou não, doutor, eu não sei se estava, é problema dele, se estava envolvido ou não. Eu só não quero é que ele me envolva. Se ele está envolvido, se ele cometeu ilícito, ele que diga o que ele cometeu.

Veja, eu acho que eu tenho pena do Palocci e não raiva, porque o Palocci, o Palocci era uma figura política respeitada nesse país. Possivelmente, ele era o Ministro da Fazenda que mais estabeleceu relação de amizade com empresariado brasileiro. Então, ele podia conversar com todo mundo. Agora, tentar jogar nas minhas costas uma coisa que só ele sabia. O Lula conversava, e no dia seguinte ele me chamava. O Lula conversava, no dia seguinte ele me chamava. Como se ele fosse, sabe, eu fosse um cadeirante e ele tivesse carregando a minha cadeira.

Moro: Algumas perguntas pontuais, senhor ex-presidente.

Lula: Eu sei que o senhor vai perguntar muito sobre o Palocci, e eu quero responder muito sobre o Palocci.

Moro: Nem vou perguntar tanto. O senhor mencionou que o senhor demitiu o senhor Palocci do Ministério da Fazenda em 2006, não é? Isso?

Lula: Março de 2006.

Moro: O senhor continuou mantendo um relacionamento com o senhor Palocci a partir de então?

Lula: Mantenho.

Moro: Um relacionamento próximo?

Lula: Eu mantenho com todos os ministros que eu tirei e não foram poucos. É importante, doutor moro, o senhor saber, que o ministro das Minas e Energia foi tirado do meu governo por, também, denúncia antes da Dilma Rousseff, sabe, logo que a Dilma Rousseff saiu do Ministério de Minas e Energia.

Moro: E o senhor continuou mantendo um relacionamento, esse relacionamento que o senhor continua mantendo com o senhor Palocci é um relacionamento próximo ou não?

Lula: Ah, mantive relação. Eu gosto do Palocci, sabe?

Moro: Esse relacionamento era de amizade ou ele também, vamos dizer assim, ele aconselhava?

Lula: Era de amizade, era de amizade.

Moro: ele também aconselhava nas questões de governo ou não?

Lula: Deixa eu dizer uma coisa, o Palocci, o Palocci era um… ele tinha virado, ele fez uma opção de virar consultor. E ele era um cara que mantinha relações com todas as empresas que o senhor possa imaginar. Tá? E, portanto, o Palocci fazia debate econômico toda semana, todo mês, e, de vez em quando, eu conversava com o Palocci sobre a visão econômica do país. Conversava com ele, com o Meirelles, com o Guido Mantega; eu tenho um grupo de economistas que eu me reúno todo mês.

Moro: O senhor que indicou ele para ser ministro-chefe da casa civil da Dilma?

Lula: Não. Se o senhor leu o jornal O Globo? Aliás, o senhor se baseia muito no Globo, doutor Moro.

Moro: O Globo não é o acusador aqui, nem é o julgador, doutor.

Lula: Na minha condenação, o senhor cita o jornal O Globo 15 vezes, e não cita… cita acho que cinco testemunhas minhas que vieram aqui. Então precisa ler outros jornais.

Moro: Senhor ex-presidente, então, a pergunta objetiva é: foi o senhor que indicou ou não?

Lula: Não, não. Eu, na verdade, se o senhor ler O Globo, tem uma manchete entre a vitória da Dilma e a posse dos ministros, que eu era contra o Palocci ir para o governo. Eu era contra, mas, sabe, a Dilma indicou e como quem indica é a presidente, ele foi lá, ficou um tempo, não sei se 10 meses ou 11 meses na casa civil.

Moro: Com qual frequência o senhor se encontrava, aproximadamente, com o senhor Antônio Palocci depois que ele deixou o Ministério da Fazenda?

Lula: Depois que deixou o Ministério era difícil, não era sempre. Ele era deputado, ele tinha a vida dele, eu tinha a minha vida; eu tinha que governar o país, e ele tinha que legislar.

Moro: É possível apontar alguma periodicidade?

Lula: Ah, não! Pode ser de seis em seis meses, de oito em oito meses. Não era uma coisa…

Eu até achava que o Palocci tinha ficado muito ressentido comigo por tê-lo tirado do Governo.

Moro: Eu lhe indaguei aqui, mas acabou, talvez, não ficando clara a sua resposta, essa mensagem eletrônica que eu lhe mostrei, do senhor Marcelo ao senhor Brani, que é direcionada ao Palocci, falando do instituto, essa mensagem é de 2010, isso não demonstra envolvimento do senhor Antônio Palocci nessa questão do prédio? Do instituto?

Lula: Não sei se demonstra, doutor Moro. Eu não sei se demonstra.

Eu sei que o Palocci nunca conversou comigo sobre esse terreno. Essa é a coisa que eu sei.

Moro: O senhor entende que ele poderia ter trabalhado com isso sem que o senhor ex-presidente tivesse conhecimento?

Lula: Eu entendo que deve ter gente, sabe, que tentou trabalhar em meu nome em todo o território nacional.

Moro: Mas esse prédio não era para finalidade específica?

Lula: O senhor não tem noção de quantas pessoas estão falando em seu nome pelo país afora. O senhor não tem noção.

Moro: Mas esse prédio específico não tinha essa finalidade para o Instituto, ou para o Memorial da Democracia?

Lula: Tanto não tinha que eu não adquiri. Tanto não tinha, veja, o que me deixa pasmo, doutor Moro, é que eu estou sendo acusado do segundo prédio que eu não requeri, que não é meu, que não aceitei, portanto, eu não podia aceitar uma coisa que não era minha, sabe, como se fosse meu!

O Ministério Público vai ter que encontrar uma rota de fuga. Sabe o que é rota de fuga? Aquela que, na política, a gente sabe, de deixar uma janelinha aberta para eles saberem como é que eles vão sair da encalacrada que eles se meteram. É isso!

Moro: Nesse relato do senhor Marcelo Bahia Odebrecht, desses pagamentos que fariam, segundo ele, a Presidência da República ao grupo Odebrecht, há um apontamento aqui, em 2014, de doações ao Instituto Lula, de quatro milhões de reais. Esse fato não é objeto específico da denúncia, mas é um fato colateral relativo a essa planilha. Indagaria ao senhor ex-presidente, se o senhor acompanhou essa doação?

Cristiano Z. Martins: Excelência, pela ordem, qual seria esse documento que Vossa Excelência se refere?

Moro: A planilha, a tal da planilha italiano, que se encontra nos autos. Evento 1008, anexo dois. Consta ali doação ao instituto 2014, quatro milhões. O senhor ex-presidente chegou a tratar dessas doações?

Lula: Posso falar, doutor Moro? Eu não sou diretor do Instituto. O Instituto tem o meu nome, mas eu não sou o diretor. Eu sou o presidente de honra. O dia que o senhor for nomeado presidente de honra de alguma coisa, o senhor vai perceber que não vale nada ser presidente de honra.

Moro: O senhor ex-presidente acompanhava as atividades do Instituto?

Lula: Não. O Instituto tem uma diretoria que discute, e se alguém contribuiu com o instituto, está contabilizado. Sabe? É isso.

Moro: Senhor ex-presidente, então, não tratou dessas doações?

Lula: Não tratei e não trato.

Moro: Perfeito. Indo aqui para o final, consta, aparentemente, o senhor Temer adiantou essa resposta, mas eu gostaria de ouvi-la expressamente, uma resposta específica a essa questão. O senhor ex-presidente, ou pessoa ligada ao senhor ex-presidente, recebeu valores do grupo Odebrecht, não aqui falando em doações eleitorais registradas, mas doações informais ou qualquer espécie de vantagem financeira?

Lula: Quem eu?

Moro: Isso.

Lula: Não.

Moro: Ou pessoa ligada ao senhor, com o seu conhecimento?

Lula: Não. Não.

Moro: Não?

Lula: Não.

Moro: Está bom. São essas, em princípio, as indagações do juízo, eu passo ao Ministério Público. Eu vou interromper o áudio aqui, nós recomeçamos.

Moro: Nessa ação penal 5063130/17, continuidade do depoimento do senhor ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, então passo a palavra ao Ministério Público para as suas indagações.

Ministério Público: Embora eu já tenha respondido numa questão inicial, eu agora aproveito para cumprimentar Vossa Excelência, cumprimentar os presentes.

Moro: Queria pedir só para a doutora falar um pouquinho mais alto.

Ministério Público: Pois não. Cumprimento Vossa Excelência, cumprimento os presentes, e início as perguntas do Ministério Público. Com relação…

Lula: Doutora, se puder falar um pouco mais alto, eu agradeço.

Moro: Ele não aumenta o som, doutora.

Lula: Bota o microfone mais perto da boca.

Ministério Público: Com relação ao apartamento 121, vizinho ao que o senhor mora, em São Bernardo, o contrato de locação foi elaborado pelo advogado Roberto Teixeira?

Lula: Deve ter sido, porque o Roberto Teixeira é o companheiro que orienta as coisas que eu quero fazer. Ele é meu advogado.

Ministério Público: Quem solicitou a ele que minutasse esse contrato de aluguel? Foi o senhor?

Lula: Não. Não porque eu não estava, e, se fosse eu, eu teria assinado. O Roberto Teixeira deve ter recebido o comunicado do General, que era chefe da minha segurança, da questão do apartamento, e o Roberto Teixeira deve ter procurado a dona Marisa e conversado com a dona Marisa sobre a perspectiva de vender. Ao dizer que não ia comprar, sabe, apareceu o Glauco, não sei quem foi que falou para o Glauco ir lá, mas o Glauco é homem de negócio, sabe, e ele foi lá e comprou o apartamento e nos alugou, o que eu agradeço muito.

Ministério Público: E qual é a forma atual de pagamento dos aluguéis?

Lula: Eu agora estou pagando, depois que a Marisa morreu, estou pagando diretamente.

Ministério Público: Mediante depósito em conta?

