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Lula confirma encontro com Emilio Odebrecht e Dilma, mas diz que não tratou de valores

Lula: "fui o presidente que mais teve contatos com empresários"

UOL Notícias

Do UOL, em São Paulo

13/09/2017 19h39Atualizada em 14/09/2017 00h54

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) contestou em depoimento ao juiz federal Sérgio Moro, nesta quarta-feira (13), as informações oferecidas pelo ex-ministro Antonio Palocci, em interrogatório na semana passada, de que Lula, a ex-presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente da Odebrecht, Emilio Odebrecht, teriam tratado de valores escusos e de uma relação de interesses entre o PT e a empresa em um encontro realizado no dia 30 de dezembro de 2010.

Lula confirmou a reunião, mas disse que não passou de uma conversa de 10 minutos e que nenhum valor foi tratado. Segundo o ex-presidente, o encontro foi uma solicitação de Emilio para falar que passaria o comando de sua empresa para o filho, Marcelo.

"Acho que não durou 10 minutos essa conversa. Até porque, a Dilma estava em fase de preparação, de escolha de ministério, em fase de preparação da tomada de posse, que era dia 1º de janeiro, e portanto a Dilma não tinha tempo de fazer agenda. Só se o Papa pedisse. Mas a Dilma não tinha mais agenda, a Dilma atendeu num gesto de cortesia”, disse Lula.

O ex-presidente ainda chamou de "desfaçatez" as declarações dadas por Palocci no interrogatório da semana passada. Na ocasião, o ex-ministro disse que o PT e a Odebrecht firmaram um "pacto de sangue" naquele encontro, e que Emilio Odebrecht ofereceu R$ 300 milhões a Lula, além de um terreno para sediar o Instituto Lula e reformas em um sítio em Atibaia (SP).

"Eu vi atentamente o Palocci contar essa história, eu vi, e a desfaçatez do companheiro Palocci foi de tal magnitude que ele inventou uma história de que o Emilio foi lá, foi discutir um fundo que tinha sido criado, e foi discutir a manutenção desse fundo, a manutenção da relação dele com a Dilma", afirmou o ex-presidente.

Ele explicou que Dilma tinha relação com diversos empresários porque fora a ministra-chefe da Casa Civil em seu governo e coordenou o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). Interpelado pelo juiz Sérgio Moro, que disse que as explicações sobre Dilma não eram objeto da ação, Lula aumentou o tom: "Não tô saindo do objeto não, faz parte do objeto, doutor Moro, faz parte do objeto saber a relação da Dilma com as pessoas. A Dilma tinha relação com as empresas porque era a ministra que cuidava do PAC. É importante saber disso, porque eu sei qual é a malícia da pergunta. E eu sei a resposta do Palocci aqui".

Questionado pelo Ministério Público mais uma vez sobre o encontro de 30 de dezembro de 2010, Lula se exaltou e falou que nunca tratou de temas financeiros com nenhum empresário.

"Jamais! Emilio Odebrecht, que é um empresário que eu tenho profundo respeito, tratou comigo de qualquer dinheiro para o PT, jamais. Eu não era tesoureiro do PT, eu não era da direção nacional do PT, o PT tinha tesoureiro, a campanha tinha tesoureiro, portanto não havia por que conversar comigo. Nunca admiti nem ao Emíilio e nem a nenhum empresário deste país que discutisse comigo um centavo. Nunca. Por isso, digo sempre: eu desafio vocês do Ministério Público, da Operação Lava Jato, desafio a Polícia Federal a encontrar nesse pais alguém que discutiu comigo um real", completou o petista.

A defesa de Lula também contestou uma agenda entregue por Emilio Odebrecht da qual constava o encontro com Lula. Segundo o advogado Cristiano Zanin, o documento teve sua veracidade questionada.

Antonio Palocci, por meio de seu advogado, respondeu às acusações do ex-presidente Lula sobre ter mentido em seu depoimento e ser “calculista e frio”.

“Enquanto o Palocci mantinha o silêncio, ele era inteligente e virtuoso. Depois que resolveu falar a verdade, passou a ser tido como calculista e dissimulado. Dissimulado é ele, que nega tudo o que lhe contraria e teve a pachorra de dizer que se encontrava raramente com o Palocci a cada 8 meses”, escreveu a defesa de Palocci em comunicado.