Lula: Depósito. Eu acabei de falar, tem uma carta que ele mandou, eu acho que em fevereiro, pedindo para que fosse depositado o dinheiro no Banco do Brasil.

Ministério Público: E qual o valor atual do aluguel?

Lula: Quatro mil e pouco.

Ministério Público: Consta da quebra de sigilo bancário que o senhor ex-presidente fazia declaração conjunta de Imposto de Renda com sua esposa, Marisa Letícia. Nas declarações de Imposto de Renda, dos anos, calendário, dos anos de 2011 a 2014, está no evento 1, anexo 258 até o anexo 264 dos autos, consta que teria havido pagamento de aluguel pelo apartamento 121 nos valores então de 42 mil em 2011; 46.241,60 em 2012; 46.820 em 2013, e 49.820 em 2014, nos quatro anos, então, o total é de mais de 184 mil. O senhor prestou declarações à Receita Federal informando haver pago esses aluguéis?

Lula: Acabei de falar, doutora, que foi declarado no meu Imposto de Renda e o Glauco declarou que foi declarado no Imposto de Renda dele.

Ministério Público: Essa declaração, não tendo sido pagos os aluguéis, essa declaração então não é verdadeira?

Cristiano Z. Martins: Essa premissa de Vossa Excelência não foi colocada pelo depoente.

Ministério Público: Os aluguéis foram pagos?

Martins: A premissa de Vossa Excelência, depois esclareceu há pouco que quem cuidava da questão dos aluguéis era a dona Marisa, que fez a locação do imóvel, foi dito, esclarecido à Vossa Excelência, Vossa Excelência já tem a resposta.

Ministério Público: Não era o senhor que apresentava o imposto de renda?

Lula: Não, eu não apresentava, querida. Eu vou apenas repetir, pausadamente, aqui, eu não tratava dos meus assuntos caseiros, inclusive quem fazia o acerto, juntava papelada para declaração de Imposto de Renda, era a minha querida esposa. É isso.

Ministério Público: O senhor não tinha um contador para apresentar esse Imposto de Renda?

Lula: Tenho um contador. Como é o nome do contador? João Leite?

Ministério Público: Consta dos autos um bilhete do escritório de Roberto Teixeira, com informações sobre um somatório de aluguéis, o senhor tem conhecimento desse documento…

Lula: Não.

Ministério Público: Que está nos autos?

Lula: Não.

Ministério Público: Ele orientava com relação a como declarar seu Imposto de Renda?

Lula: Orientava.

Ministério Público: Senhor Roberto Teixeira?

Lula: Primeiro quem fazia a minha declaração de Imposto de Renda até 2000 e pouco era lá em São Bernardo, depois eu passei para fazer no escritório em São Paulo, que fazia dos meus filhos também.

Ministério Público: Eu não compreendi, então o escritório do senhor Roberto Teixeira o auxiliava na preparação do seu imposto?

Lula: Não, é que esse escritório de contabilidade trabalha para o escritório do Roberto Teixeira.

Ministério Público: Nas respostas escritas que o senhor ex-presidente prestou durante as investigações, está no anexo 273 do evento 1, o senhor ex-presidente disse que o pagamento do aluguel do apartamento 121 era realizado com emissão de recibos? O senhor disse isso expressamente.

Lula: Era o que eu tinha conhecimento.

Ministério Público: Mas o senhor disse isso sem ter os recibos à vista?

Lula: Vamos… veja, se havia declaração no Imposto de Renda do Glauco, e havia declaração no Imposto de Renda na minha contribuição, tinha que ter um recibo de pagamento para declarar, tá?

Ministério Público: O senhor afirmou existir esses recibos quando prestou declarações escritas na fase da investigação?

Lula: Deve ter o recibo, sim.

Ministério Público: O senhor informou isso sem estar com os recibos à sua vista?

Lula: Deve ter o recibo, o recibo não fica comigo, mas isso pode ser pego e enviado, se é para o Moro ou para a senhora.

Ministério Público: O senhor não achou relevante juntar esses recibos?

Lula: Não. Não, porque…

Martins: Se Vossa Excelência quiser questionar a defesa em relação à defesa, eu estou aqui para esclarecer. Agora, me parece um pouco inapropriado o Ministério Público pretender questionar aquilo que está a cargo da defesa.

Moro: A pergunta fica mantida, pergunta relevante sim.

Martins: Então a defesa técnica orienta que o depoente não responda, porque as questões da defesa técnica quem responde é a defesa técnica.

Moro: Se quiser refazer a pergunta ou ir para a próxima.

Ministério Público: O senhor não achou relevante juntar esses recibos nos autos?

Martins: Mais uma vez a defesa técnica orienta que não responda, porque isso já foi esclarecido.

Ministério Público: Só que é preciso, então, que o depoente diga se não vai responder, não é isso?

Martins: Isso já foi esclarecido…

Ministério Público: O senhor não vai responder?

Lula: Precisa? Eu não vou responder, doutora, porque eu já falei três vezes, a senhora repete a mesma pergunta.

Ministério Público: O senhor Glauco da Costa Marques ouvido nesses autos, relatou aqui em juízo que Roberto Teixeira o procurou em 2015, quando ele estava, inclusive, hospitalizado para dizer que o aluguel do apartamento 121 passaria a ser pago. Quem orientou o Roberto Teixeira a procurar Glauco e dizer isso? Foi o senhor?

Lula: Olha, o Roberto Teixeira não procurou o Glauco, pelo que eu sei o Roberto Teixeira estava internado.

Ministério Público: Na mesma época que o senhor Glauco estava para um tratamento de tireoide?

Lula: Ninguém, deixa eu lhe falar uma coisa, doutora, ninguém, eu até ontem no depoimento do Glauco, até ontem… até a semana passada, no depoimento do Glauco, eu tenho clareza, certeza, que o aluguel estava sendo pago no dia 01 de fevereiro ao dia útil, dia primeiro agora, tá? Para mim foi surpresa, porque o Glauco nunca reclamou para mim, de que não estava sendo pago até 2015. Porque a senhora há de convir.

Ministério Público: O senhor José Carlos Bumlai também não o fez?

Lula: Não, não.

Ministério Público: Quando os proprietários do apartamento 121 notificaram a Presidência da República, em 2010, que pretendiam vender o apartamento, o senhor ex-presidente adotou alguma providência? O senhor falou com o Roberto Teixeira sobre esse apartamento?

Lula: Não, o Roberto Teixeira comunicou que ele estava querendo vender o apartamento e depois comunicou que o Glauco tinha comprado e queria alugar o apartamento e foi feito o contrato com a dona Marisa. É isso.

Ministério Público: O senhor Antonio Palocci relatou em juízo aqui, nesta ação penal, que o senhor ex-presidente lhe disse em 2010 que havia gostado de usar o apartamento 121 e estava pensando em comprá-lo. O senhor ex-presidente tinha esse interesse? Disse isso a Palocci?

Lula: O Palocci disse o quê?

Ministério Público: Que o senhor lhe disse, em 2010, que havia gostado de usar o apartamento 121 durante o período em que a Presidência da República mantinha o contrato de aluguel com os proprietários e estava pensando em comprá-lo.

Lula: O que menos a Marisa queria era continuar morando naquele prédio. A Marisa ficou lá por insistência minha de não querer sair de São Bernardo do Campo, que é minha origem, porque eu estou próximo do sindicato que me fez fazer política e crescer na política, por isso que ela ficou lá. Mas, jamais a Marisa iria admitir comprar o apartamento. Na verdade, ela queria mudar de lá.

Ministério Público: O senhor ex-presidente tem como explicar a coincidência de Glauco da Costa Marques ter intermediado a compra do imóvel da rua Doutor Haberbeck Brandão e também ter comprado o apartamento 121?

Lula: Eu não tenho, querida, coincidência não é comigo.

Ministério Público: O senhor pode explicar a sua relação com Glauco, aliás, a relação de Glauco da Costa Marques com seu filho Luís Cláudio?

Lula: Não.

Ministério Público: Eles não têm nenhum relacionamento?

Lula: Deve ter relação, mas eu não sei explicar.

Ministério Público: Eles têm alguma relação de amizade?

Lula: Hoje não, hoje acho que não.

Ministério Público: Já tiveram?

Lula: O Glauco disse aqui, no depoimento, que tentou abrir o escritório e que não deu certo e faliu. Ele disse aqui no depoimento.

Moro: Mas acho que a pergunta é se o senhor ex-presidente tinha conhecimento à época.

Lula: Não. Na época, eu estava na Presidência da República desse país, tendo preocupação com 204 milhões de pessoas.

Ministério Público: Certo. Glauco da Costa Marques era proprietário da empresa Billmaker 600, e, na sua residência, na residência do senhor ex-presidente lá em São Bernardo, foi arrecadado um contrato de opção de compra de cotas dessa empresa Billmaker 600, datada de 16 de dezembro de 2009, em favor de seu filho Luís Cláudio. Isso está no evento 1, anexo 280 — não sei se o senhor quer ver esse documento…

Lula: Não tenho a menor noção, querida.

Ministério Público: O senhor pode explicar por que seu filho Luís Cláudio tinha esse contrato com o Glauco?

Lula: Olha, eu não tenho como explicar. Se eles tinham escritório juntos, se tinham montado escritório em São Paulo, pode ter explicação. O que eu sei, pela declaração do Glauco, é que a empresa faliu por falta de serviço. Aliás, no meu tempo de governo, a coisa mais comum nesse país era a pessoa montar empresa. Todo mundo pegou mania de virar empresário, sobretudo quando nós legalizamos e formalizamos o microempreendedorismo no país, né? Acho que foi o maior período de criação de empresas, todo mundo queria montar uma empresinha.

Ministério Público: O senhor tinha conhecimento que sócios dos seus filhos eram também sócios de Glauco da Costa Marques?

Lula: Não.

Ministério Público: Que utilizavam o mesmo endereço comercial dele?

Lula: Também, se eram sócios, só poderiam utilizar.

Ministério Público: Agora, algumas indagações com relação ao imóvel da Rua Haberbeck Brandão e, inicialmente…

Lula: Finalmente, é pra isso que eu vim aqui.

Ministério Público: É objeto da acusação também a questão da aquisição do apartamento vizinho, por isso as perguntas que foram formuladas anteriormente ao senhor.

Lula: Isso é suposição de vocês, ilação de vocês, sabe? Porque o que menos preocupa vocês agora é prova.

Moro: Certo. Senhor ex-presidente, talvez o senhor esteja um pouco… rancoroso, mas, assim, é a oportunidade que o senhor tem de responder às questões, certo?

Lula: Eu não tô rancoroso. Eu não tô rancoroso, eu fico preocupado, doutor Moro, eu fico preocupado quando as pessoas inventaram uma história e tentam, a cada momento, transformar aquela inverdade em verdade.

Moro: Certo. Mas, veja, senhor ex-presidente, é a oportunidade que o senhor tem de responder às questões.

Lula: Doutor, doutor, eu tenho muita experiência, sabe? Eu tenho muita experiência. Quando você senta numa mesa, qualquer que seja a mesa, com mais gente, pra fazer negociação, ou você senta com a disposição de trabalhar seriamente, fazer apuração corretamente, ou você senta com a disposição de que não vai dar certo, ou senta com a disposição de que vai dar certo. No caso do Ministério Público, eu já disse mais de uma vez pro senhor: eles contaram uma grande mentira com o PowerPoint. Não o Ministério Público, mas o Ministério Público da Lava Jato, e eu quero ver como é que eles vão sair dessa.

Moro: Eu já entendi esse seu ponto, senhor ex-presidente, mas eu peço que o senhor responda…

Lula: Eu vou responder às perguntas.

Moro: Se o senhor não quiser responder, o senhor não responda.

Ministério Público: Pois não. Eu, então, prossigo: o senhor ex-presidente pode explicar como surgiu a ideia de criar o Instituto Lula? Quando foi isso?

Lula: Não, eu tinha o Instituto Cidadania. Criado em 1992.

Ministério Público: Mas em que momento do seu mandato presidencial?

Lula: Foi de lá que eu saí candidato a Presidente da República, foi de lá que eu perdi duas eleições, tá? Quando eu deixei a Presidência da República, nós fomos discutir se ia criar uma fundação ou ia criar um Instituto. Optou-se pela criação do instituto, e eu optei voltar ao Instituto Cidadania para que, estando lá, a gente pudesse discutir o que fazer, como construir o tal do Memorial da Democracia, sabe? E ficamos pensando nisso, e fomos procurar terreno, fomos procurar os imóveis que eu já falei, sabe? E aí o Paulo Okamotto pediu pra visitar esse terreno. Mas a ideia de criar o Instituto, sabe, ela aconteceu depois que eu deixei a Presidência da República, porque, se eu quisesse pensar antes, eu teria feito como outros presidentes: ter feito dinheiro enquanto estava na Presidência.

Ministério Público: O senhor disse que conversou sobre o Instituto apenas com o senhor… sobre a questão da compra desse prédio com Paulo Okamotto, não é?

Lula: Desse prédio.

Ministério Público: Desse prédio. E com relação ao senhor Emílio Odebrecht, o senhor conversou a respeito do prédio, ou da ideia deste…

Lula: Nunca. Nunca.

Ministério Público: E da ideia do Instituto?

Lula: Nunca. Nunca. Eu vou repetir, alto e bom som: eu não discutia Instituto enquanto eu fui Presidente da República nem com a minha mulher, nem com meus filhos, nem com meus ministros. Eu não queria discutir o meu futuro enquanto eu estivesse preocupado com o povo brasileiro, dirigindo esse país.

Ministério Público: Pois não. Consta dos autos, juntado no evento 928, anexo 8, uma pauta de reunião do senhor Emílio Odebrecht com o senhor ex-presidente da qual consta, realizada no dia 30/12/2010, da qual consta, dentre diversos outros temas elencados — o primeiro deles era passagem do histórico da parceria, isso no penúltimo dia do seu mandato —, disponibilizar apoio junto ao Congresso era um dos outros itens da pauta, e, ao final, referido nessa pauta, “com ele” — ou seja, falar com ele — “estádio Corinthians, obra sítio, 15/01, primeira palestra Angola e Instituto”.

Cristiano Z. Martins: Pela ordem, excelência, pela ordem. Primeiro, isso…

Ministério Público: Quer examinar o documento?

Martins: Não, na verdade, primeiro que esse documento é apócrifo. Segundo que esse documento é objeto de um incidente de falsidade que não foi solucionado, então, tendo em vista que existe um incidente de falsidade não solucionado pelo juízo, então, me parece que esse documento…

Ministério Público: Este documento, esta pauta de reunião?

Martins: Este documento foi juntado no dia 30 deste mês pelo senhor Marcelo Odebrecht.

Ministério Público: Não, foi juntado pelo Ministério Público.

Martins: Sim, que o senhor Marcelo Odebrecht forneceu ao Ministério Público…

Ministério Público: … colaboração apresentado por Emílio Odebrecht no bojo do seu acordo de colaboração premiada.

Martins: Eu só gostaria de ter a palavra…

Moro: Espera aí, a questão aqui não é o momento de discutir a autenticidade desse documento, é pergunta se conhece ou não conhece e se isso aconteceu, é isso que ele vai responder. A questão de deferir se documento é falso, se é verdadeiro, se é unilateral é outro momento, doutor, não é o que o seu cliente vai responder.

Martins: É que existe um incidente de falsidade, primeiro; segundo: eu observo que isso, na verdade, não é uma agenda, é um documento apócrifo.

Moro: Perfeito, mas, assim, o Ministério Público está indagando ao acusado sobre ele, simplesmente ele vai responder sim ou não, branco ou preto, não pode impedir a pergunta em relação a isso.

Martins: Não estou impedindo a pergunta, é que a pergunta afirma que seria…

Moro: Afirma um documento.

Martins: Que seria uma agenda. Então, o que eu estou observando, em primeiro lugar, é que isto é um papel apócrifo. Segundo lugar: a defesa técnica arguiu um incidente de falsidade em relação a este documento e em relação a outros que não foi sequer processado pelo juízo até o momento.

Moro: Não, está sendo processado, doutor, e vai ser decidido no momento próprio.

Martins: Não, é que Vossa Excelência não processou na forma da lei.

Moro: Agora o momento é diferente, agora é momento do interrogatório, então nós estamos ouvindo o seu cliente, e as perguntas serão feitas…

Martins: Só que a defesa…

Moro: … oportunidade de responder…

Martins: A defesa não só tem o direito, como tem o dever de fazer as suas colocações, e eu tenho esse direito…

Moro: Então, feitas as colocações, vamos adiante.

Martins: Apenas que Vossa Excelência leve em consideração esses aspectos.

Ministério Público: Senhor ex-presidente, no dia 30/12/2010, no penúltimo dia do seu mandato, o senhor teve reunião com Emílio Odebrecht e com a presidente Dilma?

Lula: Primeiro, fazer uma resposta dessa coisa aí: primeiro, essa agenda é mentirosa, ela não existiu. Se alguém escreveu isso, esqueceu, sabe, de colocar um pingo de verdade aí. Eu conversei com Emílio Odebrecht no dia 30 de dezembro, era o penúltimo dia; eu tinha ido à Bahia inaugurar um milhão de contratos do “Minha Casa, Minha Vida” e o Emílio Odebrecht me pediu o seguinte: “Presidente, eu tô em Brasília, eu tô passando o comando da empresa para o Marcelo Odebrecht e eu estava querendo ver se a presidenta Dilma nos recebia”. Eu falei com a Dilma: “É possível receber?”. Recebeu. Eu acho que não durou dez minutos essa conversa. Não durou dez minutos essa conversa, até porque a Dilma estava em fase de preparação, de escolha de Ministério, em fase de preparação da tomada de posse, que era dia 1º de janeiro, e, portanto, a Dilma não tinha tempo de fazer agenda, sabe? Só se o Papa pedisse — esse Papa, né, pedisse, ela possivelmente faria. Mas a Dilma não tinha mais agenda, a Dilma acho que atendeu num gesto de cortesia.

Ministério Público: O senhor referiu esta reunião ao senhor Palocci no dia seguinte?

Lula: Não. Aí é outra coisa, sabe, sobre o Palocci: eu vi atentamente o Palocci contar essa história. Eu vi, e a desfaçatez do companheiro Palocci foi de tal magnitude que ele inventou uma história como o Emílio foi lá, foi discutir um fundo que tinha sido criado e foi discutir a manutenção desse fundo, a manutenção da relação dele com a Dilma… Eu não sei se vocês sabem que a Dilma foi a mulher que cuidou do PAC, que foi o maior programa de investimento em infraestrutura da história recente desse país.

Moro: E qual que é a relação?

Lula: Portanto, a Dilma prestava conta à imprensa a cada três meses. E todo e qualquer empresário, que tinha obra de infraestrutura nesse país, conversava com a ministra Dilma Rousseff, porque ela era, foi denominada por mim em junho de 2007, na Favela da Rocinha, a mãe do PAC. E eu exigia que ela tivesse entrevista coletiva a cada três meses.

Moro: Certo, senhor ex-presidente, aí está saindo do objeto.

Lula: Não estou saindo do objeto, não. Isso faz parte do objeto. Faz parte do objeto, saber a relação da Dilma com as pessoas.

Moro: Então, diga mais diretamente a relação da Dilma com o senhor Emílio ou com o senhor Odebrecht.

Lula: A Dilma tinha relação com as empresas, porque a Dilma era a ministra que cuidava do PAC. É importante saber disso porque eu sei qual é a malícia da pergunta. E eu sei a resposta do Palocci aqui. Eu vou dizer uma coisa, doutora.

Ministério Público: A pergunta é objetiva: o senhor relatou ao senhor Palocci, no dia seguinte, este encontro?

Lula: Acabei de dizer, o Emílio esteve no palácio no dia 30, numa conversa que não deve ter durado 10 minutos.

Ministério Público: Certo. Não tratou de Instituto, de sítio? De contribuições?