Relação normal

Durante o interrogatório, Lula foi questionado se a empreiteira Odebrecht tinha algum tipo de “preferência” nas relações com o governo.

Indagado pela procuradora Isabel Cristina Groba Vieira sobre qual era a relação dele com o grupo, tendo em vista o registro de reuniões entre o petista e o empresário Emílio Odebrecht, respondeu que tinha a mesma relação com todas as empresas e instituições com as quais tratava.

"A mesma relação que eu tinha com todo o empresariado do Brasil. Se a doutora se lembrar bem, fui o presidente que mais foi ao Ministério Público, que mais reuniu empresários de todos os setores do país, que mais viajei o mundo, que mais viajei o país, e, portanto, o que mais teve contatos com empresários, muitos, mas muitos, com todos. E o Emílio era um grande empresário, como era a Camargo Corrêa, a OAS, os produtores de etanol, a indústria automobilística, o Pão de Açúcar... toda gente conversou comigo todo o tempo. Não tinha preferência a Odebrecht”, definiu.

Sobre o presidente do conselho de administração da Odebrecht, complementou: “Emílio era um empresário organizado. E passei a adotar que todo empresário que falasse comigo tinha que falar [antes] qual o assunto. Ele [Emílio] levava a pauta do setor, do sindicato da construção civil...”, afirmou.

Indagado se Emílio Odebrecht discutia nessas reuniões com o então presidente também assuntos relativos à Petrobras –cujos contratos se tornaram alvo central da operação Lava Jato --, Lula sinalizou que sim. Afirmou que os temas debatidos eram sobre “o desenvolvimento do Brasil” e citou que “a Petrobras era uma empresa que tinha muita importância no desenvolvimento do país.”

Diretores da Petrobras

O ex-presidente também negou que a Odebrecht, por meio de Emilio Odebrecht, tenha tido influência na escolha de diretores de empresas públicas como a Petrobras. Segundo ele, nomes como Paulo Roberto da Costa e José Sérgio Gabrielli, ex-diretores da empresa, foram escolhidos por serem competentes. Costa foi o primeiro delator da Operação Lava Jato. Ambos foram elogiados por executivos da Odebrecht ouvidos pela força-tarefa.

“Na Petrobras, o Paulo Roberto era um técnico escolhido por ser competente. O Sergio Gabrieli, também. Se eles [a Odebrecht] elogiaram, é motivo de orgulho para o presidente da República. Nunca o Emílio Odebrecht discutiu comigo diretor de empresa pública”, disse Lula.

Lula questionou a procuradora Isabel Cristina Groba Vieira sobre o uso de uma informação passada por Emílio Odebrecht, cuja delação foi feita à Procurador-Geral da República. “O Emílio é colaborador de quem, do Ministério Público? Eu poderia utilizar uma fala do doutor Moro: de que não é correto utilizar pessoas acusadas que já prestaram uma declaração para acusar um inocente.”

O petista se irritou ao ser perguntado pela procuradora se ele orientava Emilio a como proceder com os ex-ministros José Dirceu e Antonio Palocci. “Como poderia orientar Emilio a como proceder com outras pessoas?”

Sobre a doação da Odebrecht ao Instituto Lula, disse que a empreiteira “não tinha que pedir opinião para fazer doação porque o Lula não é diretor do Instituto Lula. A doação foi para o instituto”. Paulo Okamoto, presidente do instituto, faz parte do processo em que o petista foi ouvido.

Procuradora rebate termo "querida" adotado pelo petista

Em mais de uma ocasião, Lula se mostrou irritado com as perguntas da procuradora sobre o terreno que a Odebrecht teria oferecido ao petista para e que seria destinado ao Instituto Lula, mas que acabou recusado pela diretoria do instituto.

“O senhor sabe quando a diretoria se reuniu para deliberar sobre isso?”, perguntou a representante do MPF. “Não sei, querida. Não sei”, respondeu.

Questionado se a deliberação pela recusa fora formalizada, voltou a se referir à procuradora da mesma forma. “Também gostaria que o senhor presidente se referisse ao membro do MP pelo tratamento protocolar devido”, pediu a procuradora. “Como é que seria: ‘doutora’?”, sugeriu Lula, que acabou abordado por Moro para que mudasse a forma de tratamento.