Lula: Não tratei! Jamais! Jamais! Eu vou dizer para a senhora aqui, jamais o Emílio Odebrecht, que é um empresário que eu tenho profundo respeito, tratou comigo de qualquer dinheiro para o PT. Jamais! Eu não era tesoureiro do PT, eu não era da direção nacional do PT, o PT tinha tesoureiro e a campanha tinha tesoureiro, portanto, não havia por que ir conversar comigo. Eu nunca admiti nem ao Emílio, nem a nenhum empresário deste país, que discutisse comigo um centavo. Nunca!

Por isso que eu digo sempre, eu desafio vocês do Ministério público, da operação Lava Jato, desafio a Polícia Federal, a encontrar nesse país alguém que discutiu comigo um real.

Ministério Público: O senhor Emílio Odebrecht, em depoimento prestado aqui ao juízo, informou que o senhor credenciou Antônio Palocci para ser a pessoa com quem a empresa faria contato via Marcelo Odebrecht num momento e no momento anterior a Marcelo Odebrecht, a Pedro Novis. Que o senhor credenciou Antônio Palocci para ser a interlocução entre a empresa e o senhor, e o senhor ex-presidente.

Lula: Posso responder?

Eu não sei, não sei qual foi a pergunta que levou Emílio Odebrecht a dizer isso, mas deixa eu dizer uma coisa, o Palocci não era da direção do PT. O Palocci não era tesoureiro de campanha. Portanto, o Palocci não cuidava de dinheiro. Ora, se alguém se apresentava para algum empresário utilizando o meu nome, é outros 500. É outra ação que vocês vão ter que mover contra quem se aproveitou do meu nome. Mas nunca foi dada a autorização ao Palocci ou a quem quer que seja para negociar recursos com qualquer empresário nesse país. Se alguém quisesse conversar com finanças, fosse procurar o tesoureiro da campanha. O tesoureiro que tem endereço fixo, que prestou conta da campanha, que entregou na Justiça Eleitoral, ou se quiser conversar com doação ao PT, sabe, procurar o tesoureiro do PT.

Ministério Público: O senhor mantinha, fazia, realizava reuniões frequentes com o senhor Emílio Odebrecht?

Lula: Ah, muitas reuniões com o Emílio e com todos os empresários. Eu vou repetir, eu criei o conselho de desenvolvimento econômico e social. Um conselho que participavam os mais importantes empresários brasileiros, participavam índios, participavam pastores.

Ministério Público: Marcelo Odebrecht participava desse conselho?

Martins: Vossa Excelência poderia…

Lula: Participava o movimento negro, participavam sindicalistas. Eram por volta de cem pessoas das mais importantes do país, eu quero crer que o Marcelo Odebrecht participava. Eu quero crer.

Ministério Público: E o senhor José Carlos Bumlai também?

Lula: Acho que participava.

Ministério Público: Por designação do senhor?

Lula: Não, eu não nomeava as pessoas, as pessoas eram indicadas pelos ministros, normalmente discutindo com o ministro da área que cuidava disso, que era o ministro da organização política, e esse ministro trazia para mim a lista de nomes se eu referendava, se eu tinha vetos, e eu validava os nomes, e essas pessoas passavam a participar do fórum social mundial, que prestaram um grande e relevante serviço à República Federativa do Brasil.

Moro: Essas questões não são relevantes, conselhos…

Ministério Público: Como houve a menção. Está nos autos a comprovação dessa designação inclusive de Marcelo Odebrecht, por isso eu fiz a pergunta. Voltando a questão do imóvel da rua Haberbeck, o excelentíssimo magistrado indagou ao senhor sobre um e-mail trocado entre Marcelo Branislav, assessor de Palocci, e Marcelo dizia que ia atualizar Antônio Palocci sobre o novo prédio, e Marcelo e Antônio Palocci relataram em juízo que esse novo prédio era o da rua Haberbeck. O juízo perguntou ao senhor a propósito dessa troca de mensagens, e o senhor disse que não deu ordens para ninguém tratar do Instituto antes de sair da presidência, né?

Mas por que Antônio Palocci, nessa mensagem eletrônica, estava em contato com Roberto Teixeira? O senhor sabe dizer?

Lula: A senhora poderia ter perguntado para o Palocci.

Ministério Público: Ao que tudo indica, a mensagem de chefe, referente ao prédio institucional RT, adiou para essa quinta-feira.

Lula: A senhora poderia ter perguntado para o Palocci que veio aqui, ou pode perguntar para o Roberto, que vai prestar depoimento tal dia, eu não sou obrigado a saber dos e-mails do Palocci para o Emílio Odebrecht, para o Marcelo Odebrecht, para quem quer que seja. Eu não sou obrigado a saber.

Ministério Público: Mas o senhor sabia que o Roberto Teixeira estava lidando com este imóvel da rua Haberbeck?

Lula: A senhora está dizendo, eu disse aqui para o doutor Moro que o Roberto Teixeira deve ter sido contratado, deve ter sido contratado para legalizar para o senhor Glauco o terreno, que estava totalmente legal, segundo declaração do seu Glauco. É isso.

Ministério Público: É que foram arrecadados, na sua residência, em São Bernardo, e-mails trocados, em fevereiro e março de 2010, entre Roberto Teixeira, a empresa de Roberto Teixeira, de nome Mito Participações, de familiares de Roberto Teixeira e a corretora de imóveis Edna. Falando sobre esse imóvel da rua Haberbeck, estava no, na sua residência, em São Bernardo, essa troca de e-mails. É o documento constante do anexo 267, 267 não, o anexo 223 e 272, do evento um.

Lula: Doutora, deixa eu lhe falar uma coisa, doutora.

Ministério Público: Se o senhor desconhecia a existência, a participação de Roberto Teixeira com relação a esse imóvel…

Lula: Eu acabei de dizer, doutora.

Sérgio Moro: Só deixa ela terminar a pergunta, doutor. Senhor ex-presidente.

Ministério Público: Como o senhor explica que esses e-mails tenham sido arrecadados na sua residência?

Lula: Veja, eu não uso e-mail porque não uso computador, por segurança. Se um Presidente da República que diria assim, se você quiser fazer as coisas e não quiser ser bisbilhotado por ninguém, não fale por telefone, não converse em restaurante, caminhe com a pessoa e vá falando na estrada. Então, veja, eu não tenho e-mail. Marisa não tem e-mail. Ora, se um e-mail estava lá em casa, pode ter sido alguém que levou para dizer o seguinte, olha…

Ministério Público: É uma cópia do documento. Estava na pasta.

Lula: Eu não sei quem levou.

Martins: A senhora tem que esperar a resposta, a senhora interrompe a resposta. A senhora está fazendo a pergunta, a senhora tem que aguardar a resposta. Ele está desenvolvendo o raciocínio, então a senhora pode aguardar o término da resposta.

Moro: Vou interromper um minutinho aqui. Então responda.

Lula: Eu não quero parecer indelicado com a senhora, eu tenho muita suspeita de cópia, tenho muita suspeita de cópia, se a senhora tivesse me dito que estava no meu e-mail, no meu computador, eu dava um valor, mas uma cópia de um documento na minha casa, quem é que achou isso? A Polícia Federal?

Ministério Público: É que eles estavam cuidadosamente guardados.

Lula: A Polícia Federal? Como é que a senhora sabe que estavam cuidadosamente guardados?

Ministério Público: Em uma pasta, houve a descrição no laudo da polícia.

Lula: Então, deixa eu lhe falar uma coisa, querida. Eu hoje passado todos esses meses, eu tenho muita suspeita do comportamento da Polícia Federal nessas ocupações. Muita. Quero deixar claro que eu tenho muita suspeita da Polícia Federal nessas ocupações. Só para a senhora saber, por isso eu não posso dar crédito à cópia de um e-mail.

Ministério Público: O senhor também disse que desconhecia o envolvimento de José Carlos Bumlai na compra desse imóvel, e o contrato, a minuta de contrato de opção de compra estava também na sua residência. Também arrecadado na sua residência.

Moro: Mas isso já respondeu, doutora. Eu vou…

Ministério Público: Já perguntou?

Moro: Já perguntei.

Ministério Público: Pois não. Ainda em 2010, foram veiculadas notícias de que o Instituto Lula já estava sendo projetado. É uma matéria jornalística que está juntada na inicial da denúncia, de 08/11/ 2010, portanto durante o mandato do senhor.

Lula: Quem falou, doutora?

Ministério Público: A matéria diz o seguinte…

Moro: Eu vou interromper pelo tamanho do áudio e já retomamos.

Moro: Então nessa ação penal 5063130/17, continuidade do depoimento do senhor ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva... o Ministério Público falava então nessa matéria?

Ministério Público: Eu me refiro, essa matéria está na nota de rodapé 386 da denúncia, é uma matéria veiculada no portal UOL, dizendo que já havia um espaço físico reservado para ser a sede do Instituto, localizado perto do Parque do Ibirapuera, o imóvel da rua Haberbeck exatamente fica nesse local, lindeiro, Avenida 23 de Maio, próximo ao Parque do Ibirapuera e que esse projeto era tocado por um grupo de apoiadores. O senhor ex-presidente saberia explicar como a imprensa já sabia isso em 2010?

Lula: Tem tanta coisa que a imprensa já sabe que a senhora não sabe, doutora, tem tanta coisa, doutora. Então, doutora, é o seguinte: a senhora pode abrir um processo contra o jornalista do UOL que escreveu isso e ele pode explicar para a senhora.

Ministério Público: Pois não. A matéria diz: “um prédio de três andares, próximo ao Parque do Ibirapuera, em São Paulo, está reservado para ser a sede”. A mesma matéria diz, “segundo a fonte, Lula e Marisa já visitaram o local, em princípio, o Presidente avaliou que o prédio seria muito grande, já Marisa, que deverá dar a palavra final, gostou do espaço”.

Lula: Essa matéria é uma desfaçatez, eu visitei o prédio com dona Marisa em junho de 2011 para dizer que nós não íamos adquirir aquele prédio, que não tinha nenhuma utilidade aquele local para fazer. E que a gente iria pedir o terreno.

Ministério Público: Certo. Quem marcou essa visita, a que o senhor está fazendo referência de 26 de julho de 2011?

Lula: O Paulo Okamotto, Presidente do Instituto Lula.

Cristiano Z. Martins: Que data venia já foi referido aqui, já foi esclarecido... por isso eu pediria à Vossa Excelência que observasse as respostas que já foram dadas, a fim de que não haja repetição das perguntas.

Ministério Público: Pois não. Nas respostas escritas que o senhor ex-presidente prestou nas investigações, evento 1, anexo 273, o senhor ex-presidente disse que não houve nenhum contato com o Grupo Odebrecht e reafirmou isso aqui hoje, com respeito ao imóvel da rua Doutor Haberbeck. Eu gostaria de mostrar ao senhor esses e-mails, e-mails juntados aos autos, trocados entre Paulo Okamotto - que o senhor disse que era a única pessoa que conhecia, né, com quem o senhor tratou da questão do terreno - e João Alberto Louveira, empregado da Odebrecht, agendando a visita do dia 26 de julho de 2011 no imóvel. O evento 1, anexo 248, o senhor quer ver o e-mail?

Lula: O companheiro Paulo Okamotto já esteve aqui. Deixa eu lhe falar, a senhora não pode ficar perguntando para mim, e-mail de João falando com Maria, se eu sou o Lula.

Ministério Público: Não, é porque como o senhor dizia que o Paulo Okamotto...

Lula: Tem algum e-mail pra mim? Doutora, tem algum e-mail pra mim? Tem algum e-mail pra mim, doutora?

Ministério Público: E o senhor esteve no imóvel e houve uma troca de mensagens com relação a esse imóvel...

Lula: Doutora, tem algum e-mail pra mim?

Ministério Público: Fica aí a pergunta do Ministério Público.

Lula: Doutora, tem algum e-mail pra mim?

Ministério Público: O senhor esteve nessa...

Martins: A senhora pode esperar o depoente fazer a resposta?

Ministério Público: Eu estou respondendo a pergunta, inclusive.

Moro: Doutor, vamos aqui. A questão colocada ao senhor é o seguinte: o senhor tinha conhecimento dessas mensagens?

Lula: Não tinha conhecimento, doutor, eu só queria que a senhora perguntasse de coisas que foram direcionadas a mim.

Moro: Certo. Veja, senhor ex-presidente, é uma pergunta normal. Olha, “teve conhecimento disso ou não teve conhecimento disso?”. Pronto. Não tem necessidade.

Lula: Mas, doutor, o senhor sabe que uma coisa repetida muitas vezes.

Moro: Não, é a oportunidade que o senhor tem de se defender. Então a pergunta é normal. Olha, têm e-mails do fulano “X” com fulano “Y”, o senhor teve conhecimento disso?

Martins: É que já foi respondida, Excelência. O que é anormal é a repetição.

Moro: Não, essa pergunta não foi feita.

Lula: Doutora, então deixa eu fazer uma pergunta para entender.

Moro: Não, não, não, vamos seguir as indagações.

Orador não identificado: O ex-presidente, por favor...

Lula: Permito.

Orador não identificado: O senhor ex-presidente me permite uma colocação. O que a minha colega estava dizendo é que o senhor até o presente momento tem apontado o senhor Paulo Okamotto como sendo a pessoa, o seu interlocutor para esses assuntos, e esses e-mails eram justamente dirigidos ao Paulo Okamotto, e é só essa a questão.

Lula: Posso corrigir?

Martins: Não foi apontado como interlocutor, acho que a afirmação de Vossa Excelência não corresponde com o que foi dito pelo depoente. O depoente disse que foi informado da visita pelo senhor Paulo Okamotto, não usou a palavra “interlocutor”, que foi usada por Vossa Excelência.

Orador não identificado: Não era o Paulo Okamotto que tratava desse assunto?

Lula: Não, mas deixa eu falar, doutor. É que o Paulo Okamotto é presidente do Instituto Lula, doutor. Ele é o presidente, as pessoas não tinham nenhuma obrigação de conversar comigo sobre o Instituto. O Instituto tem uma Diretoria. O Instituto tem Conselho Fiscal. Eu só estou querendo dizer, o Paulo Okamotto era o presidente, aliás, é o presidente do Instituto, que tem um Conselho, sabe, que tem uma Direção, e que, portanto, o Paulo não estava lá me representando, o Paulo estava discutindo as coisas em nome do interesse do Instituto.

Quando o Lula morrer, que não existir mais, não é? Todo mundo falando que não vai morrer, eu espero demorar muito, ou seja, o Instituto deve continuar. Não vão tirar o meu nome porque eu morri. Então se o Paulo for prudente, ele vai continuar tratando do Instituto Lula do mesmo jeito.

Ministério Público: Pois não. Nas respostas escritas que o senhor prestou durante as investigações, anexo 273, evento 1, o senhor ex-presidente diz que o imóvel da rua Haberbeck teria sido oferecido ao Instituto da Cidadania, mas que recusou a aquisição conforme deliberação da Diretoria. O item E da resposta desse anexo a que fiz referência, o senhor ex-presidente poderia explicar quando a Diretoria se reuniu para deliberar sobre isso?

Lula: Não sei, querida. Não sei.

Ministério Público: Como ocorreu essa deliberação?

Lula: Uma deliberação... no dia que eu fui lá, pelo menos.

Ministério Público: Houve uma reunião específica para isso?

Lula: Não. Eu fui convidado a ir visitar o terreno, que era um terreno que estava sendo oferecido para a compra, e nós fomos lá e achamos inadequado.

Ministério Público: E essa deliberação foi formalizada de alguma maneira?

Lula: Não, deve ter sido depois, na reunião da direção deve ter discutido que não aceitou.

Ministério Público: O senhor tem conhecimento da formalização?

Lula: Não tenho, querida. Não tenho.

Ministério Público: Também pediria que o senhor ex-presidente referisse ao membro do Ministério Público pelo tratamento protocolar devido.

Lula: Como é que seria? Doutora...

Moro: Senhor ex-presidente, vou pedir, realmente, até peço escusas, não percebi isso de maneira tão clara, sei que, evidentemente, o senhor ex-presidente não tem nenhuma intenção negativa em utilizar esse termo “querida”, mas peço que não utilize, pode chamar de “doutora”, “senhora procuradora”.

Lula: Está bem. Está bem.

Moro: Perfeito?

Ministério Público: O senhor Alexandrino Alencar relatou aqui em juízo que o Grupo Odebrecht continuou procurando imóveis para o Instituto Lula, depois da visita feita em julho de 2011, ao imóvel da rua Haberbeck. Foi, inclusive, apresentado um projeto feito pela Odebrecht para a reforma do atual prédio do Instituto Lula, aquela sede localizada no Ipiranga, o senhor teve conhecimento disso?

Lula: Eu não tenho conhecimento, doutora, e acho que é mentira, porque depois que nós fomos ver e achamos inadequado. Nós fomos à Prefeitura de São Paulo falar com o prefeito Kassab, que aceitou mandar um projeto de lei para a Câmara de Vereadores, doando um terreno na “Cracolândia” para que nós fizéssemos o Instituto. A Câmara de Vereadores aprovou o terreno, e com base nesse terreno, nós começamos a elaborar um projeto do que seria o futuro Memorial da Democracia.

Ministério Público: Eu não me refiro, na pergunta que fiz, ao projeto apresentado pelo escritório de arquitetura de Marcelo Ferraz para o terreno da área central de São Paulo. Eu me refiro aos projetos que estão juntados nos autos, no evento 928, que são projetos produzidos pela Odebrecht, segundo Alexandrino Alencar, a pedido e que houve grande prospecção de imóveis durante mais de dois anos para o Instituto Lula, após a desistência, o senhor confirma esse fato? Houve?

Lula: Não confirmo e não acredito nisso.

Ministério Público: O senhor tem conhecimento? Não?

Lula: Não.

Ministério Público: Pois não. Qual a relação do senhor com Alexandrino Alencar?

Lula: Ele era empregado da Odebrecht e andava com o Emílio Odebrecht.

Ministério Público: Ele o acompanhava nas reuniões com o senhor na presidência?

Lula: De vez em quando, de vez em quando.

Ministério Público: Peço só um momento, por favor. Com relação a referência que o senhor fez ao fato de ter mantido diversas reuniões com Emílio Odebrecht, e agora o senhor disse que às vezes acompanhado de Alexandrino Alencar, o senhor poderia esclarecer a sua relação com o Grupo Odebrecht?

Lula: A mesma relação que eu tinha com todo o empresariado brasileiro. Se a doutora se lembrar bem, eu fui o presidente que mais fui ao Ministério Público, eu fui o presidente que mais reuni empresários de todos os setores desse país, fui o presidente que mais viajei o mundo, fui o presidente que mais viajei no país, e, portanto, fui o presidente que mais tive contato com empresários. Muitos, mais muitos, com todos. E o Emílio era um grande empresário, como era grande empresário a Camargo Corrêa, OAS, os produtores de etanol, o Pão de Açúcar, as indústrias automobilísticas, toda gente conversou comigo todo o tempo. Não tinha preferência à Odebrecht.

Ministério Público: Mas, nessas reuniões, Emílio Odebrecht levava pedidos de interesse do Grupo Odebrecht pro senhor?

Lula: Não, o Emílio era um empresário organizado, e eu passei a adotar... Sabe, todo empresário que conversasse comigo tinha que dizer antes qual era o assunto, porque você não pode fazer uma reunião com empresário e, chega lá, o empresário chegar com uma pauta, e você não tem informação, tá? Então, o Emílio levava a pauta do setor... sabe? Levava a pauta da ABDIB, levava a pauta do Sindicato da Construção Civil, e assim levava; o etanol, levava a pasta do setor de etanol; a indústria automobilística levava a pauta da indústria automobilística...

Ministério Público: Levava questões relativas à Petrobras?

Lula: Relações ao desenvolvimento do Brasil, e a Petrobras era uma empresa que tinha muita importância no desenvolvimento do país.

Ministério Público: Pois não. Há uma outra audiência, um documento relativo à audiência com o presidente Luiz Inácio além daquela que fiz referência anteriormente, é uma... é um documento que consta do evento 928, anexo 13: “Audiência com o excelentíssimo senhor Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva, Brasília, 05 de agosto de 2005”. Dentre os diversos pontos desta pauta, há referência a, no item 6, “Diversos”: relação com a Petrobras versus importância do diretor PR. Seria Paulo Roberto? O senhor tem conhecimento?

Martins: Antes, pela ordem, eu gostaria de esclarecer...

Ministério Público: O senhor gostaria de examinar o documento dos autos?

Martins: Gostaria de esclarecer, pela ordem, que esse documento é objeto do incidente de falsidade também.

Moro: Certo. A pergunta é se o senhor se recorda da reunião...

Martins: Certo, mas é que me parece...

Moro: ... se teria havido essa reunião e se foi tratado esse assunto.

Martins: É que a defesa gostaria só de ter a palavra.

Moro: O doutor intervém toda hora no interrogatório novamente...

Martins: Tudo bem, só que a lei me dá esse direito de formular a questão de ordem, estou levando ao juízo a questão de que este documento é objeto de incidente de falsidade que ainda não foi processado.

Moro: Perfeito, mas isso impede de ser feita a pergunta sobre ele ao seu cliente?

Martins: Isso impede, sim...

Moro: Não impede.

Martins: Impede, por uma simples questão, porque há, inclusive, informações que foram juntadas aos autos a respeito disso...

Moro: Tá, o doutor já colocou o seu ponto, agora, assim...

Martins: Sim, mas se Vossa Excelência puder...

Moro: Não, eu já ouvi o senhor, o doutor já falou várias vezes...

Martins: Eu não terminei meu raciocínio. Eu não terminei o raciocínio.

Moro: Já terminou, doutor?

Martins: É que Vossa Excelência quer cortar a defesa.

Moro: Nós estamos pra ouvir o senhor ex-presidente, o incidente não impede as perguntas, e a pergunta é se recorda de uma reunião em que houve esse tema, só isso. Tem medo que o seu cliente tenha que responder sobre isso?

Martins: Não, medo não tenho, medo nenhum. Vossa Excelência não respeita a defesa.

Moro: O doutor não deixa o...

Martins: Vossa Excelência não respeita a defesa. Está mais uma vez claro que Vossa Excelência não respeita a defesa...

Moro: Eu respeito, doutor. O doutor não respeita a ordem da audiência.

Martins: Vossa Excelência não respeita a defesa. Então, se Vossa Excelência seguir a lei e processar o incidente de falsidade, a defesa agradece; agora, se a lei é diferente, então a defesa vai não só lamentar como tomar as providências legais cabíveis.

Moro: Tá, a sua questão tá indeferida, doutor, o doutor está errado, o incidente está sendo encaminhado e nós podemos indagar o seu cliente sobre esse objeto dessa reunião; se não se recordar, ou se isso não aconteceu, isso é perfeito. O doutor não precisa intervir na audiência a todo momento porque isso é perturbador, perturba a ordem normal da audiência. É inapropriado o comportamento.

Martins: Farei as intervenções sempre que necessário e Vossa Excelência não poderá me impedir.

Lula: Doutor Moro, eu só queria dizer o seguinte, vamos voltar à normalidade aqui, o seguinte: vocês têm o direito de perguntar, ele tem o direito de não concordar, o juiz Moro tem o direito de indeferir e eu tenho o direito de falar ou não falar.

Moro: Então está deferida a questão, então peço pro senhor responder.

Lula: Só deixa eu lhe dizer uma coisa, doutora: nunca, nunca, o Emílio discutiu comigo cargo da Petrobras, nunca, e não ousaria discutir, nem ele e nenhum outro empresário.

Ministério Público: Essa pauta de audiência é de agosto de 2005, quando Paulo Roberto Costa já ocupava o cargo.

Lula: Eu não sei.

Ministério Público: Tratavam sobre atuação?

Lula: Eu não sei!

Ministério Público: O senhor não sabe dizer, pois não. Agradeço. Há também um documento nos autos, evento 928, anexo 34, é um e-mail de Marcelo Odebrecht pra Pedro Novis e pro seu pai, Emílio; eu não sei se o senhor conhece o teor desse documento que está nos autos, é um e-mail de 31 de outubro de 2006 em que Marcelo Odebrecht... dirigido ao seu pai e a Pedro Novis com o seguinte teor: “Pedro, meu pai, nas conversas com Lula, equipe, acho importante mencionar em termos de pessoa”, e aí tem o texto: “Manutenção de Guido e equipe no Ministério da Fazenda, estão afinados e jogando, garantia de não-paralisação; tem o apoio de grande parte do setor produtivo e certa reação dos bancos; manutenção de Damian e equipe do BNDES, estão afinados, inclusive com o MF” — imagino, Ministério da Fazenda? — “o que é importante, e jogando com afetividade, uma das melhores equipes em anos no BNDES; Márcio Fortes, um dos quadros mais eficientes e leais do governo, conhece como poucos e sabe tratar a burocracia do governo; Marta Suplicy, um dos quadros mais eficazes do PT; Petrobras, Gabrielli, Duque e Paulo Roberto, eficientes e de muita lealdade e compromisso com as necessidades do governo, sabendo conciliá-las com os interesses internos corporativos”. E segue: “Ministérios executivos, de Infraestrutura, Integração e Transportes, principalmente, precisam um choque de gestão para pôr em andamento projetos, inclusive PPPs”. Eu indago ao senhor, especificamente com relação à referência à Petrobras — Gabrielli, Duque, Paulo Roberto —, nessa época, outubro de 2006, o senhor tratou desses assuntos com o senhor Emílio?

Lula: Doutora, por favor, não pince apenas o Paulo Roberto à Petrobras.

Ministério Público: O senhor quer ver o documento?

Lula: Ou seja, é a primeira vez que eu vejo alguém elogiar um conjunto de pessoas do governo, elogiar o Ministro da Fazenda, elogiar o presidente do BNDES, elogiar tudo, e a senhora tenta excluir? Na Petrobras, eu vou lhe dizer uma coisa: o Paulo Roberto era um técnico que foi escolhido por ser competente. O José Sergio Gabrielli era o presidente da Petrobras por competência, portanto, as pessoas elogiarem não é demérito, não, é motivo de orgulho pra quem era Presidente da República. Era motivo de orgulho, portanto, eu tenho orgulho se as pessoas elogiaram gente do meu governo.

Moro: Certo, a pergunta objetiva é se o senhor Emílio Odebrecht elogiou...

Lula: Não tocou em assunto.

Moro: ... pessoas ou tratou das questões dos diretores com o senhor ex-presidente?

Lula: Eu vou repetir, eu pensei que eu tinha respondido, doutor Moro, sabe? Não exatamente como ela quer que eu responda, mas como eu sei responder, né? Nunca — eu vou repetir —, nunca o Emílio Odebrecht ou qualquer outra pessoa, sabe, de empresário discutiu comigo diretor de empresa pública.

Ministério Público: Na pauta de reunião também juntada aos autos, é uma pauta do dia 17 de janeiro de 2007...

Martins: Só um registro: é um papel apócrifo e que também é objeto de incidente de falsidade ainda não processado.

Ministério Público: Pois não. Trata-se do documento juntado pelo colaborador Emílio Odebrecht, que está no evento 928, anexo 8 — não sei se o senhor quer olhar o documento...

Lula: Doutora, o Emílio é colaborador de quem? Do Ministério Público?

Ministério Público: Celebrou acordo de colaboração com a Procuradoria-Geral da República, homologado pelo Supremo Tribunal Federal.

Lula: Sabe que eu poderia utilizar uma fala do doutor Moro, sabe? Que não é correto ficar utilizando pessoas que são acusadas, que já prestaram declaração, pra acusar um inocente.

Ministério Público: Pois não. Neste documento a que fiz referência, há um tópico que diz “orientação como E. O.”, Emílio Odebrecht, “proceder com J. D.”, José Dirceu, “mais A. P.”, Antonio Palocci, “e R semanal versus J”. O senhor ex-presidente orientava Emílio sobre como proceder com José Dirceu?

Martins: Essa leitura é textual, que Vossa Excelência fez?

Ministério Público: É fruto da colaboração.

Martins: Não, mas a pergunta: a leitura que Vossa Excelência fez é textual, entre aspas, ou Vossa Excelência inseriu informações na leitura?

Ministério Público: Não, vou fazer a leitura textual: “Orientação como E. O, proceder com J. D., mais A. P. e R semanal versus J”. Esse é o conteúdo.

Martins: A leitura anterior então não era textual?

Ministério Público: Não.

Martins: Agora a leitura é textual?

Ministério Público: É, trata-se de documento apresentado por réu colaborador. O senhor...

Lula: A pergunta.

Ministério Público: A pergunta. Refaço a pergunta ao senhor: o senhor orientava Emílio Odebrecht sobre como proceder com relação a José Dirceu e Antonio Palocci?

Lula: Doutora, por que eu haveria de orientar o Emílio como conversar com qualquer pessoa?

Ministério Público: Pois não.

Moro: Parece que ele negou o conteúdo dessas atas todas e nega...

Ministério Público: Sim, pois não. Pois não. Essa questão...

Moro: ... não precisamos ir uma por uma.

Ministério Público: Essa questão... Não, já encerrei com relação às datas.

Moro: Só pra ganharmos tempo, por gentileza.

Ministério Público: Pois não. A construtora Norberto Odebrecht fez doações de quatro milhões para o Instituto Lula entre o final de 2013 e 2014, são recibos nos eventos 1008, anexo 3. O senhor ex-presidente sabe por que essas doações foram feitas?

Lula: Doutora, já respondi, mas vou responder outra vez: a Odebrecht não tinha que pedir a opinião do Lula para fazer doação porque o Lula não é diretor do Instituto Lula. Se ela fez alguma doação, essa doação está contabilizada no Instituto.

Ministério Público: Antonio Palocci disse que pediu essas doações para Marcelo, atendendo solicitação de Paulo Okamotto, o senhor tinha conhecimento disso?

Lula: Não.

Ministério Público: O senhor Marcelo Odebrecht disse que essas doações foram deduzidas de uma conta-corrente geral de propina mantida pelo grupo Odebrecht para beneficiar o governo do Partido dos Trabalhadores. E...

Lula: Doutora, essa é a peça de ficção mais hilariante que eu ouvi na fala do Palocci.

Eu, sinceramente, não sei qual era a relação que o ex-ministro Palocci tinha com o doutor Marcelo Odebrecht, eu não sei. Os dois têm mais de 35 anos de idade, têm autonomia, conversavam, e nunca me pediram para conversar. Sabe, se eles conversavam coisas, se tinha fundo, se não tinha fundo, o doutor Palocci que explique. O Marcelo que explique.

Moro: Certo.

Lula: O dado concreto é que nem o Marcelo, nem o Emílio Odebrecht... Eu nunca, doutora, se eu responder, e a senhora não prestar atenção, eu vou achar que não tem sentido o que a senhora me perguntou.

Ministério Público: O seu depoimento está gravado, senhor ex-presidente.

Lula: Eu queria que a senhora ouvisse porque quando a senhora faz a pergunta, eu fico olhando para a senhora até por questão de respeito. Eu estou lhe falando que nunca o Marcelo Odebrecht, nunca o Emílio Odebrecht, nunca nenhum empresário nesse país discutiu finança comigo. Nunca.

Ministério Público: Alguma vez lhe referiram sobre a existência de uma provisão de valores denominada conta amigo ou subconta amigo, que está registrada em planilha? Planilha Programa Especial Italiana, não?

Lula: Não, eu fico sabendo disso porque a imprensa escreve. Eu tratava os empresários como empresários.

Portanto, eu vou repetir porque eu não sei se tem mais perguntas, doutora, o seguinte, eu tomei posse em janeiro de 2003, como Presidente da República, deixei a presidência dia 30 de dezembro de 2010. Eu continuo desafiando um empresário que diga o seguinte: “Eu conversei de dinheiro com Lula”. Seja dez centavos ou dez milhões. Eu nunca autorizei, nunca permiti, porque eu não queria nem perder o respeito com relação a eles e não queria que eles perdessem o respeito com relação a mim. Era por isso que esse país não dava certo. Porque o país era tratado como se fosse uma coisa pessoal.

Moro: Certo, mas o senhor já respondeu isso aí, senhor ex-presidente.

Ministério Público: Pois não, eu tenho uma questão adicional, com relação à empresa Dag, o senhor conheceu a empresa Dag? Que foi...

Lula: Doutora, eu não conheço a empresa Dag, nem antes, nem durante e nem depois. Tudo o que eu sei da empresa Dag é o que vocês falam, pela imprensa, é o que a imprensa publica.

Ministério Público: Certo. Consta que a empresa Dag efetuou custos com o afretamento de uma aeronave que foi cedida para uso do senhor ex-presidente, em viagem realizada à República Dominicana, o que é objeto de uma ação que corre na 10ª Vara Federal, posso citar o número: 00160939620064013400. Consta dessa ação, que a empresa Dag só afretou aeronave. O senhor tinha relação com essa empresa Dag, como acabei de perguntar anteriormente?

Lula: Doutora, eu fiz 76 viagens nesse mundo para fazer palestras. Eu não contratava palestra. E eu não contratava avião. As pessoas que me contratavam tinham obrigação de me pegar em São Paulo, me levar onde era essa palestra e me levar de volta para São Paulo. Eu nunca fui saber quem é que pagava, porque nos contratos meus, a empresa que me contratava era obrigada a garantir o direito de ir e vir meu. Portanto, eu não sei se quem pagou foi a Dag, o Itaú, o Bradesco, Bamerindus...

Não tenho a menor noção. Agora, se tiver deve estar no contrato.

Ministério Público: O senhor tem conhecimento que a empresa Dag fez pagamento da ordem de 800 mil reais para o senhor Glauco da Costa Marques, no bojo da contratação desse imóvel da rua doutor Haberbeck Brandão?

Lula: Eu vi no depoimento do Glauco, ele dizendo isso. Agora, pelo que ele disse, ele tinha direito de receber. É a participação dele no negócio, na venda. Qual é o erro?

Ministério Público: O senhor sabe se ele empregou recursos nessa compra?

Lula: Não sei, não sei.

Orador não identificado: Por favor, eu queria que o senhor ex-presidente respondesse só três ou quatro questionamentos aqui, até porque já estamos nos alongando no tempo e cansando a todos. Primeiro: o senhor quando depôs na outra ação penal, o senhor mencionou de um encontro com Renato Duque, num hangar, no aeroporto, em São Paulo, em 2014. O senhor se recorda?

Lula: Me recordo.

Orador não identificado: Tá. O senhor não ocupava mais a presidência da República, nem tinha cargo na direção do Partido dos Trabalhadores. Qual foi o objeto dessa conversa?

Lula: Já disse no depoimento da outra vez, já disse no depoimento.

Orador não identificado: Pois não.

Lula: Eu já disse em meu depoimento.

Martins: Pela ordem, Excelência, esse fato também não consta da denúncia. Quer dizer, Vossa Excelência está...

Orador não identificado: Mas ele diz respeito a contextualização dos fatos...

Martins: Sim, mas não é objeto da denúncia, isso que eu estou afirmando. Se não é objeto da denúncia, já foi...

Moro: Indeferida a sua questão.

Martins: Sim. Já foi esclarecido no depoimento anterior, não é objeto da denúncia, então, diante disso, a defesa técnica orienta que o depoente não responda. Não é objeto da denúncia.

Moro: Tem alguma questão complementar, doutor, sobre esse conteúdo? Gostaria de fazer, ainda que a orientação seja para não responder?

Orador não identificado: Não, eu queria só que ele esclarecesse qual é a razão pela qual ele conversou com o Renato Duque, até porque, doutor, se o senhor me permitir concluir, por favor, o senhor ex-presidente disse aqui, que não tinha relações com ex-diretores da Petrobras, que não, não lidava com eles corriqueiramente, no dia a dia. Então eu queria saber por que, qual é a razão de, neste momento, ter encontrado o Renato Duque, mas se a orientação é de não responder?

Martins: Esta questão, como eu já disse, não é objeto desta ação penal. Então, aqui o depoente está para fazer a sua autodefesa em relação ao objeto dessa ação penal. O objeto dessa ação penal são oito contratos firmados pela Petrobras com os sócios...

Moro: Certo doutor, não precisa se alongar, já entendemos a posição da defesa. O senhor ex-presidente não pretende responder essa questão.

Lula: Eu poderia fazer como fiz no começo.

Moro: Doutor, tem alguma questão adicional, relativo ao que ele já respondeu? Porque ele já respondeu, realmente, sobre esse fato, e estou aproveitando o depoimento, se tiver algum ponto adicional, sim, se não...

Orador não identificado: Só mais um esclarecimento aqui, o senhor usou uma expressão quando falou do apartamento... ao seu apartamento lá em São Bernardo, que houve o falecimento do proprietário e a aquisição. O senhor utilizou uma expressão que foi lógica sequencial, que a lógica sequencial foi comprar para continuar utilizando.

Martins: Não foi feita essa afirmação.

Lula: A lógica sequencial foi continuar pagando aluguel. Porque eu já vinha pagando desde 1998 quando eu comprei.

Orador não identificado: Certo. Então a lógica sequencial era continuar ocupando e que o aluguel continuasse a ser pago, era isso?

Martins: Isso já foi esclarecido.

Ministério Público: Mas quem fazia o pagamento dos aluguéis era a presidência da República?

Lula: Doutora, de 2007 para diante, quem pagava isso, até o dia 31 de janeiro de 2010, era a segurança da presidência da República.

Ministério Público: A União Federal, a presidência da República. A União.

Martins: Isso está documentado nos autos, Excelência, várias vezes foi feita essa afirmação.

Ministério Público: O depoente acabou de dizer que ele vinha pagando. Consta do documento dos autos.

Lula: Perdão. O PT pagava antes.

Orador não identificado: Não, o ponto que eu queria esclarecer aqui é que o senhor não cogitou da compra do imóvel?

Lula: Não cogitei da compra do imóvel porque a dona Marisa não queria morar mais lá.

Orador não identificado: O terceiro aspecto que eu queria que o senhor, que Vossa Excelência por favor esclarecesse, é o seguinte: o senhor Antonio Palocci foi seu ministro, foi seu companheiro de partido, o senhor o demitiu como ministro, ele foi eleito deputado federal, o senhor o conhecia talvez melhor do que qualquer uma das pessoas nessa sala, tá? Eu pergunto, o senhor nunca identificou essa faceta, que o senhor, tão negativa que o senhor está atribuindo a ele agora?

Lula: Não, eu terminei elogiando o Palocci. Eu disse que o Palocci foi um Ministro da Fazenda muito competente, que ajudou muito esse país. Eu disse que eu não conhecia era essa simulação que ele fez aqui, a semana passada. Ele veio, doutor, me desculpe, mas ele veio para cumprir um ritual. Quem conhece o Palocci, como eu conheço, percebeu que ele estava cumprindo um ritual. Eu já vi o Palocci em situações difíceis. Na área econômica. Então o Palocci veio preparado para dizer, sabe, que tinha um fundo que eu sabia, para dizer que o doutor Emílio tinha me procurado para conversar, para dizer que eu tinha tentado bloquear a justiça, que eu chamei ele para conversar para bloquear a justiça. Sabe? Então foi um conjunto de simulações que o Palocci fez, por isso que eu utilizei a palavra simulador, tudo com o objetivo de duas coisas, sabe? Que é o objetivo de diminuir a pena dele, ganhar os benefícios da delação e quem sabe ficar com um pouco dos recursos que foi bloqueado, que ele ganhou como consultor, isso ficou claro quando ele disse estou aqui para ter os benefícios da lei.

Eu lamento, porque eu sou um cara que gostei muito do Palocci, tive boa relação com o Palocci, acho o que Brasil deve ao Palocci, sabe? Mas, lamentavelmente, o Palocci se prestou a um serviço, sabe, pequeno, porque inventar inverdades para tentar criminalizar uma pessoa que ele sabe que não cometeu os crimes que ele alegou é muito desagradável. Eu fico pensando como é que está pensando a mãe dele agora que é militante do PT e fundadora do PT. Eu fico imaginando como é que estão as pessoas que militavam com ele no PT. Então é lamentável. Eu sinceramente não tenho raiva do Palocci. Não leve essa imagem que tenho raiva do Palocci, eu tenho pena dele ter terminado uma carreira tão brilhante da forma que ele terminou.

Moro: Certo, vamos interromper pelo tamanho do áudio.

Moro: Retornando à ação penal 5063130/17, continuando o depoimento do senhor ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ministério Público tem mais perguntas?

Ministério Público: Só um último esclarecimento, ainda recorrendo ao depoimento de Antonio Palocci, que neste ponto em particular, ele é corroborado por elementos que estão nos autos que dizem respeito a famosa planilha “italiano”, há uma menção a alguns saques.

Martins: Eu só pediria à Vossa Excelência.

Ministério Público: Pois não.

Martins: A questão do “corroborado” é um juízo de valor, então eu pediria que Vossa Excelência fizesse a pergunta objetivamente, sem incluir juízo de valor, tal como diz a lei.

Moro: Indeferida a sua questão, doutor. O Ministério Público vai perguntar como ele quiser, não cabe à defesa ficar dizendo…

Martins: Sim, mas juízo de valor na pergunta, não cabe, Excelência. Data maxima venia.

Ministério Público: Pode ficar indeferido, pode ser, doutor? O senhor fica satisfeito?

Moro: Não, desculpe. Pode fazer a pergunta como entender apropriado, sua questão de ordem é totalmente indevida, doutor.

Martins: Tudo bem, tudo da defesa para Vossa Excelência é indevido, agora a defesa insiste que não é cabível fazer uma pergunta com juízo de valor, como foi feito.

Moro: Certo, então está indeferido novamente, doutor, pode prosseguir.

Martins: Com os protestos da defesa.

Ministério Público: Eu não vou entrar em discussão porque não vale a pena, então…

Lula: Por favor, fale mais perto do microfone, doutor.

Ministério Público: Pois não. No depoimento de Antonio Palocci, ele mencionou que fez, que através dele foram feitos pagamentos, utilizando-se da pessoa de Branislav Kontic e que esses pagamentos foram saques em espécie, feitos a partir da empresa Odebrecht, pelo setor de operações estruturadas, o senhor sabe para quem esses pagamentos foram dirigidos?

Lula: Não.

Ministério Público: Está bem. Não tenho mais perguntas, obrigado.

Moro: … acusação tem perguntas? Seguindo aqui na ordem da…

Martins: Excelência, a defesa técnica não fará perguntas, e orienta também ao depoente que não responda a pergunta de outros defensores, respeitosamente, tendo em vista que majoritariamente se tratam de delatores ou candidatos a delatores.

Moro: Perfeito. De todo modo, eu vou passar a palavra aos defensores, se quiserem façam ou não as perguntas e, evidentemente, o acusado se quiser ou não responde, seguindo a orientação.

Martins: A defesa… a orientação da defesa técnica é essa.

Moro: A defesa de Antonio Palocci Filho tem perguntas?

Orador não identificado: Sem perguntas, Excelência.

Moro: A defesa de Branislav Kontic tem perguntas?

Guilherme Batochio: Sem perguntas, Excelência.

Moro: A defesa de Demerval Gusmão tem perguntas?

Orador não identificado: Sem perguntas.

Moro: A defesa de Glauco da Costa Marques tem perguntas?

Orador não identificado: Não, Excelência. Obrigado.

Moro: A defesa de Marcelo Bahia Odebrecht tem perguntas?

Orador não identificado: Sem perguntas, Excelência.

Moro: A defesa de Roberto Teixeira tem perguntas?

Orador não identificado: Sem perguntas, Excelência.

Moro: A defesa do próprio acusado tem alguma questão?

Martins: Não, Excelência.

Moro: Certo. O senhor gostaria de dizer alguma coisa, ainda, ao final, senhor ex-presidente?

Lula: Eu gostaria.

Moro: Só assim senhor ex-presidente, não é o momento de campanha, não é o momento de discurso é para falar se sobre o objeto da acusação se for o caso, certo?

Lula: Doutor, deixa eu dizer uma coisa com todo e profundo respeito que eu tenho cada vez que eu sento aqui. Cada vez que eu saio daqui ou cada vez que eu ligo na televisão, eu vejo as pessoas fazendo campanha contra mim.

Aliás, um conselho, o senhor usa numa frase aqui, a palavra “denegrir” com relação ao advogado da Espanha que fez acusações que você não gostou, politicamente não é correto falar “denegrir” que o movimento negro do país não gosta, mas eu vou dizer.

Moro: Certo, senhor ex-presidente, não é para campanha, nem para fazer declarações, o que o senhor quer falar sobre o objeto da denúncia?

Lula: Certo, eu todo dia tenho 20 a 30 minutos de campanha contra mim, difamando meu nome, achincalhando meu nome, sem nenhum respeito, não importa qual seja o tamanho da mentira, não importa. Ontem mesmo, eu não sei se o senhor acompanhou, eu sou motivo de uma outra ação do Ministério Público por uma Medida Provisória aprovada por unanimidade no Congresso Nacional, sabe… ou seja, parece que eu sou, parece que tem uma caça às bruxas. Então eu tenho lidado com muita paciência, eu vi o depoimento do Palocci, não respondi nada, não falei nada, muita gente achou que eu ia chegar aqui com muita raiva do Palocci, eu achei que o Palocci está preso há mais de um ano, o Palocci tem o direito de querer ser livre, tem o direito de querer ficar com um pouco do dinheiro que ele ganhou fazendo palestra, ele tem família, tudo isso eu acho, o que não pode é se você não quer assumir a tua responsabilidade pelos fatos ilícitos que você fez, não joga em cima dos outros, porque, na verdade, o Ministério Público, e quando eu falo Ministério Público, doutora, eu acho que pouca gente respeita a instituição como eu, mas é que o Ministério Público ligado a Lava Jato enveredou por um caminho que vocês estão com dificuldade de sair, então o objetivo é tentar encontrar alguém para me criminalizar, este é o objetivo. Em todas as ações que são feitas contra mim, o objetivo. Esses dias eu fiquei sabendo de uma pessoa que foi prestar depoimento na Polícia Federal, de 28 perguntas, 26 foram sobre o Lula.

Moro: Qual pessoa?

Lula: Hein?

Moro: Qual pessoa?

Lula: Não, quando tiver o processo eu venho dizer qual a pessoa.

Moro: Então se não é desse processo…

Lula: Eu não vou citar o nome porque eu não sou delator, mas eu só quero dizer, só quero dizer, que há uma caça às bruxas, então eu fiquei muito preocupado com a delação do Palocci, porque ele poderia ter falado “eu fiz isso de errado, eu fiz isso”. Ele, sabe, espertamente diz “não é que eu sou santo”, e pau no Lula, não é que eu sou santo, que é um jeito de você conquistar veracidade na tua frase. Eu fiquei com pena disso. E eu quero dizer ao Ministério Público que eu vou enfrentar todas as ações que vocês fizeram com o mesmo respeito, protestando sempre, sabe, criticando sempre, dizendo que é ilegítimo o que vocês estão fazendo, de que as denúncias não procedem, sabe, de que quase todas as denúncias foi motivo da imprensa aprisionar vocês, a imprensa aprisionar o grupo da Lava Jato, acho que vocês estão refém de uma coisa grave para o Poder Judiciário Brasileiro, nós estamos vendo o que está acontecendo com o Janot, nós estamos vendo.

Moro: Certo, senhor ex-presidente, o senhor vai fazer discurso.

Lula: Doutor, eu prestei depoimento, eu prestei depoimento para esse procurador, eu prestei depoimento, três depoimentos.

Moro: Esse é um processo aqui, envolve essa acusação específica, não tem nada a ver com Brasília, não tem nada a ver lá com o doutor Janot, não tem nada a ver com imprensa, tá? Então assim, tem alguma consideração específica sobre isso?

Lula: Eu tenho, doutor, eu vou dizer.

Martins: Excelência, foi feita referência inclusive a reportagens jornalísticas aqui, então me parece apropriado…

Lula: Doutor, eu sei que o senhor deve estar cansado, deve ter outras audiências, mas eu não posso deixar de dizer que esse processo contra mim, fizeram com que vocês virassem reféns da imprensa brasileira, tá? E vou terminar fazendo uma pergunta para o senhor, doutor.

Moro: Hum.

Lula: Eu vou chegar em casa amanhã, vou almoçar com oito netos e uma bisneta de seis meses. Eu posso olhar na cara dos meus filhos e dizer que eu vim a Curitiba prestar depoimento a um juiz imparcial?

Moro: Bem, primeiro não cabe ao senhor fazer esse tipo de pergunta para mim, mas de todo modo, sim.

Lula: Porque não foi o procedimento na outra ação, doutor.

Moro: Eu não vou discutir a outra ação com o senhor, senhor ex-presidente, se nós fôssemos discutir aqui, a minha convicção foi que o senhor é culpado. Não vou discutir aquele processo aqui, o senhor está discutindo lá no Tribunal, e apresente suas razões no Tribunal, certo? Se o senhor for discutir aqui não seria bom para o senhor.

Lula: É, mas é porque nós temos que discutir aqui.

Moro: Eu vou interromper aqui a gravação, certo.

Lula: Eu vou continuar esperando que a justiça faça justiça nesse país.

Moro: Perfeito. Pode interromper a gravação.